O futuro de Fortaleza está em debate. A revisão do Plano Diretor, instrumento que orienta o crescimento e a ocupação da cidade, deve chegar à Câmara Municipal em novembro. Previsto para 2019, o processo foi adiado primeiro pela pandemia e, depois, pelas dificuldades da gestão anterior em conduzir as etapas necessárias. Agora, audiências públicas, conferências e discussões com a sociedade civil buscam definir quais caminhos a capital cearense seguirá nos próximos dez anos, da garantia do direito à moradia digna, à preservação ambiental e, principalmente, à redução das desigualdades.
Desde agosto, a Comissão Especial do Plano Diretor definiu o cronograma de atividades. Nesse mês ocorreu o primeiro ciclo de audiências públicas promovidas pela Prefeitura, seguido pelo segundo ciclo em setembro (dias 13, 20 e 27), quando foram debatidos a proposta consolidada e os instrumentos de planejamento: zoneamento, parâmetros urbanísticos, governança, sistemas urbanos e indicadores. Em outubro está prevista a elaboração da minuta do projeto e, em novembro, a mensagem será enviada à CMFor.
Artur Bruno, presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan), explica que há uma comissão do Plano Diretor na Prefeitura (Executivo) e outra na Câmara (Legislativo). “As audiências em curso ocorrem no âmbito do Executivo, iniciadas em 2 de agosto e encerrando em 4 de outubro, totalizando oito audiências em dois ciclos”. Após elas, ocorrerá a Conferência da Cidade, em 24, 25 e 26 de outubro, reunindo sociedade civil, poder público e entidades. “Nossa previsão é que a mensagem chegue à Câmara em 6 de novembro. A Câmara discutirá e deliberará”, afirmou.
Para a vereadora Adriana Gerônimo (PSOL), integrante da Comissão, a participação popular é essencial: “Estamos falando de um plano com vigência de dez anos, capaz de reduzir desigualdades, promover justiça urbana e definir onde a cidade deve ter infraestrutura para além do Centro”.
Para que serve o Plano Diretor?
O Plano Diretor é uma lei municipal que reúne estratégias e regras de urbanização, organizando o crescimento da cidade. Previsto no Estatuto da Cidade (2001), é obrigatório para municípios com mais de 20 mil habitantes e deve ser revisto a cada dez anos.
Em Fortaleza, a revisão está atrasada em seis anos. O atual processo faz parte do Plano de 2009 (Lei Complementar 062) e seus instrumentos complementares. “Até o fim de 2024, não havia proposta técnica consolidada. Ao assumirmos a gestão em 2025, encontramos mais dissensos que consensos”, disse Bruno.
O grupo técnico multidisciplinar (GTEC) foi reforçado com mais especialistas. “Não recomeçamos do zero, respeitamos as contribuições já feitas por movimentos, universidades e sociedade civil. As vitórias alcançadas foram mantidas”, acrescentou.
Moradia digna
Cícera da Silva Martins, presidente do Conselho Gestor das ZEIS Pici, critica a ausência de avaliação do Plano anterior. Para ela, “morar com dignidade não é só ter teto, mas infraestrutura e políticas públicas adequadas”.
Segundo Cícera Martins, pouco mudou desde 2009. “As Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) deveriam ter sido implementadas um ano após o Plano e até hoje estamos lutando por isso”.
Para Renato Pequeno, professor do Instituto de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal do Ceará (IAUD – UFC) e pesquisador do Observatório das Metrópoles e Coordenador do Laboratório de Estudos da Habitação da UFC (LEHAB), “o Plano deve ordenar o crescimento, garantir a função social da propriedade, combater especulação, assegurar direito à moradia e regularização fundiária, sempre com transparência e participação popular”.

ZEIS
Adriana Gerônimo destaca a necessidade de ampliar as ZEIS do tipo 1, voltadas a assentamentos precários, e criar ZEIS de Vazio para áreas subutilizadas destinadas a habitação social e equipamentos públicos. “Queremos mais financiamento e que parte do Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb) seja destinada às ZEIS, para melhorias habitacionais e destinação de terrenos vazios”, afirmou.
Desafios
Entre os principais desafios, Gerônimo cita o avanço dos grandes prédios. “Já vemos na Beira Mar e Praia de Iracema esgoto clandestino e rede defasada. O instrumento da outorga onerosa deve reduzir desigualdades, com recursos do Fundurb aplicados em melhorias habitacionais”.
Ela aponta ainda o desafio ambiental: preservar áreas, recuperar regiões desmatadas e enfrentar a emergência climática. “Fortaleza precisa de plano contra enchentes e alagamentos, que já se repetem todos os anos”.
Combate à desigualdade
Para Renato Pequeno, até agora o Plano ainda privilegia o mercado imobiliário. “Basta observar torres de 50 andares em áreas onde o máximo era 23. Os instrumentos que favorecem o mercado são detalhados, enquanto os de enfrentamento às desigualdades ficam como intenções. É um Plano Diretor de uma cidade desigual, que negligência o diagnóstico. Isso é insustentável”.
Mais informações
O Plano Diretor possui site oficial: planodiretor.fortaleza.ce.gov.br, com apresentações das audiências públicas. Notícias também estão disponíveis nos sites da Prefeitura de Fortaleza e do Ipplan.
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