Mesmo com uma queda de 18% no desmatamento registrado em 2024 em relação ao ano anterior, as ameaças aos povos indígenas isolados continuam graves. É o que aponta o relatório anual do Sistema de Alerta de Desmatamento em Terras Indígenas com Registros de Povos Isolados (Sirad-I), divulgado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e pelo Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi).
Segundo o antropólogo Tiago Moreira, pesquisador do ISA, o levantamento identificou 2 mil hectares desmatados em áreas com registros de povos isolados, apesar da intensificação de medidas de proteção. “A boa notícia é a queda no desmatamento, mas o que chama atenção, assusta um pouco, é a persistência do desmatamento nesses territórios”, afirma.
Entre os casos mais críticos, o relatório destaca as terras indígenas Zoró (RO/MT), Munduruku (PA), Piripkura (MT) e Jacareúba-Catau-Ixi (AM). Nesta última, Moreira alerta que o asfaltamento da BR-319 pode gerar “uma avalanche de desmatamento”, diante da ausência de um plano de proteção territorial. “As áreas onde existem desmatamento são ramais que vêm de entroncamentos da BR-319”, pontua.
Usado na pesquisa, o sistema Sirad-I utiliza imagens de satélite, incluindo radar, para monitorar em tempo quase real os territórios e emitir alertas periódicos. Ele funciona desde 2020 e teve neste ano seu menor índice de desmatamento. No entanto, indica a continuidade das invasões, do garimpo ilegal e do roubo de madeira.
Vontade política
A proteção dos povos isolados, explica o pesquisador, é assegurada principalmente por terras demarcadas ou por instrumentos de interdição de uso, uma medida emergencial que restringe a exploração de determinadas áreas até a conclusão do processo de demarcação. Ele avalia que “agora temos um governo que tem mais vontade política de proteger esses povos”.
Moreira lembra que desde 2023 houve avanços em políticas de proteção, com operações da Força Nacional de Segurança, ações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), por meio de suas bases de proteção etnoambientais.
Ele também cita os desdobramentos da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (DPF) 991, protocolada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir os direitos dos povos isolados.
A crise climática também acentuou os impactos nos territórios, indica o especialista. “As queimadas afetaram duramente as terras indígenas, principalmente na Amazônia. O que queimou ano passado foram áreas de floresta, o sub-bosque, que normalmente não queima”, diz. Segundo ele, as mudanças no clima local, como secas prolongadas e alterações no regime de chuvas, estão diretamente ligadas ao desmatamento no entorno desses territórios, tornando-os cada vez mais vulneráveis.
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