Depois de chegar ao piso da série em 2022, com cerca de R$ 3,5 bilhões em valores liquidados e corrigidos pela inflação, o orçamento federal da função Gestão Ambiental quadruplicou em dois anos. Em 2024, alcançou aproximadamente R$ 15,3 bilhões — um salto de 4,35 vezes no período. Os dados compreendem um período de nove anos, entre 2016 e 2024.
Esse recorte orçamentário reúne fiscalização e comando e controle, combate a incêndios, licenciamento, manejo e administração de unidades de conservação, obras e infraestrutura ambiental, pesquisa e conservação da biodiversidade, gestão florestal, segurança hídrica e ações socioambientais em territórios indígenas e quilombolas. Inclui ainda iniciativas voltadas à redução de agrotóxicos e projetos de mitigação e adaptação climática.
No cenário internacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta semana, em discurso na Assembleia Geral da ONU, um aporte brasileiro de US$ 1 bilhão a um novo fundo global para florestas tropicais. O gesto sinaliza o papel que o Brasil pretende apresentar ao sediar a COP30, em novembro, em Belém (PA).
Em casa, os primeiros resultados começam a aparecer. Dados do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam queda de 30,6% no desmatamento da Amazônia em 2024, com 6.288 km² desmatados, contra 9.064 km² em 2023. Trata-se da menor taxa desde 2018 e de um indício de retomada da política de comando e controle.
No entanto, os incêndios permanecem como desafio. O Inpe registrou números elevados em 2024, influenciados pela seca severa e pelos efeitos do El Niño. Especialistas destacam que a pressão do fogo responde não apenas à fiscalização, mas também a variáveis climáticas e sazonais.

O que é “Gestão Ambiental”
A função Gestão Ambiental, identificada pelo código 18 no Orçamento Federal, agrega todas as ações finalísticas e de apoio relativas a meio ambiente e clima em diferentes ministérios e autarquias. O escopo vai do licenciamento e fiscalização até obras de infraestrutura ambiental, passando por pesquisa e biodiversidade, segurança hídrica, gestão de florestas e ações socioambientais em territórios indígenas e quilombolas.
Segundo Adriana Pinheiro, assessora de incidência política do Observatório do Clima, esse recorte é estratégico. “Quando a gente pega esse extrato, ele é muito legal para ver de forma mais ampla a área ambiental. Ele pega meio ambiente e clima, mas também saneamento e recursos hídricos. Então é excelente para enxergar a política ambiental como um todo.”
Esse recorte permite observar a política ambiental em sentido amplo. A média de R$ 9,9 bilhões nos anos de 2023 e 2024, sob Lula, contrasta com os R$ 4,3 bilhões do governo Bolsonaro e os R$ 5,2 bilhões registrados no período Temer.
Fiscalização e combate a incêndios
Dentro da função 18, algumas rubricas concentram o núcleo do comando e controle ambiental. São ações ligadas ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
No Ibama, os orçamentos destinados à fiscalização e à prevenção e combate a incêndios foram reforçados. Em 2024, juntas, alcançaram R$ 322 milhões, alta de 165%. Com relação às rubricas ligadas ao ICMBio, a fiscalização foi reforçada, mas o combate a incêndios decaiu no período mais recente
Segundo Adriana Pinheiro, há um reforço financeiro perceptível destinado ao meio ambiente. “Existe uma correlação entre o aumento orçamentário e a melhora dos indicadores. Quando há investimento, a política tende a se tornar mais efetiva. Mas não é associação direta, o resultado depende de capacidade institucional e coordenação federativa”, explica.

Falta “engenharia institucional”
Mesmo com o reforço orçamentário, a presença do Estado em campo continua limitada pelo déficit de pessoal. O Ibama contava com cerca de 1.800 agentes fiscais em 2009. Em 2021, esse número caiu para 630 e, em junho de 2025, estava em 771.
A queda na força de trabalho impactou o número de autos de infração: foram 19,6 mil em 2010 contra 8,4 mil em 2021, uma redução de 55%. Segundo a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema), o déficit chega a 50,9% entre analistas ambientais e 82,6% entre analistas administrativos. No ICMBio, apenas 55% do quadro previsto está ocupado, e mais da metade já reúne condições para aposentadoria.
“Não é só dinheiro”, reforça Adriana Pinheiro. “Falta pessoal, capacidade técnica e coordenação entre União, estados e municípios. Cada bioma demanda um desenho específico. A Amazônia concentra o desmatamento ilegal; o Cerrado exige outra abordagem para o fogo e a sazonalidade. Sem essa engenharia institucional, o ganho não se sustenta.”
Para o Observatório do Clima, a experiência reforça a necessidade de blindar as políticas ambientais contra flutuações políticas. “Meio ambiente e clima precisam ser tratados como política de Estado. Desmontar é rápido; reconstruir é lento”, resume Pinheiro.

Economia da floresta em pé
Entre as propostas defendidas pelo Observatório do Clima estão a criação de marcadores orçamentários ambientais, que conectem planos a linhas de gasto, e a blindagem contra contingenciamentos. A entidade também propõe discutir um percentual mínimo para emendas parlamentares voltadas ao clima e à adaptação, referência que poderia variar entre 5% e 10%.
Outra prioridade é a recomposição de quadros por meio de concursos regulares, capacitação técnica e fortalecimento do poder de polícia, garantindo aplicação de multas e embargos. Também ganha relevância o estímulo a uma “nova economia da floresta em pé”, baseada em bioeconomia, valorização de serviços ecossistêmicos, intensificação sustentável em áreas já abertas e fortalecimento comunitário.
Para a assessora de incidência política Adriana Pinheiro, o debate sobre sustentabilidade passa pela revisão do modelo econômico: “A expansão desordenada sobre vegetação nativa é incompatível com o futuro. A alternativa combina floresta em pé, bioeconomia e renda de baixo impacto. E isso exige tanto recursos estáveis quanto instituições fortalecidas.”