Na última terça-feira (15), a Ladeira dos Tabajaras, favela que faz divisa entre os bairros de Botafogo e Copacabana, na capital fluminense, amanheceu com uma operação policial conjunta da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) e a Coordenadoria de Recursos Especiais, ambas forças da Polícia Civil do Rio de Janeiro (CORE).
A operação, que foi amplamente divulgada em programas sensacionalistas da TV aberta, teve como justificativa o cumprimento de dois mandados de prisão contra suspeitos de envolvimento no assassinato do agente da CORE, João Pedro Marquini.
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O ato de executar uma operação policial em resposta à morte de um policial em si já é considerado alarmante. Em primeiro lugar, pelo número de operações vingança que já são respostas históricas e altamente letais das forças policiais. Em segundo, no que tange ao caráter científico e de investigação que a Polícia Civil deveria executar; para além disso, o uso de helicóptero como base de tiro, a execução da operação em horário escolar e cinco mortes – já configurando mais uma chacina para o Estado do Rio de Janeiro – em decorrência da operação.
As grandes chacinas ocorridas nos últimos anos no Rio de Janeiro foram executadas e/ou tiveram envolvimento direto da Polícia Civil. Há uma narrativa crítica que poderíamos aplicar aqui relacionada à função da PCERJ, mas é importante salientar o alto investimento orçamentário que o Estado tem feito para operações policiais acontecerem.
A mensagem tácita do orçamento das polícias indica que a prioridade dessas instituições está para a realização de operações policiais cada vez mais letais, com grande investimento em confrontos e aquisição de material bélico.
A operação da Polícia Civil no Tabajaras ocorreu a exatos 13 dias depois da decisão do STF sobre a ADPF das Favelas. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) é muito importante nessa situação, pois mesmo que ainda não tenha sido publicada, é uma carta de liberação para as polícias matarem nas favelas. Todos os tópicos de controle na decisão versam sobre o caráter posterior às violações, sem prerrogativas preventivas à letalidade policial, além de autorizar o uso de plataformas aéreas como base de tiro, o uso de escolas e unidades de saúde como base operacional além de não orientar sobre uma perícia autônoma – ou seja, além da polícia que executa ser a mesma que investiga, entregam um valor irrisório para a polícia técnico científica realizar perícias.
Não se trata de uma coincidência, uma excepcionalidade ou um erro operacional, a operação na Ladeira dos Tabajaras está instaurada em uma prática institucional com credencial e autorização da suprema corte deste país, com alto investimento financeiro do Estado para ser executada e nenhuma vergonha de matar – desde a fundação deste país.
O que nos resta, mais uma vez, é a descrença no poder judiciário, que ressoa em nossos ouvidos com a afirmação de que “não há um Estado de Coisas Inconstitucionais na política de Segurança Pública do Rio de Janeiro”. Isso na verdade nos faz compreender que a Política de Segurança Pública está sendo muito bem executada, com terror de Estado em comunidades pretas e favelas. O pior é, para além disso tudo, pelo fato dos mortos serem suspeitos e/ou envolvidos com o tráfico de drogas, ninguém está falando que o que aconteceu foi uma chacina.
* Patrick Melo é gerente de projetos da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR).
**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.