O Hospital Regional de Samambaia (HRSam) está na mira do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Na sexta-feira (29), o órgão abriu um procedimento criminal (ICP) para apurar a recusa do hospital no atendimento a gestantes, além de, pelo menos, três óbitos de bebês, entre os dias 31 de julho e 3 de agosto de 2025, supostamente relacionados à negativa de assistência.
Segundo relatos, as gestantes estavam classificadas como prioridade amarela ou verde, mas teriam sido orientadas a buscar atendimento em outras unidades de saúde, restringindo a assistência apenas aos casos classificados como vermelhos.
De acordo com a 1ª Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-Vida), a unidade de saúde teria descumprido a Portaria SES nº 269/2024, classificada como uma ação gravíssima, já que a norma determina a obrigatoriedade do acolhimento, da classificação de risco e do atendimento de todas as gestantes no primeiro serviço de emergência gineco-obstétrica.
“É gravíssima, porém, a acusação de descumprimento da Portaria SES nº 269/2024, principalmente quando esse descumprimento é associado à morte dos bebês”, destacou a promotora de Justiça Alessandra Morato. A investigação será delimitada ao período e às condutas descritas na portaria.
A apuração do MPDFT inclui a coleta de depoimentos, análise de prontuários e identificação dos responsáveis no plantão de 17 de julho a 3 de agosto.
Núcleo Pró-Vida
O HRSam é acompanhado desde 2019 pelo Pró-Vida – Núcleo de Enfrentamento à Violência e Promoção da Saúde da Pessoa Vulnerável do MPDFT, quando a direção hospitalar elaborou um plano para garantir melhorias na assistência. Desde então, o núcleo monitora os serviços de ginecologia e obstetrícia, conforme explica a promotora de Justiça Alessandra Morato.
O Núcleo foi criado para atuar na prevenção, acompanhamento e responsabilização de casos de violência ou violação de direitos que afetem pessoas em situação de vulnerabilidade, como crianças, adolescentes, mulheres, idosos e pessoas com deficiência.
Entre as diligências determinadas pelo Pró-Vida estão a identificação de gestores, médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e vigilantes plantonistas no período de 17 de julho a 3 de agosto de 2025, a realização de oitivas, a obtenção de autorização dos familiares para acesso a prontuários e a perícia indireta desses documentos médicos por especialistas do MPDFT. O prazo inicial para conclusão da investigação é de 90 dias.
Segundo Morato, entre 2022 e 2023 houve uma redução de denúncias contra o hospital. “Nos anos de 2022 e 2023 houve uma redução do número de denúncias contra o hospital em nossa promotoria. Essa redução veio acompanhada de informações sobre o aumento do número de enfermeiros obstetras nos serviços, bem como do engajamento da equipe hospitalar no mapeamento das intercorrências e correções de fluxos de atendimento”, explicou a promotora.
Ainda assim, em 2025, houve um aumento nos pedidos de investigação relacionados ao hospital, mas, segundo Alessandra, “ainda não se tem dados para identificar onde está a falha”.
Em resposta aos questionamentos sobre os casos envolvendo o Hospital Regional de Samambaia e o cumprimento da Portaria SES nº 269/2024, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) afirmou que atua de maneira transparente junto aos órgãos de controle e que, sempre que questionada, responde dentro dos prazos solicitados, mantendo-se à disposição para prestar os esclarecimentos necessários.
Casos de mortes de bebês em 2024

Em 2024, o Distrito Federal também registrou casos graves de mortes de bebês e crianças em hospitais públicos associados a denúncias de suposta negligência médica. Em abril, a menina Anna Júlia Galvão, de 8 anos, faleceu após uma série de falhas em UBSs e na UPA de Ceilândia, antes de ser encaminhada ao Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib). Houve demora na transferência e diagnóstico equivocado, fato investigado pela Polícia Civil.
No mesmo período, a UPA do Recanto das Emas foi palco de duas mortes que geraram forte comoção: a de Jasminy Cristina de Paula Santos, de apenas 1 mês, e a de Enzo Gabriel, de 1 ano. Em ambos os casos, familiares relataram demora no atendimento e falhas em exames e na regulação de leitos, com investigações em andamento na 27ª DP.
Já em dezembro de 2024, uma recém-nascida com cardiopatia grave morreu sem ter realizado a cirurgia cardíaca determinada pela Justiça, caso que resultou na condenação do Governo do DF, em julho de 2025, ao pagamento de indenização de R$ 40 mil à família pela falha na prestação do serviço público.