O Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) venceu neste domingo (27) as eleições para prefeitos nas maiores cidades do país. Caracas, Maracaibo, Valencia, Maracay e Mérida terão novamente prefeitos do bloco de esquerda. Já a direita conseguiu manter o poder em seu principal reduto eleitoral, as cidades que, hoje, têm a maior concentração de renda: Chacao, Lecheria, Baruta e El Hatillo.
O presidente Nicolás Maduro afirmou que o PSUV passou de 212 para 285 prefeituras e ampliou seu domínio territorial. Enquanto isso, a oposição ficou com 50 municípios.
Mesmo que Maduro tenha anunciado o resultado definitivo, o presidente da Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Elvis Amoroso, afirmou às 00h28 de segunda-feira (26) que 82,45% das urnas estavam apuradas e que, até aquele momento, o órgão eleitoral podia retificar a eleição de 304 das 335 prefeituras e 2.182 cargos de vereador.
Segundo o CNE, pouco mais de 6,273 milhões de eleitores participaram do pleito, o que representaria 44% do total. No entanto, considerando que o número de eleitores registrados pelo próprio órgão eleitoral era de pouco mais de 21 milhões, a participação total seria de 29%.
Nas 24 capitais, o PSUV repetiu o feito das eleições de governadores e venceu 23.
A principal vitória se deu na capital do país. Em Caracas, Carmen Melendez recebeu 350.995 votos (86%) e será novamente a prefeita pelo PSUV. Ganhar na principal cidade da Venezuela era importante para o chavismo ter não só uma maior incidência sobre um município que move uma parcela importante do dinheiro que circula no país, mas manter o poder em uma cidade que é sede da maior parte dos ministérios.
O Partido Socialista também venceu em Maracaibo, uma cidade com importante fluxo petroleiro. A capital do estado de Zulia era governada pela oposição e agora terá Gian Carlo Di Martino do PSUV como prefeito.
Em discurso depois da divulgação dos resultados pelo CNE, Maduro dedicou a vitória ao ex-presidente Hugo Chávez, que completaria 71 anos nesta segunda-feira (28). Ele também lembrou da sua vitória para um terceiro mandato há exatamente um ano atrás e pediu que os prefeitos da oposição respeitem as comunas e a decisão dos circuitos comunais.
“Chávez está sempre vivo na nossa luta, na nossa memória, na nossa prática diária. Nós somos filhos e filhas do que plantou Chávez nos corações e mentes da população. Há um ano estávamos em uma eleição para derrotar o fascismo. Derrotamos. Agora dou as boas-vindas aos 50 prefeitos da oposição e peço trabalho, paz, democracia e coexistência nacional. Também peço que eles respeitem o poder comunal, os circuitos comunitários e as comunas”, disse.
Para Peña, a vitória do PSUV em três eleições seguidas – presidencial, regional e municipal – demonstra a força de organização e articulação do partido. Ele entende que um dos pontos fundamentais é a realização das consultas populares das comunas que, neste domingo, foram realizadas de maneira simultânea ao pleito municipal.
“Isso ratifica a maquinaria do chavismo nos eventos eleitorais. Já vimos isso nas eleições de governadores e deputados. O chavismo tem um ponto a seu favor que é a organização, que permite gerar essa força para poder acumular votos. Isso está relacionado ao exercício da política nos territórios. A consulta é uma espécie de revitalização dessa política nos territórios”, afirmou ao Brasil de Fato.
Os eleitores votaram para 5.338 projetos para as comunas de todo o país, que receberão US$ 10 mil (R$ 56 mil) para serem executados nos próximos meses. A mobilização das comunas deu resultado e o PSUV garantiu mais uma vitória expressiva.
Internamente, o chavismo encara essa vitória como uma das mais expressivas desde que o ex-presidente Hugo Chávez foi eleito em 1998. A expectativa é de que o PSUV consiga articular políticas integradas entre o Executivo nacional, estados e municípios.
Oposição tem respiro?
Dentro da oposição, o partido que mais ganhou espaço foi a Fuerza Vecinal. O grupo fundado em 2021 conseguiu eleger prefeitos para algumas das cidades mais ricas da região metropolitana de Caracas. Para o cientista político venezuelano Eder Peña, esse voto mostra o “interesse de classe”, mas que, ao mesmo tempo, demonstra que quando a oposição apresenta programa político, consegue disputar com o chavismo.
“Uma oposição que apresenta programa político e participa das eleições tem respiro. A Fuerza Vecinal tem uma estratégia clara de tentar se enraizar nos territórios onde eles têm força. Vão com toda a força que têm nos espaços onde eles sabem que podem ganhar. É uma estratégia licita. Se parece com o que o chavismo chama de ponto e círculo, de primeiro construir força para depois expandir”, disse.
Peña indica que dois fatores também foram determinantes: o boicote e o racha da oposição. A extrema direita liderada pela ex-deputada ultraliberal María Corina Machado usou a mesma estratégia da eleição regional e, mais uma vez, boicotou o pleito. Isso dividiu a direita, que tem setores que querem participar.
“A oposição que vai dividida não consegue medir força com o chavismo. Isso foi o que mostrou nos últimos anos, que além de ter estratégias violentas, não conseguiu chegar a consensos. Eles mantiveram força onde seus eleitores foram votar, municípios onde eles tradicionalmente mantêm o governo. Está demonstrado que não é uma tarefa difícil se organizar para ter vitórias eleitorais. Eles têm uma base eleitoral dura nesses setores da classe média e alguns setores populares que mobilizam”, afirmou.
Outro ponto levantado pelo analista é a falta de capacidade de arrecadar recursos por parte da oposição. Diferentemente do Brasil, o financiamento de campanhas eleitorais na Venezuela não é feita de maneira pública e os partidos dependem de doações. No caso da direita venezuelana, parte desses recursos vinham da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAid). No começo do ano, Trump congelou o financiamento da agência, o que, segundo Peña, prejudicou a oposição venezuelana.
“A campanha eleitoral da oposição que foi para as eleições não tinha recursos porque a oposição se move pelos interesses das elites financeiras e empresariais que colocam dinheiro. Isso é somado ao dinheiro de ONGs que mantêm a sua injeção de dinheiro a atores políticos. Todo esse montante de coisas foi anulado porque os EUA reduziram o dinheiro da USAid, o que se tornou uma dificuldade para a oposição”, concluiu.