O chefe do Comando Sul dos Estados Unidos, almirante Alvin Holsey, concluiu uma visita oficial ao Panamá para supervisionar os exercícios militares conjuntos entre forças especiais panamenhas e estadunidenses, com o suposto objetivo de “reforçar a segurança e a defesa do Canal”.
Segundo comunicado da Embaixada dos EUA no Panamá, Holsey afirmou que o treinamento reflete a “solidez” da cooperação em segurança entre os países.
“Treinar lado a lado com nossos parceiros panamenhos em um dos ambientes mais desafiadores do mundo gera confiança, melhora nossa interoperabilidade e nos prepara para enfrentar os desafios de segurança que compartilhamos em toda a região”, declarou no comunicado.
A estadia de Holsey no Panamá — no último domingo e segunda-feira — ocorreu em um contexto de fortes tensões regionais, após o recente deslocamento militar realizado por Washington no mar do Caribe, com três navios, o porta-aviões Gerald Ford e mais de 4 mil soldados perto das costas da Venezuela.
As manobras conjuntas no Panamá são apresentadas pelos EUA como exercícios de preparação diante de “ameaças comuns”. A agenda de Holsey incluiu uma visita à Base Cristóbal Colón do Serviço Nacional Aeronaval (Senan) e reuniões com altos funcionários de segurança panamenhos.
Por sua vez, o embaixador estadunidense Kevin Marino Cabrera declarou que essas manobras buscam “preparar a resposta a desafios compartilhados”, reafirmando o compromisso de Washington com a “estabilidade regional”.
A presença do Comando Sul no país provocou uma onda de indignação popular e diversos atos de repúdio, segundo Jorge Guzmán, advogado e coordenador nacional da Frente Nacional pela Defesa dos Direitos Econômicos e Sociais (Frenadeso), em entrevista ao Brasil de Fato.
“Reiteramos que a América Latina e o Caribe devem ser, definitivamente, uma região de paz”, destacou, classificando a presença do Comando Sul no Panamá como uma “afronta à história de luta pela soberania, pela autodeterminação nacional e pelo valor da pátria”.
Repressão contínua
O deslocamento militar conjunto acontece depois que o governo de José Raúl Mulino assinou um memorando com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, no início de abril, autorizando o envio de tropas e a ampliação da presença militar estadunidense em território panamenho. A decisão foi tomada sem debate parlamentar nem consulta pública, o que desencadeou protestos sem precedentes no país.
Desde então, sindicatos, movimentos populares e partidos políticos têm impulsionado greves gerais e mobilizações contra a presença militar estrangeira. A resposta do governo tem sido um amplo aparato repressivo, que organizações sociais denunciam como violações de direitos humanos, principalmente na província de Bocas del Toro, atualmente militarizada.
“Temos companheiros injustamente presos em penitenciárias de segurança máxima, contra os quais foram abertos processos judiciais cheios de irregularidades. Sofremos uma forte perseguição contra as lideranças dos povos originários, que estão sendo duramente reprimidos. Inclusive investigamos vários casos de desaparecimentos forçados de companheiros das comunidades indígenas. Enquanto isso, parte da nossa direção social e sindical foi obrigada a se exilar do país”, relatou Guzmán.
Diante dos protestos, o governo Mulino tem adotado uma postura cada vez mais autoritária, aprofundando a confrontação com a população e mergulhando o país em uma espiral repressiva.
Apesar da violência estatal, as manifestações não cessaram e o Panamá atravessa um dos ciclos de lutas populares mais intensos de sua história recente.
Segundo uma pesquisa da Prodigious Consulting e do jornal La Estrella de Panamá, realizada em julho, quase três em cada quatro panamenhos desaprovam a gestão de Mulino. Apenas 2,7% consideram que seu governo é “bom” ou “muito bom”. A queda de aprovação tem sido abrupta: em janeiro, mais da metade da população acreditava que o país “ia pelo bom caminho”.
Guzmán sustenta que o colapso da imagem do governo se deve ao fato de que, para setores cada vez mais amplos da sociedade, “Mulino é um agente do governo de Trump”.
“É um representante dos interesses da ultradireita, na qual se encontram figuras como Bukele, em El Salvador, Milei, na Argentina, e Noboa, no Equador”, afirmou.
Desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca, os Estados Unidos têm pressionado o Panamá a alinhar-se estritamente com seus interesses, inclusive em questões que afetam diretamente a economia nacional. Em fevereiro, o presidente panamenho anunciou a retirada do país da Iniciativa do Cinturão e Rota da China, sem que essa decisão fosse compensada com novos investimentos que beneficiassem o Panamá.
No decorrer de 2025, esta foi a terceira visita de Holsey ao Panamá. De acordo com a Embaixada dos EUA, essas viagens buscam fortalecer a relação bilateral. O ministro da Segurança, Frank Ábrego, adiantou que nos próximos meses o país receberá um contingente maior de tropas estadunidenses, incluindo fuzileiros navais e aeronaves.