A polêmica envolvendo a participação do historiador israelense Ilan Pappe na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) expôs a atuação orquestrada de entidades pró-Israel no Brasil. Judeu crítico ao sionismo, Pappe foi alvo de pressões que buscaram silenciar sua presença no evento, revelando o peso do lobby na disputa de narrativas culturais e políticas. No BdF Entrevista desta quinta-feira (21), o pesquisador Bruno Huberman, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), analisou como a defesa a Israel busca deslegitimar opositores, restringir o debate público e, paradoxalmente, acaba fomentando o antissemitismo.
Segundo o pesquisador, a Confederação Israelita do Brasil (Conib) funciona como principal articuladora desse movimento no país. “Aqui no Brasil, não existem organizações formais de lobby como existem nos Estados Unidos. O que existem são organizações que atuam em defesa do Estado de Israel das mais diversas formas, de maneira orquestrada e em parceria com a Conib”, explica.
Huberman destaca que a disputa sobre o que está acontecendo na Palestina e em Israel se dá em espaços de construção da opinião pública, como eventos culturais. “A Flip é um espaço onde circula a intelectualidade paulistana e carioca, basicamente, que compõem as elites desses estados que influenciam de sobremaneira os meios de comunicação, os políticos do centro e do centro-esquerda e da esquerda”, afirma.
A influência, segundo ele, não se restringe a esses espaços, tendo repercussões em âmbito municipal e federal, atuando diretamente na percepção das pessoas e da sociedade. “É uma disputa a respeito da posição política que o povo brasileiro tem e como isso resulta em políticas efetivas, a exemplo das federações de petroleiros que estão defendendo que o Brasil faça embargo energético a Israel como uma forma de liberdade ao povo palestino”.
Para o professor, a centralidade da propaganda é parte histórica da estratégia israelense. “O Estado de Israel sempre teve ciência de que a propaganda internacional é central. É por isso que se fala em Hasbara, que é essa guerra de informação, que envolve treinamento, alinhamento de discursos, desumanização dos povos árabes”.
Uma das práticas mais recorrentes, observa, é a vinculação direta entre judaísmo e sionismo. Ele também defende que compreender o funcionamento desse lobby é fundamental para entender como a defesa irrestrita de Israel pode acabar, paradoxalmente, alimentando o antissemitismo.”Essa vinculação de que judaísmo é sinônimo de sionismo coloca as comunidades judaicas em risco. Quando qualquer crítica a Israel é considerada antissemitismo, inclusive críticas feitas por judeus, isso é uma estratégia para silenciar”, conclui.
Para ouvir e assistir
O BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.