O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a União desaproprie imóveis rurais com ocorrência de desmatamento ilegal e incêndios criminosos.
A decisão (acesse aqui na íntegra), assinada pelo ministro Flávio Dino e publicada nesta segunda-feira (28), tem como foco a proteção da Amazônia e do Pantanal, biomas bastante afetados pelos incêndios nos últimos anos. No Pantanal, por exemplo, os focos de incêndio aumentaram 1.500% de 2023 para 2024, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), considerando o período de janeiro a junho de cada ano.
A ordem do STF prevê ainda a restrição às regularizações fundiárias nesses locais, conforme escreveu Dino.
“Determino a intimação da União e dos Estados que integram a Amazônia Legal e o Pantanal para que: (i) adotem instrumentos normativos e operacionais que impeçam a regularização fundiária de áreas em que se constate, de forma inequívoca, a prática de ilícitos ambientais; e (ii) promovam ações de indenização contra proprietários de terras que sejam responsáveis por incêndios dolosos e desmatamento ilegal”, informa o texto da decisão.
A determinação é uma resposta à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 743, apresentada pela Rede Sustentabilidade em 2020, com apoio de organizações ambientalistas como Observatório do Clima, Instituto Socioambiental (Isa), WWF e Greenpeace.
“É uma decisão bem-vinda, bem fundamentada, que reforça a atuação do Estado no combate aos incêndios criminosos e ao desmatamento ilegal”, avalia Paulo Busse, advogado do Observatório do Clima.
Ele ressalta que a ADPF terá continuidade, para ampliar a proteção também nas áreas onde são registrados incêndios não criminosos decorrentes da crise climática.
Para esses casos, as organizações indicam a contratação de mais brigadistas e de equipamentos de combate a incêndios.
Proteção de territórios quilombolas
Em uma das petições anexadas à ADPF, as organizações solicitam que os territórios quilombolas sejam incluídos no debate sobre o cancelamento ou a suspensão de registros de Cadastro Ambiental Rural (CAR) incidentes nessas áreas.
O CAR é um documento autodeclaratório, ou seja, o alegado proprietário da área pode fazer o documento e utilizá-lo como comprovação de propriedade. “E, várias vezes, essas declarações, autodeclarações, se sobrepõem a Terras Indígenas e a terras públicas, ou Unidades de Conservação e terras de quilombolas. O que significa que tem gente dizendo que é dono de terras dentro de territórios onde não pode”, explica Busse.
Os cadastros sobrepostos a essas áreas podem ser usados por grileiros e, de acordo com a petição, têm “ocasionado graves conflitos socioambientais”.
O debate sobre o cancelamento dos CARs incidentes em Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs) já existe no âmbito da APDF e fora dela, como destaca Busse. “Ele existe na sociedade, no mundo político e muito puxado pelas nossas organizações ambientalistas”, diz. Para o advogado, a inclusão dos territórios quilombolas na decisão pode representar um avanço na defesa dessas áreas. “Isso é uma discussão fundamental”, avalia.