O governo venezuelano anunciou nesta sexta-feira (5) a convocação dos alistados na Milícia Nacional Bolivariana para ativar o que foram chamadas de “milícias comunais”. A mobilização acontece no momento em que cresce a tensão militar entre Estados Unidos e Venezuela com a presença de navios de guerra estadunidenses no sul do Caribe.
A ideia do governo é ampliar a defesa territorial e articular duas ferramentas importantes do governo chavista na política local: comunas e milícias. O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, promoveu nas últimas semanas um alistamento em massa de milicianos. O número de voluntários subiu de 4,5 milhões para 8,2 milhões em dois finais de semana.
A milícia bolivariana é uma organização formada em 2009 composta por civis e militares aposentados em seus quadros. Eles recebem treinamento para defesa pessoal e fiscalização do território em seus diferentes contextos — urbano e rural. A milícia passou a compor uma das cinco Forças Armadas da Venezuela, que tem uma estrutura diferente do Brasil.
A ideia da milícia é trazer o cidadão para a lógica de defesa do país e somar esforços entre as Forças Armadas e os venezuelanos. Com isso, o governo entende que há uma união cívico-militar na política de segurança do país.
No caso do formato de milícias comunais, a ideia é transportar a estrutura miliciana para as comunas. Criadas a partir da Lei Orgânica de Comunas, promulgada em 2010 pelo então presidente Hugo Chávez, as comunas são experiências de uma nova forma de organização social baseada na autogestão e com diálogo permanente com o Estado. Com isso, o governo busca não só aumentar a capacidade de defesa territorial, como estimular a participação desses grupos na discussão sobre soberania nacional.
Maduro afirmou que essa será a “primeira vez na história que as unidades comunais da milícia serão ativadas, abrangendo o mapa nacional de norte a sul, de leste a oeste, até a última comunidade, e os mecanismos de ativação estão estabelecidos”.
Essa é uma inovação do governo venezuelano em meio a ameaças militares dos EUA. A Lei Constitucional das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB), aprovada em 2020, já estabelecia um contato entre militares e comunas, mas não definia a existência de uma milícia comunal. Ao todo, serão 15.751 Unidades Comunais de Milícias (UCM).
“Temos a capacidade, e demonstramos, de garantir a paz a este país, a estabilidade, o crescimento, a igualdade, a liberdade, a vida e a felicidade, e também a paz para trabalhar, viver, estudar, partilhar, criar uma família e também para festejar. Cada UCM terá um conjunto de bases populares para defesa integral”, afirmou Maduro.
Denúncia dos EUA
O Departamento de Estado dos EUA afirmou na noite desta quinta-feira (4) que duas aeronaves venezuelanas sobrevoaram as embarcações estadunidenses que estão no Caribe. Em nota, o órgão disse que essa é uma manobra “provocativa” e voltou a acusar, sem provas, o governo de Maduro de articular o tráfico na região.
“Hoje, duas aeronaves militares do regime de Maduro sobrevoaram um navio da Marinha dos EUA em águas internacionais. Essa manobra altamente provocativa foi planejada para interferir em nossas operações de combate ao narcoterrorismo. O cartel que governa a Venezuela é fortemente aconselhado a não realizar quaisquer esforços para obstruir, dissuadir ou interferir nas operações de combate ao narcotráfico conduzidas pelas forças armadas dos EUA”, diz o texto.
Segundo a BBC, a operação teria usado caças F-16 e o alvo seria o navio USS Jason Dunham, um destróier de mísseis guiados. O governo estadunidense, no entanto, não publicou nenhum vídeo com o sobrevoo das aeronaves.
O governo venezuelano não respondeu às acusações até a publicação desta reportagem.
De acordo com a AFP, a Casa Branca estaria enviando 10 caças F-35 para Porto Rico, além de outros 9 aviões militares para o Panamá para realização de exercícios militares conjuntos.
Durante essa semana, o presidente dos EUA anunciou o abatimento de um barco na região. Em um vídeo compartilhado nas redes sociais, uma lancha aparece navegando e, minutos depois, explode ao ser atacada por uma bomba estadunidense. A publicação, no entanto, não tem detalhes como localização, horário, identificação da embarcação e muito menos quem fez o disparo da bomba.
Trump disse que a embarcação saiu da Venezuela e era vinculada ao grupo criminoso Trem de Aragua. Ele afirmou que 11 pessoas morreram na operação. Caracas respondeu e disse que o vídeo foi feito por Inteligência Artificial.
Grupo de países contesta
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, divulgou nesta quinta um comunicado com 21 países da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) rejeitando as ameaças dos EUA na região. O mandatário disse que “a grande maioria dos membros da Celac assinou o documento pela paz na América Latina e no Caribe” e mostram grande preocupação com o deslocamento militar.
A nota não é uma declaração oficial do grupo, mas foi assinada pela maioria dos integrantes, que pedem o fim das operações e a retirada dos navios da região.
Assinaram o texto: Antígua e Barbuda, Barbados, Belize, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Dominica, Granada, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, República Dominicana, São Cristóvão e Névis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Suriname, Uruguai e Venezuela.
Em 1º de setembro, os ministros da Celac já haviam denunciado a presença dos navios militares na costa venezuelana. Em uma reunião emergencial virtual convocada pelo governo colombiano, o grupo de países reforçou que essa mobilização representa uma preocupação para toda a América Latina e pediu que as tropas estadunidenses deixem a região.