Na última quinta-feira (24), um grupo de 11 senadores dos Estados Unidos enviou ao presidente Donald Trump uma carta na última apontando “preocupações com o claro abuso de poder” das ameaças feitas pelo governo estadunidense ao Brasil. O grupo aponta a incoerência do argumento comercial utilizado por Trump e escancara a impopularidade da medida no país.
Os parlamentares apontam os reflexos da medida de Trump na economia dos Estados Unidos. “Interferir no sistema legal de outra nação soberana estabelece um precedente perigoso, provoca uma guerra comercial desnecessária e coloca cidadãos e empresas americanas em risco de retaliação”, dizem. Eles apontam que o comércio com o Brasil sustenta 130 mil empregos nos Estados Unidos e que ações do governo “aumentariam os custos para as famílias e empresas americanas”.
“Usar todo o peso da economia americana para interferir nesses processos em nome de um amigo é um grave abuso de poder” e demonstra “a disposição de sua administração em priorizar sua agenda pessoal em detrimento dos interesses do povo americano”, o grupo diz ao presidente.
Os parlamentares assumem uma nova ofensiva de um movimento que vêm sendo observado nas últimas semanas. Organizações e parlamentares estadunidenses têm se posicionado contra a gestão Trump e apontado o risco das ações diplomáticas e comerciais tomadas por seu governo. Em 15 de julho, a US Chamber, maior entidade de representação empresarial dos Estados Unidos, defendeu uma negociação entre os países e apontou que a medida de Trump “impactaria produtos essenciais para as cadeias de suprimentos e os consumidores dos Estados Unidos, aumentando os custos para as famílias e reduzindo a competitividade das principais indústrias americanas”.



Para Michael Galant, pesquisador do Centro para Pesquisa Econômica e Política (CEPR, na sigla em inglês) e membro da Internacional Progressista, a carta é “um claro indicativo da impopularidade das tarifas de Trump contra o Brasil”.
“É possível perceber que o tom está focado em como as tarifas vão encarecer o custo de vida dos estadunidenses”, aponta o pesquisador.
Apesar de estarem no partido oposto ao de Trump, Galant aponta que não é como se os parlamentares fossem de esquerda. “Todos os signatários da carta são do centro do Partido Democrata, eles não podem ser acusados de serem de esquerda. Eu acredito que os democratas veem isso como uma vantagem, poder dizer: ‘Trump quer tornar o café e o suco de laranja mais caro para você só para defender uma tentativa de golpe’”.
Para Galant, movimentação dos parlamentares contra a medida é facilitada por duas razões. Primeiro, o reconhecimento da vitória de Lula por Joe Biden, ex-presidente dos Estados Unidos, “fez com que o Partido Democrata entendesse claramente que Bolsonaro não é um ator democrático legítimo e, portanto, encarasse essas tarifas como uma tentativa injusta de interferência”. Os senadores que subscrevem a carta a Trump corroboram a visão, acusando o governo de “forçar o sistema judiciário independente do Brasil a interromper o processo contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro”.
Dois anos antes do 8 de janeiro brasileiro, a sede do parlamento dos Estados Unidos também foi invadida por apoiadores de Donald Trump, então derrotado nas urnas, em uma tentativa de golpe de Estado – o que faz a investigação brasileira ser de fácil associação para membros do Capitólio.
A segunda razão é a confusão de justificativas de Trump sobre as medidas. “Está claro que Trump está usando as tarifas como sanções. Ou seja, ele apagou a linha que separa uma medida da outra e, de fato, acionou mecanismos legais dos EUA que são usados para impor sanções ou medidas de emergência”, explica o pesquisador. “No caso brasileiro, a justificativa que ele utiliza, da balança comercial, é totalmente falsa. Essas tarifas são claramente motivadas por um desejo de coagir o governo brasileiro a seguir uma linha determinada pelo governo Trump”.
A falta de critério -— ou ainda o uso de critérios mentirosos, como um déficit comercial que não existe — é apontada pelos senadores estadunidenses como um motivo para que o país perca influência na América Latina. “Estamos preocupados que suas ações para minar um sistema judiciário independente apenas aumentarão o ceticismo em relação à influência americana em toda a região”, declararam.