Após terem as casas demolidas pelo DF Legal na segunda-feira (5), 83 moradores do Setor de Inflamáveis, localizado no Setor de Chácaras Lúcio Costa no Distrito Federal, ocuparam a Câmara Legislativa do DF (CLDF) por dois dias dormindo nos corredores da Casa. Entre os acampados estavam mulheres, crianças e homens em situação de vulnerabilidade. O grupo deixou a CLDF na quinta-feira (8), mas pretendem retornar caso a situação não seja resolvida.
Pelo menos 53 famílias estão desabrigadas após uma operação de despejo forçado realizada pelo Governo do Distrito Federal (GDF). A derrubada das moradias afetou diretamente aproximadamente 300 pessoas, das quais cerca de 170 são crianças e adolescentes.
A saída temporária da CLDF aconteceu no fim da tarde desta quinta (8) devido a uma agenda das famílias nesta sexta-feira (9) com o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), que acontecerá na própria ocupação.
No entanto, os moradores afirmam que irão retornar à Câmara.“Vamos voltar para a CLDF e ficar lá até conseguir alguma coisa”, afirma Ranni Silva, moradora há sete anos do Setor de Inflamáveis.
As famílias receberam autorização do presidente da CLDF, deputado Wellington Luiz (MDB-DF), para permanecer na sede do Legislativo desde terça-feira (6). Além dele, os deputados distritais Gabriel Magno (PT-DF) e Fábio Felix (Psol-DF) também prestaram apoio e estão intermediando a situação com os órgãos competentes.
“Eles solicitaram o apoio da Câmara Legislativa, e esse é o nosso papel. São famílias vulneráveis — mulheres e crianças, em sua grande maioria — e, por essa razão, a CLDF está dando todo o apoio necessário para tentar solucionar esse grande problema”, declarou o presidente da Casa.
Segundo o parlamentar, as famílias receberam alimentação e segurança durante o período na CLDF, com apoio da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes).
Além disso, a solidariedade da sociedade civil tem se manifestado por meio de doações como água, lanches, itens de higiene, fraldas e absorventes, entregues no Setor de Inflamáveis e na CLDF. Entre os apoiadores estão o coletivo Baobá de Mulheres Negras, o Sindicato dos Bancários, o Templo de Umbanda Caboclo Tupinambá D’Oxum — que também abriga famílias —, entre outros grupos e entidades.
“São famílias em situação de extrema vulnerabilidade. A maioria vive com menos de um salário mínimo por mês e depende de programas sociais. Grande parte dos lares é chefiada por mulheres jovens, com três a quatro filhos. A realidade é de uma miserabilidade absurda”, relata Keka Bagno, assessora da Comissão de Direitos Humanos da CLDF.
Intermediação e falta de solução
A Comissão de Direitos Humanos da CLDF acompanha o caso desde outubro de 2024. Segundo Keka Bagno, houve uma tentativa de articulação da presidência da Câmara com o GDF para tentar adiar as remoções, diante da situação de vulnerabilidade das famílias, bem como buscar uma realocação das famílias. A intenção da Comissão era conseguir a realocação das famílias para núcleo Tamanduá, no Recanto das Emas.
“Fomos acionados porque os moradores já tinham conhecimento da possibilidade de despejo. Uma situação parecida ocorreu em 2019, quando a Defesa Civil identificou que uma das ruas da área era de risco, devido à passagem de um gasoduto. Porque temos uma área que vai ser destinada para famílias em situação de risco, de vulnerabilidade extrema, no Recanto das Emas chamada Tamanduá”, explicou Keka.
Segundo ela, causou estranhamento o fato de que, além de agentes da DF Legal, também havia representantes da Terracap participando da derrubada. Informações extraoficiais passadas para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, indicam que a ação não teria partido da Defesa Civil, mas da 5ª Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), ligada ao Ministério Público do DF.
Em resposta ao Brasil de Fato DF, o DF Legal informou que “a ação foi motivada a partir de um relatório de constatação de risco feito pela Defesa Civil”.
Protesto na EPTG

Na manhã de quinta-feira (8), os moradores organizaram um protesto na Estrada Parque Taguatinga (EPTG), com a faixa: “Empresas pedem, o governo obedece. E o povo dorme na rua”. A manifestação teve como objetivo chamar a atenção das autoridades e da sociedade para a situação das famílias despejadas.
Está prevista para esta sexta-feira (9) uma nova ação de remoção, que pode atingir, inclusive, o Templo de Umbanda Caboclo Tupinambá D’Oxum. “Nós recebemos um mandado informando que vai ser derrubado amanhã”, afirma Mãe Jéssica d’Osun, dirigente da casa.
A comunidade segue mobilizada para tentar impedir novas demolições e buscar uma solução definitiva para as famílias afetadas.