Mesmo depois de um mês do desabamento de uma pilha de lixo no aterro da empresa Ouro Verde, em Padre Bernardo (GO), a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) continua atuando para mitigar os efeitos colaterais do desmoronamento na vida da população local.
O colapso atingiu diretamente o córrego Santa Bárbara, afluente do rio do Sal, levando para a área uma quantidade de resíduos equivalente a 16 piscinas olímpicas. O abastecimento de água utilizado por agricultores da região ficou comprometido.
A operação de contenção dos danos iniciou no começo deste mês com a transposição do córrego. Cerca de 15 servidores da Semad, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e prefeitura de Padre Bernardo operaram no local, além de dez operadores da empresa responsável pelo aterro.
O trabalho incluiu a abertura de acessos para remoção dos 42 mil metros cúbicos de lixo que desabaram e a construção de barragem para evitar novo derramamento de resíduos.
De acordo com a prefeitura, a Semad segue com trabalhos de dedetização utilizando drones, visando controlar a proliferação de mosquitos e a proteção da saúde pública na área.
Além disso, foram realizadas reuniões com a população local para ouvir as demandas dos moradores para que participassem da tomada de decisões. Após o desabamento, os habitantes convocaram um ato pedindo o fechamento definitivo do lixão, que já incomodava com o cheiro antes mesmo do desastre.
“A Prefeitura de Padre Bernardo, o Governo do Estado, a Semad, o ICMBio seguem atentos, trabalhando com responsabilidade e ouvindo a população”, explicou o órgão em nota nas redes sociais.
Histórico de irregularidades
A empresa Ouro Verde Construções e Incorporações Ltda., fundada em 2010, acumula um histórico de irregularidades ambientais que se estende por quase uma década. Desde dezembro de 2016, quando recebeu a primeira multa por operar sem licença ambiental, o empreendimento tem funcionado com base em liminares judiciais.
Além disso, o lixão está localizado de maneira irregular dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Descoberto, em zona de conservação onde é proibida a instalação de aterros sanitários. Em 2022, a Semad indeferiu o pedido de regularização da empresa após o descumprimento de condições do Termo de Compromisso Ambiental firmado em 2019.
No início do mês de julho, a Semad multou a empresa depois do desabamento. O valor aplicado foi de R$ 37,5 milhões. A pasta informou que a Ouro Verde iniciou na segunda-feira (21) a retirada dos resíduos do aterro, sob fiscalização dos órgãos responsáveis. A ação faz parte do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado entre as partes.
O acompanhamento das ações será feito diariamente, com apoio do ICMBio e da Semad. Em nota, a Secretaria reforçou que a responsabilidade é da empresa e que todas as demandas devem ser direcionadas à ela.
Em nota, a empresa Ouro Verde disse que desde o início do deslizamento tem atuado com “seriedade e celeridade na execução das medidas necessárias para mitigar os efeitos”. Entre as ações implementadas a empresa aponta: a retirada técnica dos resíduos, iniciada no dia 21 de julho; aplicação regular de inseticidas biológicos, respeitando protocolos ambientais, para controle de vetores; monitoramento contínuo da qualidade da água e do solo, com base em parâmetros técnicos atualizados; cadastramento social das famílias da região, com medidas de apoio em andamento, conforme necessidades identificadas; atuação integrada com a Prefeitura de Padre Bernardo, Semad, Defesa Civil e demais órgãos públicos.
Situação no DF
O Instituto Filhas da Terra, coletivo do DF que se dedica a questões socioambientais com foco nas periferias, estabeleceu uma conexão entre o colapso em Padre Bernardo e a situação do aterro sanitário do Distrito Federal, localizado na DF 180. A organização divulgou posicionamento nas redes sociais e alertou sobre semelhanças.
“Esse colapso foi resultado de negligência, falta de fiscalização e de um modelo de gestão que ignora os limites da natureza. Mas o que isso tem a ver com a gente aqui no DF? Tudo”, pontuou a entidade.
A organização destacou que o aterro da DF 180 “recebe diariamente milhares de toneladas de resíduos, muitos deles mal separados, com baixa taxa de reciclagem e quase nenhum controle social efetivo”. O Instituto identificou sinais de saturação similares ao caso goiano. “Mau cheiro, chorume e contaminação em potencial do solo e das águas subterrâneas”.
O instituto também enfatizou a localização estratégica do aterro do DF, “bem próximo ao Rio Pior, um dos poucos cursos d’água que ainda resiste na região”. O rio, que atravessa as regiões administrativas de Ceilândia, Samambaia e áreas próximas, “já sofre com esgoto, lixo e ocupação irregular”.
No fim, a organização alerta. “O que aconteceu em Goiás não pode se repetir aqui. Não podemos aceitar que o Cerrado continue sendo aterrado embaixo de lixo”.