O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer que a indústria e o agronegócio brasileiros se envolvam diretamente na negociação em busca da reversão do tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump à venda de produtos brasileiros aos Estados Unidos. A participação de empresários na negociação foi acertada em reuniões entre representantes do governo e dos dois setores nesta terça-feira (15), em Brasília.
As reuniões fizeram parte do trabalho do comitê interministerial criado por Lula após o tarifaço. De manhã, ministros e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) se reuniram com representantes da indústria; de tarde, com o agro.
Trump anunciou na última quarta-feira (9) que, a partir de 1º de agosto, toda importação estadunidense de produtos brasileiros será taxada em 50%. A medida, segundo o republicano, é uma retaliação ao Brasil pelo processo criminal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de tentar um golpe de Estado após perder a eleição.
Para o governo brasileiro, o tarifaço é injusto. Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, disse nesta terça-feira aos industriais que as tarifas são “absolutamente inadequadas”, considerando inclusive a realidade do comércio bilateral entre Brasil e EUA.
“Os EUA têm déficit na balança comercial com boa parte do mundo, mas tem superávit com o Brasil. Temos uma importante complementaridade econômica. Um exemplo é a siderurgia: somos o terceiro comprador do carvão siderúrgico americano. Fazemos o aço plano, que vendemos para eles. Eles produzem o produto acabado”, descreveu Alckmin, pela manhã.
O vice-presidente ressaltou que a indústria nacional compartilha da opinião do governo sobre as tarifas. Ele, aliás, disse na reunião que empresas brasileiras devem procurar seus clientes ou parceiros nos EUA para que eles também pressionem o governo estadunidense a rever o tarifaço.
“O setor produtivo vai conversar com seus congêneres nos EUA, para quem eles vendem e compram, porque isso repercute também nos EUA, podendo encarecer produtos por lá”, afirmou Alckmin. “Todos vamos trabalhar juntos.”
Prazo
Ainda pela manhã, Alckmin disse que o prazo para vigência da tarifa é curto. Após a primeira reunião, ele chegou a considerar um pedido de adiamento do tarifaço para viabilizar a negociação. “Devemos trabalhar pela sua dilação”, afirmou Alckmin.
À tarde, após encontro com membros do agro, Alckmin negou a possibilidade de pedido de adiamento. “A ideia do governo não é pedir que o prazo seja estendido, mas é procurar resolver até o dia 31. O governo vai trabalhar para resolver nos próximos dias”, afirmou.
Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), ressaltou que o mais importante é a reversão total do tarifaço. Segundo ele, o adiamento dele pode resolver problemas momentâneos envolvendo o despacho de cargas perecíveis. Ele lembrou, entretanto, que esse mesmo problema pode se repetir no futuro.
“Se pudermos resolver antes do dia 31 de julho, é melhor. Se adiarmos e não evoluirmos na negociação em 90 dias, voltaremos a ter o mesmo tipo de problema”, disse. “Estamos uníssonos em busca de uma solução para a situação de ‘perde-perde’”.
Retaliação
Alban afirmou que a palavra de ordem entre governo e empresário é negociação. O presidente da CNI disse que o governo não deve reagir intempestivamente ao tarifaço impondo uma retaliação aos EUA.
Josué Gomes da Silva, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), disse que confia em um entendimento, tendo em vista a secular relação comercial entre Brasil e Estados Unidos.
“Vamos chegar a um entendimento. Temos confiança absoluta na capacidade negociador do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério do Desenvolvimento”, destacou.
Urgência
No caso do agronegócio, Alckmin falou da urgência de um acordo sobre o tarifaço, uma vez que parte dos produtos exportados pelo setor aos EUA é perecível. “Temos perecíveis e produtos que já embarcados. Por isso, o empenho para um acordo.”
Roberto Perosa, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), disse que frigoríficos brasileiros têm 30 mil toneladas de carnes produzidas para o mercado dos EUA, avaliadas em cerca de R$ 800 milhões, já embarcadas ou à espera de um navio no porto. O tarifaço, porém, inviabiliza o negócio. “Com a taxação, fica inviável a exportação para os EUA, que é o nosso segundo maior comprador”, afirmou.
Guilherme Coelho, presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas), registrou a preocupação do setor com a safra de manga para exportação. “São dois meses e meio. O Vale do São Francisco, que produz 90% de toda manga do Brasil, está em pane. Não sabemos o que fazer”, disse.
*Texto atualizado às 18h20 para acréscimo de informações.