Eleita suplente como vereadora em Curitiba em 2020 pela candidatura coletiva “Mandata das Pretas”, a fotojornalista Giorgia Prates assumiu o mandato em 2023 e diz que deseja continuar sua caminhada na política para dar conta do que chama do guarda-chuva de pautas que a população periférica mais precisa, que é a garantia de justiça social, equidade social e dignidade. Mas, o caminho até aqui tem sido de muitos desafios, principalmente no dia a dia na Câmara Municipal de Curitiba, enfrentando com conteúdo e propostas o racismo e a lgbtfobia.
“Só a presença de um corpo como o meu, de uma mulher preta, periférica, sapatona e axé já causa receio e espanto. Então, todo dia é uma ofensa ou uma provocação que a gente escuta. A tentativa é de me colocar em um lugar já esperado, o da “preta raivosa” que perde a cabeça e mostra destempero fazendo exatamente o que eles querem e, de novo, fazer parecer que pessoas negras estão ali apenas para serem escadas de racistas e, no meu caso, lgbtfóbicos,” cita.
Giorgia diz que compreende a dinâmica que tentam a colocar e frustra as expectativas entregando mais trabalho. “Isso é o esperado e, da minha parte, vou para as sessões bem atenta, pronta para frustrar a expectativa deles porque sei quais são os meus objetivos na política e, com certeza não são eles que irão ditar a caminhada de uma mulher preta, pois ja estive de frente a muitos iguais a eles, inúmeras vezes,” diz. Importante relembrar que em toda a história da Câmara Municipal de Curitiba, Giorgia é a segunda vereadora negra a ocupar uma cadeira.
Falando em objetivos, em um ano de trabalho, a vereadora apresentou 40 projetos de lei, fez 95 pedidos de informação, 38 sugestões à Prefeitura e destinou R$ 1.800.00000 em emendas parlamentares para as áreas periféricas da cidade. Entre os projetos apresentados, alguns já viraram lei em Curitiba, como é o caso da criação do CREAFRO – Centro de Referência Afro Enedina Alves Marques.
“O pedido de criação do CREAFRO foi protocolado há 1 ano e, em 4 meses de existência, o Centro de Referência Afro realizou cerca de 500 atendimentos. O espaço conta com psicóloga que acompanha as denúncias de racismo e injúria racial e também realiza cursos como o de letramento racial, ações culturais e eventos como o Roda Jurídica, onde a população negra pode tirar dúvidas sobre seus direitos civis,” explica.
Além desta proposta, outras transitam pelo que o seu mandato chama de eixos de trabalho, tais como negritude e combate ao racismo, moradia social, diversidade e inclusão, juventude, cultura, direitos das mulheres, causa animal, meio ambiente, defesa dos servidores municipais, direitos humanos e direita à cidade, etc.
Lutar contra a invisibilização do trabalho
Apesar de comemorar o resultado do seu trabalho, Giorgia diz que ocorrem muitas tentativas de ainda invisibilizar o trabalho de uma parlamentar negra.
“Enfrento tentativas de invisibilização. Já tive a autoria de projetos ignorada pela imprensa, como no caso da Lei Vini Jr, em que a RPC chamou o vereador Herivelton para falar, quando eu e o Euler éramos os principais autores. Na Procuradoria da Mulher, que assumi interinamente, também aconteceu isso: nossa campanha de arrecadação de itens de higiene básica foi pauta da TV, mas sequer mencionaram meu nome. E, foram vários esses momentos de apagamentos da imprensa,” conta.
Mudar a vida das pessoas
Diante dos desafios é que ela se fortalece, pois diz que sua experiência de vida a trouxe até aqui aprendendo a ser resiliente para continuar. “São vários os desafios que tenho enfrentado nessa jornada, mas nada disso, em absoluto, me impediu de fazer políticas importantes para a cidade. Isso porque toda a experiência de vida que trago me ensinou que essa dinâmica insana tenta nos barrar para nos manter no mesmo lugar, mas eu continuo seguindo porque sei o quanto isso é necessário para que haja uma real mudança na vida das pessoas e também na política.”
Giorgia cresceu na favela de São Paulo, vendo a mãe sempre fazendo pontes para resolver a vida de todos em volta. A casa sempre cheia e essa convivência sempre em turma trouxeram a lição de que o maior sentimento que precisa existir numa sociedade é o senso de coletividade.
Ativismo político e fotografia a inspiraram para entrar na política
Giorgia Prates integrou a redação do Brasil de Fato Paraná em 2020, fazendo importantes coberturas das lutas populares. Em 2023 deixou o jornal para assumir a vereança / Fotografia: Lis Guedes
E, foi em Curitiba, através do ativismo político e da fotografia que ela despertou para a política. Com olhar de fotógrafa sensível e denunciante dos problemas sociais, quis ir além da denúncia. Seu trabalho na fotografia e cinema foi premiado duas vezes no Festival Cannes de Criatividade, mas segundo ela, o propósito de denunciar os problemas sociais não gerava mudanças na vida das pessoas. Daí veio a inspiração para entrar na política e ocupar o espaço para fazer as políticas públicas chegarem a quem mais precisa.