Portas abertas

Alimentação e cultura: Armazém do Campo, do MST, e livraria Expressão Popular inauguram novo espaço no centro de SP

“Não é só comida ou livro, propomos um modelo de socialização para os espaços urbanos”, diz dirigente do MST

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
O Armazém e a Livraria estão abertos ao público de segunda a sexta das 9h às 20h e aos sábados das 9h às 19h - Gabriela Moncau

Um novo ponto de encontro para eventos formativos e culturais, venda de livros e de alimentos saudáveis produzidos pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi inaugurado neste sábado (27), no centro da capital paulista. O Armazém do Campo e a livraria da editora Expressão Popular agora compartilham um espaço na Alameda Nothmann, 806, no bairro de Campos Elíseos.  

Segundo João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST, a geografia escolhida para o novo espaço não é à toa e tem o objetivo de incidir nas disputas envolvendo o futuro do centro de São Paulo.  

A região, palco histórico de manifestações e atuação de movimentos populares, é alvo da especulação imobiliária e de processos de gentrificação. Também concentra boa parte da população em situação de rua da cidade, bem como a chamada Cracolândia.    

É para o Campos Elíseos que o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou ter a intenção de transferir o centro administrativo do governo estadual, num processo de “requalificação” da região, com uma intervenção de R$ 2,4 bilhões feita por meio de Parceria Público Privada (PPP). 

“Nós não podemos deixar que esse bairro seja um novo shopping center, uma Faria Lima ou coisa parecida. Tem que manter essa tradição do popular e, acima de tudo, de alternativa: um modelo de São Paulo que nós defendemos”, afirma Rodrigues. 

“Inauguramos este espaço para debater cultura, educação e alimentação no centro de São Paulo, uma das cidades mais importantes do mundo, numa região popular, abandonada pelo Estado”, descreve João Paulo. “O Estado vai ter que achar uma alternativa de como tratar o tema da Cracolândia. Acho que a esquerda também deveria tratar esse tema com o devido cuidado”, diz. 

“Nós, os movimentos populares, estamos dizendo: é possível ter espaços bonitos, de qualidade e que sejam organizados e tocados pelo povo”, ressalta o dirigente do MST. “Por isso é muito mais que o espaço da livraria, do Armazém do Campo. É um modelo de socialização dos espaços urbanos das grandes capitais”.   

A inauguração 


O evento de inauguração foi gratuito, com barracas de comida, roupas africanas e apresentações culturais / Gabriela Moncau

Com jogos, música, comida, apresentações culturais, falas de políticos e ativistas, o evento gratuito de inauguração começou pela manhã, com programação até o fim do sábado. 

Durante a tarde foi lançada a reedição, pela Expressão Popular, de Vidas Secas, obra clássica de Graciliano Ramos. Escrito entre 1937 e 1938, o romance conta a história, a relação e as emoções de uma família migrante do sertão nordestino, atravessada pela seca, a fome e a luta pela sobrevivência. 

O armazém e a livraria 

Os armazéns do campo surgiram há oito anos como uma aposta do MST de ter um espaço de diálogo entre o campo e a cidade, apresentando para o público urbano, na prática, o que se produz nas áreas de reforma agrária. Atualmente há 30 lojas espalhadas pelo Brasil. 

Ademar Ludwig, coordenador da rede Armazém do Campo, passava apressado carregando panelas de arroz carreteiro e galinhada com mandioca para o almoço servido durante a estreia do novo endereço. 

“Já temos oito anos de história, mas era um protótipo. Quando a gente concebeu, era isso aqui. Um espaço onde tu vai encontrar literatura, gastronomia, alimento e vai encontrar os seus”, relata Ludwig.  

Já a Expressão Popular é uma editora fundada em 1999 com o objetivo de produzir livros a preços acessíveis. Para isso, conta com autoras e autores que comumente cedem os direitos de criação, traduções ou imagens e com a colaboração voluntária em etapas da produção dos livros. São cerca de 700 publicações, 400 delas formando o catálogo permanente da editora.  


Com o café do Armazém ao lado, a Livraria Expressão Popular vende livros de diversas editoras / Gabriela Moncau

Ao lado de quadros de figuras como Lélia Gonzalez, Milton Santos, Maria Felipa, Malcom X, Abdias Nascimento e Claudia Jones que decoram a Livraria, Lia Urbini, que trabalha na edição e revisão da Expressão Popular, conta que é a primeira vez que a editora abre as portas ao público em um espaço seu. “Depois de 25 anos de existência”, lembra. 

Para além das publicações da Expressão Popular, cujas linhas passam por agroecologia, luta de classes, pedagogia socialista, entre outras, a loja oferta livros de outras editoras.  

“É um espaço que concentra visitas militantes em geral, para vários tipos de atividades. E a gente quer que, além do nosso catálogo, outras editoras estejam participando dessa parte de formação”, conta Urbini. 

 “Articulada com o Armazém, a livraria faz essa ênfase que comida também é cultura, entendendo essa conexão com uma formação mais ampla. Livros para circular com gente que faz a luta”, resume.   

Edição: Geisa Marques