Em um momento decisivo para a luta pela terra no Brasil, o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) foi recebido na quarta-feira (23) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no Palácio do Planalto, no auge da mobilização da Semana Camponesa.
A audiência marcou a retomada do diálogo direto com o governo federal e rendeu, segundo o movimento, compromissos importantes para destravar pautas históricas da reforma agrária.
A reunião, que contou com a presença de João Paulo Rodrigues e Ceres Hadich, dirigentes nacionais do MST, abordou desde a obtenção de terras para cerca de 62 mil famílias acampadas até políticas de crédito, habitação, saúde e educação no campo.
“O governo Lula reafirmou seu compromisso com a pauta e sinalizou que iniciará articulações com os ministérios para garantir avanços ainda este ano e ao longo de 2026”, relatou a dirigente Esther Hoffmann, do MST, que destacou também a importância de manter a pressão para que as promessas se concretizem.
Com o lema “Para o Brasil alimentar, Reforma Agrária Popular!”, a jornada mobiliza mais de 17 mil militantes em 22 capitais e cobra que o Estado brasileiro finalmente cumpra seu papel histórico de garantir terra, moradia e dignidade às populações do campo.
INCRA MG ocupado
Em Minas Gerais, onde mais de cinco mil famílias aguardam regularização fundiária, o cenário também é de mobilização. Na terça-feira (22), cerca de 500 militantes ocuparam a sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em Belo Horizonte, para denunciar o atraso na efetivação de áreas já decretadas e cobrar providências imediatas.
Uma das principais pautas do estado é a desapropriação da área do Acampamento Terra Prometida, em Felisburgo, palco de um dos episódios mais violentos da história da luta pela terra no Brasil.
Como parte da mobilização e em defesa da memória dos cinco trabalhadores rurais sem terra assassinados em 2004, o MST lançou, também na terça-feira, o clipe “Acampamento Terra Prometida – 23 anos sem reforma agrária”, que resgata a trajetória de resistência iniciada em maio de 2002, quando 230 famílias ocuparam a Fazenda Nova Alegria, no Vale do Jequitinhonha.
“O Estado, até hoje, não reconheceu o direito dessas famílias à terra. A omissão dos sucessivos governos prolonga a violência e legitima a impunidade”, afirmou o movimento, em nota.
Apesar da dor, o acampamento se tornou símbolo de resistência e produção agroecológica, com escola, moradias, memória viva e distribuição de alimentos para os Armazéns do Campo e programas institucionais. O clipe reforça a mensagem: “Felisburgo vive. Terra Prometida resiste”.
Outra área estratégica em Minas Gerais é o Acampamento Quilombo Campo Grande, onde 459 famílias aguardam a regularização definitiva. A área foi decretada como de interesse para reforma agrária em março deste ano, mas até agora o processo de desapropriação não foi concluído. Localizada na antiga Fazenda Ariadnópolis, a comunidade produz mais de 375 cultivos diferentes e é referência nacional na produção de café agroecológico.
“Entendemos que este será um ano que exigirá muitas lutas para concretizar os compromissos assumidos. As famílias não podem esperar mais 20 anos”, reforça Hoffman.
As ocupações no Incra
As ocupações das sedes do Incra iniciadas na terça-feira (22) integram a estratégia nacional da Semana Camponesa para cobrar a efetivação de políticas agrárias. Além de Belo Horizonte, ações similares ocorreram em estados como Ceará, Pernambuco, Paraíba, Piauí, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Pará, Mato Grosso, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal. As ocupações terminaram na quarta-feira (23), após as negociações com o presidente Lula.
Durante a jornada, o MST também divulgou uma carta à sociedade brasileira, cobrando o governo federal por ações concretas e condenando a atuação do Congresso Nacional, que recentemente aprovou o PL 2.169/2021, apelidado de “PL da Devastação”. Para o movimento, trata-se de um ataque direto à natureza, aos povos do campo e aos direitos socioambientais.
A carta alerta que a reforma agrária é um instrumento de soberania nacional, contrapondo-se ao modelo do agronegócio, considerado “entreguista, golpista, saqueador e antipatriótico”.