A dificuldade de acesso a especialistas no Sistema Único de Saúde (SUS) é uma realidade que atravessa gerações e territórios. Não se trata de negligência, mas de um desafio histórico de organização e financiamento do sistema público. O novo programa do Ministério da Saúde, o Agora Tem Especialistas, parte justamente deste diagnóstico para propor uma resposta abrangente e articulada, que busca ampliar o acesso e reorganizar os fluxos do cuidado.
O programa não promete mágica, mas aposta em ações articuladas: ampliação de serviços, parcerias reguladas com o setor privado, valorização da regulação do cuidado e fortalecimento da atenção primária. Tudo isso com previsão de investimentos que superam os R$ 8 bilhões até 2026. Num país em que o orçamento da saúde vive sob pressão, é um esforço digno de reconhecimento.
A participação do setor privado no SUS sempre existiu, especialmente na atenção especializada. O programa agora propõe uma reordenação dessa relação: transformar dívidas antigas dos planos de saúde em serviços prestados à população. É uma medida ousada e inteligente, desde que acompanhada por regras claras, fiscalização rigorosa e garantia de que a qualidade do atendimento seja a mesma para todos, independentemente da origem do recurso.
Junto a uma ampliação mais imediata do acesso, é essencial que o programa contribua para avanços estruturais no sistema público. A rede própria do SUS precisa ser fortalecida, com investimento contínuo, planejamento e valorização dos profissionais. Que as ações emergenciais de hoje sirvam como alavanca para um modelo mais sustentável, equitativo e enraizado nos princípios do SUS.
Outro ponto importante é a conexão entre os níveis de atenção. Como médico de família e comunidade, penso que a aposta em tecnologia e em maior integração entre a atenção primária e os especialistas é estratégica: ajuda a evitar encaminhamentos desnecessários, dá mais fluidez ao cuidado e reconhece o papel da equipe de saúde da família como protagonista – e não como mera repassadora de pacientes.
O desafio vai além de reduzir filas: trata-se de reorganizar o cuidado no SUS de forma mais integrada e resolutiva. Para alcançar esse objetivo, será fundamental garantir acompanhamento contínuo, com transparência, controle social efetivo e compromisso com o fortalecimento da estrutura pública.
A população brasileira precisa e tem o direito de contar com especialistas quando necessário. O programa Agora Tem Especialistas é uma resposta concreta a esse desafio e pode marcar uma nova fase na organização dos cuidados no SUS. Que seja um passo firme rumo a um sistema mais acessível, eficiente e capaz de acolher a todos com dignidade. Como sempre afirmo: sigamos firmes na luta constante por um SUS do tamanho do povo brasileiro.