Oficializado pelo presidente Donald Trump na quarta-feira (30), o tarifaço dos EUA às exportações brasileiras deve afetar cerca de 36% de tudo que o país vende anualmente para a nação estadunidense. O percentual foi relevado nesta quinta-feira (31) pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que também é ministro dos Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O cálculo já leva em conta a lista 694 de exceções publicada pelo governo dos EUA à sobretaxação do comércio com o Brasil.
Foram excluídos do tarifaço produtos como aço, suco de laranja e aviões. Já a importação de café, carnes, frutas, calçados, roupas e móveis brasileiros por empresas americanas passará a ser taxada em 50% a partir do dia 6 de agosto.
A tarifação, na prática, encarece produtos brasileiros no mercado dos EUA. Isso tende a reduzir a demanda de consumidores por esses produtos, o que impacta na produção brasileira, na saúde financeira de empresas e nos empregos que elas geram aqui.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta quinta que há “casos dramáticos” de impactos do tarifaço no Brasil. Por isso, segundo ele, o governo segue tentando negociar com os EUA a reversão total da medida anunciada por Trump como uma retaliação ao Brasil por conta dos processos judiciais contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de tentar dar um golpe depois de perder a eleição.
“Há muita injustiça nas medidas anunciadas”, disse o ministro. “Há casos que são dramáticos, que deveriam ser considerados imediatamente.” Até agora, os EUA não deram indicação de que o tarifaço será revisto, mas o Tesouro americano procurou o Ministério da Fazenda brasileiro para uma reunião sobre o assunto, informou Haddad.
Medidas de contenção
Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento, disse que as exceções abertas por Trump na quarta já minimizaram de forma considerável os impactos do tarifaço no Brasil. No entanto, ele reforçou que os problemas existem, e vão precisar ser tratados por políticas do governo brasileiro.
“O café, que é um dos principais produtos da nossa pauta de exportação para os EUA, pode ser redirecionado para outros países. Mas é preciso abrir esses mercados”, disse.
O economista lembrou que, no dia em que Trump oficializou a tarifação do grão brasileira, a Embaixada da China no Brasil divulgou que, entre 2020 e 2024, as importações chinesas de café da China cresceram 65,7% por ano. O país asiático, que já é o maior parceiro comercial do Brasil, pode ser um dos novos destinos para o café brasileiro, na opinião de Cantelmo.
Segundo Cantelmo, considerando as vendas em dólar de produtos brasileiros, buscar mercados externos alternativos aos EUA seria positivo para a economia nacional.
Ele aventou ainda a possibilidade de compra de produtos agrícolas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), para garantir preços mínimos aos produtores, e oferececimento de linhas de crédito para setores afetados, para dar um fôlego às empresas.
Para Cantelmo, o mercado brasileiro também será essencial para conter danos às empresas nacionais afetadas por Trump. Segundo o economista, em alguns casos, a absorção da produção pelo próprio comércio brasileiro será simples.
“No caso da indústria de calçados e têxteis, a alocação internamente é possível, pensando que não estamos falando de um volume tão vasto assim”, afirmou. “Assim, a gente conseguiria contornar essa tarifação.”
O governo ainda não anunciou seu plano de auxílio aos setores prejudicados.
Mais afetados
José Luis Oreiro, economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), vê dificuldades maiores para os setores de carnes, pescados e frutas com o tarifaço.
No caso das carnes, Oreiro lembrou que elas são parte relevante da pauta de exportação do Brasil para os EUA. Ele ressaltou que os estadunidenses podem comprar carnes de outros mercados. Já redirecionar toda a carne brasileira para outros países não é tão simples assim. Questões sanitárias influenciam nisso.
Oreiro também prevê um “baque” para os produtores brasileiros de frutas do Vale do São Francisco. Frutas tropicais não são um tipo de produto essencial ou de difícil substituição pelo consumidor. Assim, seria difícil um estadunidense aceitar pagar mais caro por uma manga brasileira e manter seu consumo mesmo após o tarifaço.
O economista ressaltou que o Brasil tem instrumentos para ajudar produtores no momento mais crítico. Já fez isso durante a pandemia com o setor de eventos, por exemplo. “O governo pagou parte dos salários dos empregados para eles continuarem trabalhando.”
A Associação Brasileira das Indústrias de Pescado (Abipesca) já solicitou ao governo a criação de uma linha emergencial de crédito voltada às indústrias exportadoras de pescado por conta do tarifaço. Os EUA compram cerca de 70% do pescado exportado pelo Brasil.
A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) disse que o tarifaço vai elevar a tributação da exportação de carne brasileira para os EUA para 76%, o que inviabilizaria negócios com o país. A entidade defende que o governo siga negociando com os EUA a reversão da taxação dos produtos nacionais.
A Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) também quer negociação. Segundo a associação, em 2024, o valor exportado de frutas brasileiras para os EUA foi de US$ 148,3 milhões.