A taxação de importações de produtos brasileiros pelos Estados Unidos anunciada na semana passada pelo presidente Donald Trump pode causar a redução do preço do café no mercado nacional. Desde janeiro do ano passado, o valor do quilo do café dobrou, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O Brasil é o maior produtor mundial de café. Em 2024, colheu 54,2 milhões de sacas de 60 kg do grão, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Quase toda essa produção foi exportada. Também em 2024, foram enviadas 50,5 milhões de sacas de café ao exterior, 28,8% a mais que em 2023.
A exportação massiva do produto reduziu a oferta dele internamente e pressionou os preços por aqui. Segundo o IBGE, no ano passado, o preço do pó de café no Brasil subiu 39,6%. De janeiro a junho deste ano, foram mais 42,9% de aumento.
Boa parte desse aumento está ligado ao consumo do café brasileiro pelos EUA. Hoje, cerca de 20% do café que o Brasil exporta atende a demanda dos consumidores estadunidenses. De toda importação de café dos EUA, 33% vêm do Brasil.
Cenário favorável para a queda de preços
Trump anunciou que, a partir de 1º de agosto, toda importação de produtos brasileiros terá uma tarifa extra de 50%. Isso tende a encarecer o café brasileiro nos EUA e dificultar nossas exportações. Em compensação, a oferta interna de café cresceria, criando assim um cenário favorável para a queda de preços por aqui.
“É possível ter algum impacto no preço interno, de queda. No caso do café, isto seria muito positivo, dada a importância significativa do café moído nos gastos do consumidor”, disse José Giacomo Baccarin, professor de economia e política agrícola da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e diretor do Instituto Fome Zero (IFZ).
Baccarin se dedica há anos a acompanhar a dinâmica de preços de alimentos no Brasil. Para ele, o preço do café e de outros produtos alimentícios tem subido além do normal nos últimos anos, justamente pelo aumento das exportações brasileiras.
O café é o terceiro produto mais exportado pelo Brasil aos EUA, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic). Só no ano passado, foram vendidos US$ 1,8 bilhão de café. Isso é 67% a mais do que em 2023 e 110% a mais do que há cinco anos, em 2019.
Especialistas no mercado internacional do grão dizem que as exportações de café brasileiro também crescem para outros países, inclusive da Ásia – um novo mercado da bebida. Os EUA, no entanto, é o maior consumidor de café do mundo. Por isso, alterações a dinâmica do comércio com o país tem consequências intensas.
Cotação influenciada pelo mercado global
Trump anunciou a taxação das importações brasileiras na última quarta-feira (9). Desde então, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo (USP), a cotação do café do tipo robusta caiu cerca de 5%. No caso do café arábica, houve alta de 2%.
Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), lembrou que a cotação do café no Brasil é fortemente influenciada pela cotação global do produto. Segundo ele, produtores brasileiros também podem optar por estocar o grão caso o preço dele venha a cair de forma brusca.
Apesar disso tudo, ele vê, sim, chance de queda do preço do café para o consumidor brasileiro. “É possível abrir espaço para a queda dos produtos por excesso de oferta. Espera-se que isso ocorra, pelo menos em parte”, disse.
Roberto Goulart Menezes, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Instituto Nacional de Estudos sobre EUA (INCT-INEU), também enxerga a possibilidade de queda, mas diz que isso ainda vai depender de outros fatores.
“Os produtores apostam na negociação. Vão reter os estoques e tentar vender pelo melhor preço, como sempre”, ponderou.
Juliane Furno, economista e professora de economia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), ressaltou que o café tende a ser o único produto que terá redução de preços no Brasil por conta da taxação. “Acho difícil [haver queda]. Acho que, no máximo, [atingirá] o café porque o problema era o aumento da exportação desde 2024. Os demais eu acho que não”, afirmou, lembrando que exportações brasileiras tendem a ser desviadas a outros mercados.
Gerson Teixeira, engenheiro agrônomo e diretor da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), afirmou que a queda do preço do café – se ocorrer – acontecerá no curto prazo. A longo prazo, a produção brasileira deve encontrar espaço em outros países, novamente reduzindo a oferta interna.