Uma audiência pública realizada na noite da última segunda-feira (7) na Câmara Municipal de Curitiba reuniu movimentos populares, moradores de comunidades e representantes do poder público para debater o direito à cidade e a regularização fundiária na capital paranaense.
O evento foi convocado pelas vereadoras Laís Leão (PDT), Vanda de Assis (PT) e Indiara Barbosa (Novo) e lotou o auditório da Casa. Estiveram presentes lideranças da União por Moradia Popular (UMP), do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos (MTD) e da Frente de Organização dos Trabalhadores (Fort), além de moradores da Comunidade Nova Esperança, Comunidade Britanite, Vila Sabará, Comunidade Paraíso Tarumã, Vila União e Vila Pontarola.
Também participaram representantes da Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab), do Ministério Público do Paraná, da Defensoria Pública e da Associação dos Registradores de Imóveis.
Durante as quase três horas de debate, diversos moradores relataram a rotina de incertezas enfrentada por quem vive em áreas irregulares. A maioria das falas cobrou atuação mais efetiva da Cohab. A nova gestão da companhia, agora sob comando do presidente André Baú, foi apontada como sinal de mudança.
“Não havia a possibilidade de reviravolta diante da Cohab. Então, pra gente, a Cohab estava caindo no esquecimento. Quando a Cohab era mencionada na comunidade ou para qualquer pessoa, ninguém mais acreditava. A Cohab estava passando batido, despercebida”, relatou uma participante da audiência.
Baú reconheceu que atualmente não há política efetiva de regularização fundiária em Curitiba, mas afirmou estar comprometido com a construção de um novo modelo. Segundo ele, “entraves burocráticos dificultam muito as regularizações, mas elas vão, sim, acontecer”. O presidente disse ainda que está “obstinado com a missão” de garantir moradia digna para todos e se declarou aberto ao diálogo.
Para Agnaldo Luís Junior, representante da UMP, a regularização fundiária vai muito além da documentação da casa, ela representa o acesso pleno à cidade.
“Se você perguntar nessas comunidades, para essas famílias, qual é o principal anseio delas, na maioria das vezes as respostas estarão relacionadas ao acesso simplificado à água e à luz. Elas nem imaginam a possibilidade de obtenção do título, da documentação. Elas só imaginam que a regulamentação fundiária garantirá que elas passem o ano todo ali, garantindo que suas famílias tenham um banho ou um banho quente. Porque esse é o ponto que a gente está hoje. São comunidades que, em pleno 2025, não têm acesso aos equipamentos básicos de saúde, básicos de vivência.”
Moradia digna é direito básico
A audiência reforçou que o despejo forçado é uma das maiores violações de direitos humanos, e que a regularização fundiária é um passo fundamental para garantir dignidade. Também foi questionada a política habitacional da capital, considerada insuficiente e injusta, já que muitos imóveis da cidade não cumprem sua função social.
Lideranças comunitárias também defenderam a autogestão como alternativa para a política habitacional. Um dos relatos destacou os benefícios dessa modalidade em comparação ao modelo tradicional conduzido por construtoras.
A vereadora Vanda de Assis destacou, “O processo de construção por meio da autogestão vai além da entrega de uma casa com um valor menor daquelas entregues por construtoras. A autogestão proporciona casas melhores construídas em menos tempo, e possibilita o pertencimento dos moradores, que acompanham o processo de construção do início ao fim. Pensem no que isso representa. É totalmente diferente do que ocorreu nas últimas comunidades que nós acompanhamos no processo de realocação, como ocorreu lá no Tatuquara com a Comunidade Monteiro Lobato, que foi retirada do Boqueirão e foi, infeliz, transferida para uma área em que passaram a conviver com o mau cheiro da estação de tratamento da Sanepar.”
Informações sobre a Regularização Fundiária Urbana (Lei 13.465/17) também foram apresentadas. Segundo dados citados, Curitiba possuía, em 2019, mais de 660 áreas em situação irregular.
Além do diálogo
A vereadora Laís Leão afirmou que há vontade política para resolver os impasses. “A regularização fundiária é um caminho muito produtivo. A gente já tem uma legislação boa, a gente só precisa conseguir aplicar e tirar alguns entraves”, declarou.
Durante a audiência, a vereadora Vanda de Assis sugeriu a criação de uma comissão permanente de contato entre moradores da Vila Sabará, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), e a Cohab, para mediar conflitos fundiários que se arrastam há décadas na Justiça.
As parlamentares também destacaram a importância de um mapeamento detalhado das comunidades, com o objetivo de facilitar o planejamento de soluções. Elas alertaram ainda sobre a revisão do Plano Diretor de Curitiba, momento decisivo para o avanço da pauta da habitação, e se colocaram à disposição para trabalhar por mudanças legislativas que destravem os processos de regularização.