Quatro anos depois, a Araucária Nitrogenados SA (ANSA), parte do sistema Petrobrás, segue com a estrutura abandonada, recordando os operários que visitam a planta, na expectativa de reabri-la, sobre o vazio do desemprego.
Ademir Jacinto, conhecido na categoria como Mãozinha, conhece toda a história dos trabalhadores do Sindiquímica-PR, da luta pela reestatização da empresa, em 2013, até a batalha contra o seu fechamento, em 2020. Hoje, ele é um dos representantes da Federação Única dos Petroleiros (FUP) no Conselho Nacional de Fertilizantes (Confert) e também participa do Grupo de Trabalho criado pela Petrobrás para discutir a reabertura da unidade de produção de fertilizantes, sinalizada desde o início do governo Lula.
O operário da fábrica Araucária Nitrogenados SA (ANSA), antes conhecida como Fafen Fertilizantes, é um dos cerca de mil operários, 400 deles efetivos da antiga empresa. Em 2020, os trabalhadores tiveram grande decepção com o fechamento da unidade e da produção nacional de fertilizantes, no segundo ano do governo Bolsonaro.
Agora, ele e outros dirigentes petroquímicos e petroleiros denunciam que há resistências de chefias bolsonaristas, as mesmas que conspiraram para o fechamento da unidade de produção de ureia nitrogenada, para que a estrutura continue no chamado processo de hibernação. Trata-se da maior fábrica mundial na capacidade de produção de Arla 32 (número referente à porcentagem de ureia presente na solução em água desmineralizada, 32,5%).
A reportagem do Brasil de Fato teve acesso ao interior da planta da empresa. O cenário é desolador, a visão de uma grande estrutura produtiva abandonada. Poderia parecer um cenário de locação para um seriado. Mas não se trata disso. Trata-se de uma política industrial e de desenvolvimento de ciência e tecnologia deixadas de lado pelos governos Temer e Bolsonaro, que buscaram beneficiar as transnacionais importadoras do segmento.
Em 2020, no auge da pandemia, das mortes e da ausência de cilindros de oxigênio em Manaus, houve denúncia de que a estrutura da ANSA teria capacidade de produzir cilindros de oxigênio, na medida em que já efetua o processo de separação entre nitrogênio e oxigênio ao longo de sua produção. A fábrica de fertilizantes possui a capacidade de produção de 30 mil m³ de oxigênio por hora.
A informação atual é de que antigos gestores da Araucária Nitrogenados, apesar de terem executado todo o processo de fechamento da fábrica e demissão dos trabalhadores, estão ocupando posições de relevância na Diretoria Executiva de Processos Industriais e Produtos. “O mesmo gerente que perseguiu e demitiu os trabalhadores e serviu de correia de transmissão da gestão bolsonarista continua nos prejudicando, boicotando a reabertura da fábrica”, revela.
“Se dependesse da maioria dos petroleiros que estão em cargo de gestão, a Petrobrás seria apenas pré-sal”, comenta outro dirigente petroquímico, que preferiu não se identificar.
Outra fonte do Brasil de Fato conhece o processo de transição e também denuncia a dificuldade e os entraves no processo de reativação da fábrica. No entanto, aponta que será necessário efetivo mapeamento das condições de planta e da demanda por força de trabalho, além de pressão da sociedade civil, organizações populares e mandatos.
Em meio ao impasse, a FUP e o Sindiquímica PR participam no dia 5 de fevereiro de audiência de conciliação com representantes da Petrobrás no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Antes disso, uma reunião entre trabalhadores e empresa acontecerá no dia 24 de janeiro.
Mãozinha enxerga essas datas como decisivas, uma espécie de vai ou racha: “Há resistência grande no interior da Petrobras, eles não querem que aconteça. São os caras que ajudaram a fechar e não querem abrir. Com isso, não temos calendário, cronograma, não temos nada”, denuncia.
Um giro por uma fábrica fantasma
A reportagem do Brasil de Fato conseguiu ter acesso ao interior da unidade de produção, fechada a quatro anos, hoje com apenas uma pequena equipe para manutenção. Como se vê na sequência de fotos abaixo, trata-se de Capital Constante, nos termos da economia política, que não está sendo aproveitado.
Parte da fábrica paralisada que, na pandemia, poderia ter sido responsável pela separação de oxigênio e produção de cilindros de oxigênio / Pedro Carrano
Perda de telhas em barracão de armazenamento / Pedro Carrano
Maquinário com condições passou o período de pandemia na chamada "hibernação" durante todo governo Bolsonaro / Pedro Carrano
Plano industrial do governo Lula
O programa “Nova Indústria Brasil” , lançado pelo governo federal, faz o seguinte apontamento sobre a retomada da produção de NPK, sinalizando intenção de reduzir a dependência do ramo: “Geração de produtos inovadores e tecnologias para a redução da dependência brasileira de fertilizantes e defensivos, incluindo NPK, bioinsumos, remineralizadores, macro e micronutrientes e outros insumos para nutrição e defesa de plantas e seus ensaios agronômicos;”
Trabalhadores qualificados e com acúmulo
A FUP e o Sindiquímica PR apresentaram à Diretoria Executiva de Processos Industriais e Produtos um parecer jurídico orientando que a retomada da fábrica seja realizada pelos trabalhadores que têm larga experiência e conhecimento da planta, recomendando, por motivos de segurança, a recontratação dos empregados que foram demitidos em 2020. Alguns faleceram, outros se aposentaram, outros ainda conseguiram novo emprego. A identidade entre a planta e o antigo Sindiquímica-PR era tanta que fontes do Brasil de Fato apontam que dezenas de operários qualificados querem retomar os seus postos.
Depósito de ureia vazio / Pedro Carrano
