Com a intenção de concorrer ao governo do Rio de Janeiro, o prefeito da capital carioca, Eduardo Paes, anunciou que pretende fazer uma visita a El Salvador, para aprender com o modelo de segurança implementado pelo governo de extrema direita de Nabil Bukele, que acumula denúncias de violações de direitos humanos.
O Centro de Confinamento do Terrorismo (Cecot), uma penitenciária gigantesca de El Salvador, conhecida por suas duras condições de detenção, passou a ser utilizada para a deportação de imigrantes, após um acordo feito entre Bukele e o presidente estadunidense, Donald Trump. Tanto Bukele como Trump compartilharam imagens de prisioneiros acorrentados, com a cabeça raspada e amarrados, e rejeitaram os protestos de juízes e opositores em relação às violações de direitos humanos cometidas nesse presídio.
Aceitar os deportados de Trump na megaprisão Cecot aproximou Bukele da Casa Branca, e serviu como propaganda do centro penitenciário com capacidade para 40 mil pessoas, que tem atraído o interesse de outros governos de extrema direita, como é o caso da Argentina.
Desde que chegou ao poder, em 2019, o governo Bukele prendeu quase 2% da população do país, estimada em seis milhões de pessoas, por meio de ordens judiciais e processos. Mais de 75 mil pessoas foram presas na política apelidada de “guerra às gangues”.
Na última semana, a ONG Human Rights Watch (HRW) acusou os EUA e El Salvador pelo “desaparecimento forçado e detenção arbitrária” de mais de 200 venezuelanos. “Os desaparecimentos forçados constituem uma grave violação do direito internacional dos direitos humanos”, denuncia Juanita Goebertus, diretora da divisão para as Américas da HRW, citada em um comunicado.
Caso emblemático
No início de abril, a Casa Branca foi forçada a admitir que, devido a um “erro administrativo”, um salvadorenho que vivia nos Estados Unidos sob proteção legal foi envolvido em um processo de deportação e enviado para a prisão de Bukele. O caso do salvadorenho Kilmar Ábrego García, casado com uma cidadã estadunidense e pai de uma criança pequena, tornou-se simbólico. Ele foi uma das mais de 250 pessoas expulsas para El Salvador em 15 de março pela administração Trump, a maioria delas acusada de pertencer à gangue venezuelana Trem de Aragua, que Washington declarou como uma organização “terrorista”.
Mesmo reconhecendo que, em 2019, uma corte revogou permanentemente a possibilidade da expulsão de García para El Salvador, a Casa Branca argumenta que, por ele estar detido em uma prisão salvadorenha, não cabe aos Estados Unidos trazê-lo de volta. Por sua vez, Bukele afirmou, durante reunião com Trump na segunda-feira (14), que não tem o “poder” para enviá-lo de volta aos Estados Unidos.
Sem citar seu nome, Trump voltou a afirmar na segunda à noite que Ábrego García é “membro da gangue MS-13” e um “terrorista estrangeiro”.
Em audiência na terça (15) em Greenbelt, perto de Washington, um representante do Departamento de Segurança Doméstica (DHS, na sigla em inglês) disse que o Poder Executivo está disposto a deixá-lo entrar no país “caso compareça pessoalmente na fronteira”.
Antes da audiência, sua esposa pediu a Donald Trump e a Bukele que deixassem de “brincar politicamente com a vida de Kilmar”.”Hoje completam 34 dias de seu desaparecimento”, insistiu Jennifer Vásquez Sura aos jornalistas. “Não vou deixar de lutar até vê-lo com vida”, acrescentou, ao lado de dezenas de manifestantes que compareceram em seu apoio.
Na semana passada, a Suprema Corte confirmou a decisão de uma juíza de instância inferior que ordenava à administração Trump “facilitar” o retorno de Kilmar Ábrego García aos Estados Unidos.
Essa juíza, Paula Xinis, solicitou um informe diário sobre o paradeiro e a situação do salvadorenho, e sobre as ações tomadas ou previstas para “facilitar seu retorno”.
“Mas recebi muito pouca informação interessante”, queixou-se Xinis ao Executivo. “Há uma enorme lacuna entre o que você diz e a situação atual do tema”, acrescentou.
O governo de Trump apresentou no sábado uma declaração escrita de um funcionário do Departamento de Estado confirmando pela primeira vez que ele “está vivo e seguro” na prisão de El Salvador. Acrescentou que ele “está retido lá de acordo com a soberania” daquele país, mas não forneceu informações sobre as medidas adotadas ou previstas para seu retorno.
Governo marcado pelo autoritarismo
Eleito em 2019 prometendo mão de ferro para governar, Bukele autorizou no ano seguinte as Forças Armadas a invadirem o Congresso. Em 2021, passou leis que permitem que o Executivo interviesse na Suprema Corte do país, ferindo o equilíbrio entre os poderes.
Em 2022, Bukele declarou regime de exceção que suspendeu garantias constitucionais e gerou inúmeras denúncias de prisões arbitrárias, sem ordem judicial e mortes sob a custódia do Estado.Buekele foi reeleito em 2024 emuma campanha marcada pelo medo, terror e uma grande abstenção.
*Com AFP