No embalo dos problemas já registrados na última semana, o primeiro dia do ano, data da posse de Jair Bolsonaro (PSL), foi marcado por novos conflitos no relacionamento com os profissionais da imprensa.
Submetidos a normas rígidas impostas pela segurança do evento, repórteres, fotógrafos e cinegrafistas ficaram impedidos de circular entre os diferentes espaços da cobertura – Palácio Itamaraty, Congresso Nacional, Esplanada dos Ministérios e Palácio do Planalto – e também entre os vários setores de cada local, diferentemente do que ocorria em posses anteriores.
No Congresso, somente no turno da tarde foi liberado o acesso a alguns corredores e também ao Comitê de Imprensa da Câmara dos Deputados, tradicional espaço de trabalho dos correspondentes. Entre as regras definidas pela organização para a cobertura, os jornalistas não puderam portar itens como Equipamentos de Proteção Individual (EPI), sugeridos pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) desde 2014, e garrafas d´água.
No Salão Verde da Câmara, por exemplo, onde geralmente são gravadas entrevistas, os profissionais tiveram acesso à água somente depois das 10 horas da manhã, mesmo trabalhando em esquema de plantão desde as 8 horas, conforme havia sido determinado pela segurança do evento como regra geral para a cobertura.
Apesar da liberação posterior, equipes que foram lotadas na chapelaria, um dos salões de entrada do prédio, relataram que tiveram o serviço de abastecimento de água interrompido por cerca de duas horas no período da tarde, antes do início oficial da solenidade.
O local reunia jornalistas brasileiros e estrangeiros, incluindo profissionais de veículos argentinos. No Itamaraty, jornalistas chineses e franceses chegaram a se retirar do prédio, em protesto contra as restrições.
A rigidez das normas constrangeu inclusive jornalistas que atuam nos setores de assessoria de imprensa da Câmara e do Senado. Atônitos diante das regras e também da alteração constante de algumas definições prévias feitas pela organização, eles tiveram dificuldade de mediar a negociação com mandatários do evento para que fosse liberado, por exemplo, o acesso de repórteres e fotógrafos aos bebedouros de água e também ao Comitê de Imprensa.
Plenário
Diante desse contexto, diversos jornais foram excluídos do plenário da Câmara dos Deputados, onde se deram os discursos oficiais da posse. Segundo informações de bastidor apuradas pelo Brasil de Fato, somente cerca de 20 jornais receberam a senha de acesso ao local.
Entre os que obtiveram a permissão, estavam o jornal O Estado de São Paulo e os veículos do Grupo Globo. Os critérios de escolha e a lista oficial dos nomes não foram divulgados. Embora a informação não seja oficialmente confirmada, a reportagem apurou que a seleção dos veículos teria sido feita pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE).
Reação
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) reagiu, nesta terça-feira (1º), por meio de nota repudiando as normas e pedindo às autoridades uma mudança nas regras da cobertura.
Na última quarta-feira (26), a entidade havia publicado uma primeira nota reclamando das limitações ao trabalho dos profissionais e pedindo uma solução para o impasse. No entanto, o governo cedeu apenas em alguns pontos, como a liberação para o uso de bolsas e mochilas, necessárias ao transporte de equipamentos de trabalho e itens pessoais.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o coordenador do Sindicato Gésio Passos classificou como “inaceitável” e “desumana” a postura do novo governo com os jornalistas.
“Não há nenhuma questão de segurança que justifique o tratamento dado à imprensa no dia de hoje. A gente está muito preocupado. Essa é mais uma ameaça de um governo que já se coloca como autoritário e que pode impedir e afetar claramente a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e o direito de informação de toda a população”, completou o dirigente.
A entidade informou que, entre as denúncias observadas ao longo do dia, profissionais relataram ter recebido ameaças de tiro caso deixassem a área reservada para a imprensa.
A equipe de comunicação do novo governo não se pronunciou oficialmente junto à imprensa a respeito das queixas.
Edição: Mauro Ramos