A ameaça de impor tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros feita pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com implementação prevista para o dia 1º de agosto, vai além do comércio e representa uma jogada política, segundo o economista Paulo Kliass. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, ele classifica a medida como “absurda” e sem justificativa econômica, e afirma que o Brasil deve responder com firmeza.
“O Brasil importa mais dos Estados Unidos do que exporta. Se alguém tem que reclamar nessa relação, somos nós, não eles”, pontua Kliass. Para o economista, as tarifas anunciadas por Trump não visam corrigir desequilíbrios comerciais, mas interferir na política interna brasileira, especialmente na defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que responde ao julgamento da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF).
Kliass lembra que a medida sequer foi oficializada formalmente. “Não teve nenhuma medida oficial do Estado norte-americano. Apenas uma declaração no X (ex-Twitter) do presidente”, diz. “Trump está numa guerra aberta contra qualquer iniciativa multilateral, incluindo a ONU [Organização das Nações Unidas] e a Organização Mundial do Comércio (OMC)”, critica.
Resposta brasileira
O Brasil recorreu à OMC, mas, segundo o economista, isso pode não ser suficiente. Kliass destaca que o país precisa se preparar para todos os cenários, inclusive com a busca de novos parceiros comerciais. No entanto, alerta que encontrar substitutos para o mercado norte-americano não se faz “da noite para o dia”.
“Se Trump recuar, será também um recuo político-diplomático”, indica. Ele aponta riscos para setores estratégicos, como a aviação, carnes, pescados, café e suco de laranja. Duas empresas do setor já processaram o presidente estadunidense na Justiça dos EUA por conta do prejuízo esperado.
No Brasil, Kliass critica a atuação isolada de empresários e defende uma resposta coordenada. “O que seria fundamental acaba ficando de lado se não tiver representantes dos trabalhadores na mesa de negociação. Tem que criar um movimento nacional em defesa do Brasil”, defende. Para ele, o apoio do governo a empresas precisa vir acompanhado de contrapartidas, como garantia de empregos, salários e sustentabilidade.
“O PIX é nosso, ninguém tasca”
Questionado sobre o ataque ao Pix, citado por Trump como alvo indireto, o economista reforçou que a ferramenta, elogiada até por nomes conservadores como o vencedor do prêmio Nobel Paul Krugman, incomoda interesses dos EUA. “Eles não estão conseguindo entrar no Brasil com suas plataformas financeiras porque o Pix se universalizou. É gratuito e popular”, observa.
Kliass aponta ainda que o Brasil tem instrumentos para responder à altura, como a suspensão de royalties de patentes norte-americanas, a revisão do uso da base de Alcântara e retaliações contra empresas de cartões, bancos e petrolíferas dos EUA. “A medida pode desorganizar não só a economia brasileira, mas também a dos EUA”, lembra.
Para o economista, a conjuntura reforça a necessidade de uma reação unificada. “O caminho apontado está bom, mas precisa colocar o povo junto. Como disse um amigo meu: o Pix é nosso, ninguém tasca”, cita.
Para ouvir e assistir
O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.