A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou nesta quinta-feira (11) o julgamento da tentativa de golpe de Estado. Por maioria de 4 votos a 1, os ministros condenaram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a mais de 27 anos de prisão pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado.
Além dele, outros sete réus ligados ao núcleo político e militar também foram condenados, incluindo o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que recebeu a menor pena em comparação aos demais réus. O único voto divergente foi do ministro Luiz Fux, que defendeu a absolvição de Bolsonaro e de parte dos acusados.
A decisão abre caminho para a execução da pena, com impactos tanto no campo jurídico quanto no político. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, a advogada Juliana Paula Magalhães, doutora em direito pela Universidade de São Paulo (USP), respondeu às principais dúvidas sobre os próximos passos.
Bolsonaro vai preso de imediato?
Segundo Juliana Paula Magalhães, Bolsonaro deve continuar em prisão preventiva domiciliar até a conclusão do processo no STF. “Provavelmente, o ex-presidente Bolsonaro vai continuar em prisão preventiva. Após o trânsito em julgado do acórdão que efetivamente vai iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade”, afirma.
O “trânsito em julgado” acontece quando não existe mais nenhum recurso pendente. Só depois disso começa o cumprimento da pena definitiva, sob responsabilidade da Vara de Execuções Penais.
Ele poderá cumprir pena em casa ou terá que ir para presídio?
Magalhães explica que a definição será judicial. “Onde vai ser, se vai ser domiciliar ou na Papuda, isso vai depender das deliberações judiciais”.
Réus com mais de 70 anos, como é o caso de Bolsonaro, ou com problemas de saúde podem ter prisão domiciliar autorizada. Caso contrário, a tendência é que o cumprimento comece em regime fechado.
Quais recursos ainda cabem?
De acordo com a advogada, as possibilidades são limitadas. O único instrumento cabível, segundo ela, é o embargo de declaração. Esse tipo de recurso é usado quando a defesa entende que a decisão tem contradições, omissões ou pontos obscuros. Na prática, serve apenas para pedir esclarecimentos ao tribunal; não reabre o julgamento nem permite uma nova análise das provas.
Para Magalhães, no entanto, mesmo que sejam apresentados, esses embargos dificilmente terão impacto no resultado. “O recurso cabível será o de embargos de declaração. E, na realidade, isso, muito provavelmente, não vai ter o condão de alterar nada. Os infringentes não seriam cabíveis. Se forem ajuizados, vão ser rejeitados. Então não vai haver uma possibilidade recursal efetiva”, avalia.
Enquanto esses recursos são analisados, a condenação ainda não transita em julgado. Isso atrasa o início da execução definitiva da pena, mas os réus continuam presos de forma preventiva.
Bolsonaro terá que cumprir os 27 anos na íntegra?
Pela Lei de Execuções Penais, raramente a pena total é cumprida em regime fechado. O sistema prevê a progressão de regime: o réu pode passar para o semiaberto ou aberto depois de cumprir parte da pena, desde que apresente um bom comportamento. Além disso, há mecanismos de redução, como o desconto de dias por estudo ou trabalho na prisão. Ou seja, na prática, o tempo efetivo de prisão pode ser menor que os 27 anos fixados na condenação.
Por que Mauro Cid recebeu uma pena menor?
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, chamou atenção por ter sido condenado a um tempo muito menor que Bolsonaro e Braga Netto. Enquanto o ex-presidente recebeu 27 anos e 3 meses de prisão em regime fechado, e o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto foi condenado a 26 anos também em regime inicial fechado, Cid foi sentenciado a 2 anos em regime aberto.
A diferença das penas, explica a advogada, se deve ao acordo de colaboração premiada. “O acordo que é feito com o próprio Estado faz com que Mauro Cid faça jus à possibilidade dessa redução de pena. A dosimetria reduzida para o réu colaborador é perfeitamente adequada aos marcos legais”, indica.
O voto de Fux pode favorecer Bolsonaro?
Juliana Magalhães avalia que não. Para ela, o voto do ministro Luiz Fux, que defendeu a absolvição de Bolsonaro em todos os crimes e ficou como único divergente da maioria, foi isolado e cheio de inconsistências.
“Tem um determinado momento do voto que ele diz o seguinte: ‘Como que Bolsonaro iria dar um golpe se ele era presidente? Então ele não poderia dar golpe’. Mas no 8 de janeiro ele não era mais presidente. Há uma série de incongruências no texto”, exemplifica.
Ela destaca que os demais ministros do STF, como Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Alexandre de Moraes, rebateram publicamente essas falhas no dia seguinte.
Bolsonaro poderá disputar eleições no futuro?
A condenação criminal impede o ex-presidente de se candidatar. “Bolsonaro fica numa situação muito mais difícil porque antes ele era só inelegível no âmbito eleitoral, mas agora ele realmente não vai poder se candidatar justamente pela condenação criminal com uma pena alta”, explica a especialista.
Antes, Bolsonaro já havia sido declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com base na Lei da Ficha Limpa, que impede por oito anos a candidatura de políticos condenados por um órgão colegiado. Agora, com a condenação criminal no STF, ele perde os direitos políticos e não pode participar de eleições enquanto durar a pena.
Expectativas daqui para frente
- Curto prazo: Bolsonaro segue em prisão preventiva domiciliar até publicação do acórdão e análise dos embargos.
- Médio prazo: Início do cumprimento da pena definitiva, em regime a ser definido pela Justiça.
- Longo prazo: Possibilidade de progressão de regime após parte da pena cumprida, mas sem reversão da inelegibilidade.
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