Sob protestos

Milei vence primeira batalha legislativa e aprova texto base da Lei Ônibus na Câmara

Acordo com partidos opositores de centro-direita foi decisivo; discussão sobre o projeto será retomada na próxima semana

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Um grupo de pensionistas é reprimido por policiais durante protesto em frente ao Congresso argentino, nesta sexta (2) - Luis Robayo/AFP

A Câmara dos Deputados da Argentina aprovou nesta sexta-feira (2), com 144 votos a favor e 109 contra, o texto base da chamada Lei Ônibus, um dos projetos mais importantes do programa de governo do presidente ultraliberal Javier Milei.

O resultado é considerado uma grande vitória para o governo, que enfrentou uma greve geral massiva contra o projeto no dia 24 de janeiro e um debate na Câmara que teve início na última quarta-feira (31) e precisou de mais de 50 horas para se chegar à votação final.

A Lei Ônibus consiste em um pacote com centenas de medidas econômicas que busca reduzir drasticamente a participação do Estado na economia argentina e transformar direitos sociais atualmente garantidos pela constituição do país como responsabilidade estatal em serviços que devem ser supridos por entes privados.

O projeto original continha mais de 300 medidas que apontavam nesse sentido, mas as negociações com os setores de direita da oposição, visando alcançar os votos suficientes para a aprovação, fizeram com que o texto mais recente tenha pouco menos de 200 artigos.

A estratégia deu certo, já que alguns setores de direita que se apresentam como opositores ao governo de Milei – considerado de extrema direita –, terminaram votando a favor e foram decisivos para a aprovação.

No entanto, vale ressaltar que após a aprovação do texto base, a Câmara deveria avaliar em particular boa parte dos quase 200 artigos do projeto, procedimento que terá início a partir da próxima terça-feira (6).

Reações após aprovação do texto

Em rede social, o presidente Javier Milei comemorou a aprovação geral da Lei Ônibus na Câmara. Além disso, por meio de um comunicado da Presidência da República, o mandatário chegou a agradecer Cristian Ritondo, Miguel Ángel Pichetto e Rodrigo de Loredo, os três líderes da oposição que apoiaram o projeto.

Logo após o resultado, a ministra da Segurança, Patrícia Bullrich, também usou as redes sociais para agradecer os parlamentares:

"A Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos é uma ferramenta para sair da decadência de décadas. Felicito todos os deputados que deram este passo em prol do bem-estar dos argentinos. Mais investimento, mais trabalho, mais liberdade", escreveu a aliada do presidente.

O chefe da Defesa, Luis Petri,  comemorou a aprovação e afirmou este ser "o primeiro passo de muitos no caminho histórico de transformação da nossa Nação", acrescentando que a decisão de hoje "deixa para trás, de uma vez por todas, o passado que nos acorrenta e nos limita em nossa liberdade":

Apesar de ser uma vitória significativa para o governo Milei, o ministro do Interior, Guillermo Francos, foi mais cauteloso ao dizer que não se trata de uma "meia-sanção" já que "falta o voto em particular". No entanto considerou o resultado desta noite ser "um grande passo".

Por outro lado, o presidente do União pela Pátria, Germán Martínez, afirmou que o debate "não esclareceu completamente as questões obscuras" e estranhou que "houve artigos que antes estavam fora e agora estão dentro".

“O importante não é o que acontece na terça-feira, mas o que acontece entre hoje e terça-feira”, explicou Martínez à imprensa, acrescentando que o Congresso estava debatendo "sem saber exatamente qual era a proposta”.

Em rede social, o deputado criticou que as questões envolvendo produção, indústria, trabalho, exportação, mercado interno, ciência e tecnologia ficaram "absolutamente ausentes na lei geral". Assegurou ainda que trabalhará para rechaçar o projeto de Milei, o qual caracterizou como um "plano de desintegração nacional, limitação do federalismo e ruptura da coexistência democrática".

Os bastidores da aprovação

Minutos antes da votação geral, o governo de Javier Milei tentou influenciar os parlamentares ao emitir um aviso forçando a aprovação da lei debatida em questão.

A nota, compartilhada pelo próprio presidente em rede social, falava em “responsabilidade e celeridade na votação do megaprojeto” e também pressionava os deputados, em termos que denotavam tons de ameaça, afirmando que “a história os julgará de acordo com sua atuação a favor dos argentinos ou a favor de continuar a empobrecer o povo”.

O texto ainda tentava convencer de que o projeto deveria ser aprovado uma vez que “as sugestões foram acolhidas, as modificações foram feitas, o capítulo fiscal foi eliminado e chegamos a um projeto de consenso”.

Política de represália

Até a aprovação do projeto, a Argentina não passou apenas por três dias de intensos debates, mas também por uma série de protestos. Enquanto acontecia a sessão, o entorno do Congresso era, simultaneamente, um palco de confrontos diretos entre manifestantes e as forças de segurança nacionais.

Os policiais chegaram a reprimir os civis fazendo uso de balas de borracha e caminhões hidrantes, cumprindo o protocolo da “política de represália” anunciada semanas antes pela ministra de Segurança Nacional, Patricia Bullrich.

Como informava o canal argentino C5N, a Polícia Federal também entrou em campo e avançou sobre os cidadãos, jornalistas e grupos auto-organizados que estavam na Praça do Congresso, “empurrando, espancando e jogando gás lacrimogêneo”.