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De Virgínia Fonseca a Milei: ‘Política aparece de forma incidental aos jovens’, diz pesquisadora

Camila Rocha explica como influenciadores e algoritmos das redes moldam visão política de jovens na América Latina

A pesquisa Influenciadores, Jovens e Política na América Latina (2024), conduzida pelo Internet Lab, ouviu 350 pessoas de 16 a 24  anos no Brasil, Argentina, Chile, Colômbia e México. Entre os 100 brasileiros, surgiram 701 influenciadores diferentes, quase três quartos citados apenas uma vez. No topo das menções está Virgínia Fonseca (30%), seguida de nomes como Carlinhos Maia, Neymar, Felipe Neto, Whindersson Nunes e Mari Maria. O estudo revela um ambiente digital fragmentado e altamente segmentado, onde a política aparece de forma difusa, muitas vezes incorporada a conteúdos de entretenimento.

Para a cientista política Camila Rocha, uma das autoras da pesquisa, “a política acaba aparecendo de forma muito mais incidental” nos feeds. Ela relata o depoimento de jovens que, mesmo sem antes conhecer ou consumir conteúdos parecidos, se deparam com vídeos de líderes conservadores como o presidente da Argentina, Javier Milei, ou de El Salvador, Nayib Bukele. “Eles não precisavam buscar esse conteúdo sobre política para esse conteúdo aparecer. Vimos o poder que essa indústria da influência tem”, analisa ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato.

Segundo Rocha, algoritmos e investimento publicitário explicam a onipresença da extrema direita nas plataformas. “Um domínio maior de como os algoritmos funcionam ajuda muito a disseminar conteúdo, e se tem recursos financeiros para mover essa estrutura e chegar em mais gente, o impacto vai ser muito maior. Muitos dos políticos da extrema-direita têm todas essas coisas, para além de um aprendizado que eles trocam entre eles”, explica. Ela cita trocas de experiências em eventos internacionais e reciclagens de estratégias, como o boné vermelho do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que inspirou o acessório similar usado por Pablo Marçal, candidato ao governo de São Paulo na última eleição estadual.

A pesquisa diferencia conteúdos incidentais de postagens panfletárias. Para influenciadores, declarar voto explicitamente pode afastar seguidores; em vez disso, recorrem a sinais. “Fizemos uma nuvem de palavras de Virgínia Fonseca. Saiu ali ‘Deus’, ‘família’… palavras muito mais associadas com a direita”, exemplifica. Entre os jovens brasileiros, 40% preferem discutir política presencialmente para evitar o ambiente agressivo das redes, o que também pode explicar a estratégia mais discreta.

No entanto, Rocha vê espaço para disputa, especialmente diante de uma agenda em comum, como a taxação dos mais ricos e o fim da escala 6×1, no Brasil. “Nos últimos anos, viemos acompanhando o surgimento de novos influenciadores de esquerda. É aprender com o que dá certo e ir melhorando”, avalia. Para ela, regular plataformas e responsabilizar quem propaga desinformação são passos decisivos. “Uma vez que você responsabiliza de forma justa alguém, e isso aparece na esfera pública, você desencoraja outras pessoas a fazer coisas que não são boas para a democracia”, defende.

Para ouvir e assistir

BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.

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