Na esteira da boa fase em que vive a presidente do México, Cláudia Sheinbaum, que ostenta aprovação de 80%, o partido Morena tem apostado no fortalecimento da participação popular no governo. Logo após a vitória histórica da primeira mulher eleita para comandar o país, com 32 pontos de vantagem, a legenda iniciou uma campanha com meta inicial de 10 milhões de filiadas e filiados em um ano. No entanto, apenas seis meses depois, já haviam se registrado 8 milhões.
A partir desse resultado, o Morena iniciou uma segunda fase, focada em fortalecer as bases populares e a organização territorial. Esta etapa não busca apenas aumentar o número de filiações, mas também “gerar espaços reais” para que a militância possa se organizar e participar ativamente da tomada de decisões.
O desafio é enorme, já que o México conta com mais de 71 mil seções eleitorais em todo o seu território, delimitações geográficas muito pequenas, que podem abranger apenas algumas ruas, onde são instaladas as seções de votação nos dias de eleição.
O objetivo do Morena é construir um Comitê Seccional em cada uma dessas seções. Cada um desses espaços deve ser formado por pelo menos cinco pessoas, eleitas em assembleias comunitárias.
Desde meados de agosto, todos os domingos, o Morena tem convocado assembleias territoriais para impulsionar a formação dos comitês. Apenas nas últimas três semanas, foram realizadas mais de 16 mil assembleias em todo o país. Nessas ocasiões, integrantes do partido criam espaços de escuta para ouvir as demandas da população.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Alexandra Huerta Rojo, vereadora do Morena, explica que a finalidade desses comitês é garantir que quem deseje ser protagonista da Quarta Transformação encontre um meio de participação a partir da realidade cotidiana de cada setor.
Eleita vereadora de Tláhuac, uma zona periférica da Cidade do México, aos 24 anos, Alexandra é a mais jovem política do Morena. Atualmente, acompanha a formação de assembleias em seu distrito e, a partir de sua experiência, ilustra a importância do trabalho territorial que está sendo realizado.
“Muitas vezes, os partidos não chegam às periferias. Esta é uma nova e melhor maneira de se organizar, porque a ideia é que todos sejam participantes e ouvidos”, afirma.
Construção de baixo para cima e poder territorial
A vereadora Alexandra Huerta Rojo defende que a presença local é que estabelece o contato com o povo e, por isso, as organizações precisam estar inseridas no território. “Somos um governo humanista, no qual o povo é o principal ator do movimento. O objetivo dos comitês é que quem queira ser protagonista da Quarta Transformação, encontre um meio de participar a partir da realidade cotidiana de cada setor”, afirma.
Ela enfatiza que o propósito é “construir com os de baixo para chegar ao topo” e se emociona ao destacar que nos territórios “participam jovens, mulheres e diversos grupos em situação de vulnerabilidade”.
“Não se trata apenas de ganhar eleições”, repete Alexandra, “mas de fazer com que o povo deixe de ser espectador e se torne ator e agente da mudança”.
Na mesma linha, Camila Martínez, secretária nacional de Comunicação, Difusão e Propaganda do Morena, explica ao Brasil de Fato que a finalidade dessas estruturas é fortalecer a organização a partir das bases, garantindo que “em cada comunidade exista um grupo de militantes ativo”. Esses espaços têm a missão de avaliar e propor estratégias que contribuam para resolver os problemas cotidianos da população, além de valorizar o trabalho das prefeituras.
“Queremos que nosso partido seja construído de baixo para cima, com raízes territoriais sólidas, onde todos saibam que há companheiros do movimento trabalhando perto de suas casas, a quem podem recorrer para debater, propor e, claro, também criticar. Queremos um partido que não esteja apenas nos ministérios, mas também junto às pessoas comuns, na construção do país com que sonhamos”, enfatiza.
Poder popular e controle cidadão
Além do desdobramento territorial, essas estruturas têm uma missão igualmente importante — ou até mais: o controle popular sobre os funcionários públicos do partido. As assembleias buscam realizar encontros nos municípios, onde a militância de base possa avaliar o trabalho dos representantes e constituir um espaço no qual estes devem prestar contas diretamente à comunidade.
“Decidimos, no Morena, constituir um partido-movimento de massas, aberto a todas as pessoas que queiram participar do desenvolvimento de sua comunidade. Trata-se de cuidar e impulsionar a formação constante das companheiras e companheiros nos territórios. Queremos construir um partido político que não seja instrumento de uma classe política que responde às pessoas, mas uma força na qual o próprio povo responda a si mesmo, à sua comunidade e ao partido.”
As referências ao ex-presidente Andrés Manuel López Obrador aparecem de maneira recorrente no discurso de Martínez. Enunciados estratégicos, reflexões e máximas éticas que AMLO repetia insistentemente se tornaram uma bússola para milhares de militantes no México.
“Só o povo pode organizar o povo, e só o povo organizado pode salvar a nação” parece ser uma das máximas que orientam a construção de formas de intervenção política nas quais as pessoas comuns são protagonistas.
“Era uma frase do presidente López Obrador que justamente falava sobre isso. Há alguns dias, conversávamos com um companheiro e lembrávamos de uma ideia que ele sempre repetia: que os militantes precisavam ser povo, fazer povo e estar com o povo. Não basta que um político venha de um território; é necessário construir espaços para que mais pessoas possam participar da política. Esse é o papel da militância: não apenas representar, mas também abrir portas”, afirma.
As reformas impulsionadas pela Quarta Transformação não poderiam ser implementadas sem apoio popular. “Sabemos, por experiência própria, que as campanhas midiáticas da direita podem ser muito poderosas. Como enfrentamos isso? Com organização popular e um verdadeiro trabalho territorial”, pondera Martínez. A aposta, garante, não é apenas manter o contato com as bases, mas aprofundá-lo.
Sheinbaum comemora ‘momento estelar’ do governo
Na última segunda-feira (1º), a presidente do México, Claudia Sheinbaum, realizou seu primeiro Informe de Governo no Palácio Nacional, que é uma espécie de prestação de contas anual da gestão. A mandatária, que assumiu o cargo em 1º de outubro de 2024, destacou seu compromisso com a chamada Quarta Transformação, termo usado pelo presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador (AMLO) para definir as mudanças políticas, sociais e econômicas de seu governo.
Em um discurso de pouco mais de uma hora, Sheinbaum falou dos avanços promovidos pela sua gestão, afirmando que o país vive um “momento estelar” de sua história.
Cláudia Sheinbaum chega a este primeiro informe com 80% de aprovação entre os mexicanos. Sua firmeza na defesa da autonomia nacional frente aos Estados Unidos, assim como a ampla implementação de programas de bem-estar para a população, têm sido algumas das chaves de seu sucesso.
Somente em 2025, seu governo destinou 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) a programas de bem-estar entregues diretamente à população. Essas políticas, implementadas desde a presidência de Andrés Manuel López Obrador, permitiram que o México atingisse o menor nível de pobreza dos últimos 40 anos e reduziram significativamente a desigualdade, tornando o país o segundo com menor desigualdade do continente, atrás apenas do Canadá.
Além desses avanços, os últimos onze meses também representaram grandes transformações a partir do legado de seu antecessor, mas, agora, Sheibaum e seu partido, explicitamente, se propõem a avançar para uma nova etapa.