RETROCESSO

PEC das drogas vai aumentar violência contra pessoas negras e pobres da periferia, diz ativista

Proposta de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) pode ser votada no Senado nesta terça-feira (16)

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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PEC 45/2023 criminaliza a posse de qualquer quantidade de substância ilícita. - Jefferson Rudy/Agência Senado

O Senado deve votar hoje a proposta de emenda à Constituição que criminaliza a posse de qualquer quantidade de substância ilícita (PEC 45/2023). A proposta, apresentada pelo presidente da casa legislativa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), passou pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) com amplo apoio da oposição. Houve uma emenda no texto feita pelo senador relator Efraim Filho, do União Brasil da Paraíba, para que seja observada a distinção entre traficante e usuário.

A votação da PEC pode mudar a lei de drogas atual, em vigor desde 2006. A proposta avança enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) também debate o porte de drogas para consumo e a quantidade mínima que pode ser descriminalizada. Portanto, os dois debates divergem.

No STF, cinco dos 11 ministros já votaram a favor da descriminalização de uma quantidade mínima de maconha. O resultado no Senado pode fazer com que a discussão no Supremo seja revista.

A coordenadora da Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas (Renfa) e pesquisadora sobre políticas de drogas na América Latina, Ingrid Farias, esteve no Senado nesta segunda-feira (15), onde o assunto foi debatido em audiência. Em entrevista ao programa Central do Brasil nesta terça-feira (16), ela explicou porque o projeto vem sendo criticado por movimentos que defendem os direitos humanos. "Esse tema abre um precedente de ameaça à democracia e aos mecanismos que a gente tem para poder fazer a manutenção da garantia de direitos. Essa PEC sugere a alteração de um direito constitucional que é o artigo 5º, o direito à liberdade, à vida, que o cidadão tenha a possibilidade de escolher o que fazer com o seu corpo, com a sua vida."

O direito ao acesso à saúde também está colocado em cheque, segundo ela. "De uma política que a gente vem construindo no país de cuidado, redução de danos, prevenção para as pessoas usuárias de drogas e essa PEC impede que a gente venha a avançar nessas que são as indicações da Organização Mundial de Saúde (OMS), da ONU. A gente sabe que no mundo a maior parte das pessoas que fazem uso de algum tipo de substância não tem problemas com esse uso e a pequena parte que tem problemas precisa de cuidado, não de uma política de segurança pública que utiliza a violência como resposta do Estado a esse contexto de proibição, então essa PEC ameaça o direito à vida da sociedade."

A PEC não diferencia consumidores de traficantes. Essa definição acontecerá no flagrante, ou seja, caberá à polícia. Diante disso, Ingrid pontua que essa não é a melhor instância para fazer isso. "O Brasil é o país hoje que mais encarcera, essa não diferenciação de quem é usuário e de quem é traficante é o que tem feito desde 2016 o aumento absurdo do encarceramento no Brasil, em especial de mulheres negras. A gente sabe que tem muitas pessoas que estão presas hoje que foram presas com quantidades de uso, por ser usuário de drogas. Então o que a PEC vai fazer é mais uma vez criminalizar essas pessoas que já estão na ponta da guerra, que vem aí vitimando, violentando pessoas negras e pobres que estão nas periferias."

De acordo com a ativista, é preciso fazer a discussão com a sociedade e tirar o debate do campo de uma agenda moral para uma agenda de direitos. "Se a gente viola o artigo 5º dizendo que as pessoas não têm mais o direito de utilizar o seu corpo e tomar suas decisões, a gente está fazendo um retrocesso histórico na luta por um país democrático."

A entrevista completa, feita pela apresentadora Luana Ibelli, está disponível na edição desta terça-feira (16) do Central do Brasil, que está disponível no canal do Brasil de Fato no YouTube.

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Edição: Nicolau Soares