Espero que essa dança cresça aqui no país; não sei de que maneira, mas quero que ela cresça
Fora dos conhecidos bares que prometem o melhor mojito e longe dos cartões postais para turistas, nas ruas e esquinas de Cuba, os jovens modelam suas paixões e amores.
Em Havana, quando o escaldante sol se põe, garotos e garotas se reúnem no Paseo del Prado, uma longa avenida transformada em seu próprio espaço cultural. Todos os dias, eles se reúnem ali para andar de skate, ouvir música, dançar ou simplesmente se divertir.
Como conta Brandon Garzon, dançarino que frequenta o espaço: "Paseo del Prado é como se fosse minha segunda casa. Quando não estou em casa, estou lá. Porque é lá que todos nós nos reunimos para treinar, conversar e relaxar. É como uma família. É minha segunda família, além da minha própria. Porque é lá que todos nós conversamos sobre nossos problemas, damos conselhos uns aos outros, além da dança. E também, quando você está aprendendo... não nascemos sabendo, estamos sempre 'olha, eu gosto disso', e quem está lá te ensina. Mal ou bem, mas ele te ensina. Então, pelo menos, você tem uma base e isso é uma coisa que eu admiro em Prado", diz.
A chegada tardia da Internet na ilha marcou a maneira como os jovens cresceram e acessaram a cultura hip-hop. Foi a partir das trocas, reuniões que eles descobriram músicas, literatura, filmes e o breakdance.
Esse é o caso de Kharly, que cresceu longe da cidade, em um vilarejo rural. "A primeira vez que vi breakdance foi um amigo que levou uma fita cassete para minha casa. Tive sorte, porque naquela época, pelo menos em Cuba, que é um país de terceiro mundo, praticamente não tínhamos internet. Então, tudo era um luxo. Tudo coincidiu. Ele me mostrou o vídeo, eu tinha mais ou menos 11 anos de idade, e foi um boom, sabe? Eu vi aquilo e fiquei atônito, repassei umas cinco ou seis vezes e disse ao meu amigo: 'Não vá, fique para que eu possa ver o vídeo novamente'. Foi amor à primeira vista, sabe? Eu vi aqueles movimentos e vi aquelas pessoas que eram livres. Eu queria fazer aquilo. Quando vi o vídeo, disse: 'Quero fazer isso, quero e quero fazer isso'. De fato, comecei a chorar e não sabia por quê. Foi uma emoção que nada na vida, desde aquele momento, me fez chorar de emoção como daquela vez".
Com essa energia que o breakdance se fortaleceu em Cuba. Para os B-boys cubanos (como são frequentemente chamados os jovens dançarinos de break), as condições não são fáceis. A atual crise no país, provocada, sobretudo, pelo bloqueio estadunidense, dificulta o acesso aos recursos necessários para um treinamento fisicamente exigente.
Além disso, eles apontam que enfrentam preconceitos das instituições culturais oficiais, que geralmente não lhes dão um lugar na educação formal. No entanto, nada disso impediu que dezenas de jovens dediquem seu tempo a se aperfeiçoar dia após dia.
"O treinamento do B-boy é muito exigente. Chegamos a um ponto em que não conseguimos manter uma dieta como a de um atleta, por assim dizer. E é complicado, simplesmente por causa da situação pela qual o país está passando. Acho que esse é o ponto do B-boy cubano. Porque, apesar de todas essas coisas que acontecem, eles estão sempre chegando lá, sabe? Estão sempre avançando, estão sempre indo em frente, como se diz no bom cubano", fala Leosdanis Gómez, conhecido como B-boy Xero.
Muito mais do que um simples hobby, para muitos jovens, ser um B-boy é uma marca de identidade, uma forma de pertencimento. Uma cultura baseada em compartilhar e melhorar a si mesmo a cada dia. Uma forma de realização pessoal que é valorizada pelo reconhecimento dos colegas. Não se trata apenas de um caminho individual: é o aprendizado com os outros que dá significado a esse ritmo compartilhado.
Alejandro Barreras, que usa o nome artístico B-boy Zalamander, fala dos desafios enfrentados: "Tudo valerá a pena se eu puder ver que minha mãe está orgulhosa de mim. Se minha família sentir orgulho de mim. Teve gente na rua que acreditou no que eu estava fazendo. E havia outras que não acreditavam. No momento em que eu olhar para trás e me ver 15 anos atrás tentando lutar por isso e olhar para o presente e me ver realizado. Nesse momento, todas as pessoas, minha mãe, meu pai, a namorada que me apoiou. Todas essas pessoas virão à minha mente e eu serei a pessoa mais feliz do mundo. Há momentos em que você persegue algo apenas por perseguir. Você não sabe o que realmente vai fazer com ela. Porque você não conhece as reviravoltas da vida. Mas se minha mãe pudesse se orgulhar de mim, se eu pudesse ajudar minha mãe a ter uma vida mais fácil".
Ser grande entre os grandes e levar alegria ao povo. Esse é o desejo desses B-boys, que sonham – como outros sonharam no passado – em colocar Cuba no topo do cenário mundial da dança, acima de qualquer adversidade.
"O que me motiva a continuar, além do meu sucesso pessoal, é que quero competir com os melhores do mundo, desafiar-me com eles e conhecê-los. Porque no palco somos guerreiros e discutimos uns com os outros, mas no final somos amigos. Esse é o meu sonho. Seria a realização de meu sonho. Ver Cuba grande, uma potência no B-boy. Como estamos na luta com Mijaín [Lopez, lutador cinco vezes medalhista de ouro em Olimpíadas] e como estamos com Erislandy", pontua o B-boy Yunior Velazquez Pérez.
"Espero que essa dança cresça aqui no país. Não sei de que maneira, mas quero que ela cresça. Para que, nem que seja, aqueles que já estão velhos ou eu mesmo... Pelo menos eu disse 'naquela época eu dançava' e pelo menos eu fiz parte daquele grão de areia que contribuiu para que essa dança em Cuba fosse grande. É isso que eu quero", acrescenta B-boy Druing.
Edição: Nicolau Soares