"Paro Cívico"

Mais de 180 organizações colombianas participam de paralisação neste 25 de abril

Movimentos populares, indígenas e camponeses se mobilizarão em defesa da paz e contra políticas neoliberais do governo

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Camponeses na região de Catatumbo durante a última greve nacional, realizada em 2016
Camponeses na região de Catatumbo durante a última greve nacional, realizada em 2016 - Foto: CISCA

Nesta quinta-feira (25), mais de 180 movimentos populares, partidos políticos, sindicatos, organizações indígenas e afro-colombianas se mobilizarão nas principais estradas, ruas, rodovias, praças, universidades da Colômbia, como parte de uma paralisação nacional. 

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A proposta dos movimentos é apresentar suas demandas ao presidente do país, Iván Duque, e sua equipe. Uma delas é a exigência de que o governo cumpra os acordos assinados com os movimentos sociais nas paralisações anteriores -- a última realizada em 2016 --, bem como as determinações dos Acordos de Paz assinados entre o governo colombiano e o ex-grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) em 2016 em Havana, Cuba.

Os movimentos também manifestarão posição contrária ao Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) proposto pelo governo. Eles afirmam que o PND é mais uma política neoliberal que favorece as empresas extrativistas estrangeiras em detrimento das necessidades do povo colombiano.

Outra exigência é que o governo da Colômbia tome medidas imediatas para proteger as vidas dos líderes sociais no país e ponha fim à violência paramilitar que deixou 600 líderes mortos desde a assinatura dos Acordos de Paz em Havana, apontando ainda para o aumento acentuado da criminalização e perseguição desses líderes.

Iván Duque: um retorno a um passado (mais) violento

Desde que Iván Duque assumiu o cargo, em agosto de 2018, os movimentos da Colômbia se mobilizam para denunciar suas políticas sociais e econômicas, bem como o retorno a um regime violento e repressivo que aniquilou o setor social colombiano nos anos 2000, quando Álvaro Uribe Vélez foi presidente.

Iván Duque, do mesmo partido que Uribe, o Centro Democrático (CD), é considerado o sucessor político do ex-presidente de extrema direita, agora senador. Uribe aplicou uma política de tolerância zero em relação aos grupos guerrilheiros da Colômbia, sem negociações de paz por considerá-los “grupos terroristas”. Antes de Duque ser eleito, muitos temiam que ele adotasse uma linha dura semelhante e revertesse anos de trabalho e negociações em direção a uma paz verdadeira e duradoura na Colômbia.

Receios não estão distantes da realidade atual. Desde o início de seu mandato, o governo de Duque tem deixado de cumprir os acordos assinados em Havana em 2016. Mais recentemente, ele tentou desmantelar a Jurisdição Especial para a Paz (JEP) ao se opor a 6 dos 159 artigos da sua Lei Estatutária. O JEP é um sistema de justiça transicional que foi criado através dos acordos de paz de Havana para investigar, julgar e condenar todos os responsáveis pelos crimes cometidos durante a guerra de cinco décadas entre as forças guerrilheiras e as forças de segurança da Colômbia. É uma parte central do acordo, pois permite que as vítimas do conflito tenham acesso à verdade e justiça. Essa ação de Duque foi rejeitada nacional e internacionalmente como uma grave ameaça ao processo de paz.

As negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional (ELN) também estão ameaçadas. O governo se recusa a retomar as rodadas de diálogo com o ELN que começou com o governo de Juan Manuel Santos. Após o bombardeio da Academia de Polícia em Bogotá em 17 de janeiro, o governo exigiu a prisão de líderes do ELN que fazem parte da delegação de paz, e atualmente estão em Cuba, e suspendeu as negociações por tempo indeterminado.

A presidência de Duque também tem sido caracterizada pela resposta militarizada e violenta aos protestos populares. No começo de abril, a Minga Social, jornada que reuniu cerca de 12 mil camponeses, indígenas e afrodescendentes em mobilizações em diversas regiões do país, foi duramente reprimida pelas forças de segurança colombianas.

No município de Cajibío, em Cauca, no dia 2 de abril, Deiner Ceferino Yunda Camayo, um jovem de 20 anos foi assassinado após a repressão do Esquadrão Móvel Antidistúrbios (ESMAD), uma força de operações especiais da Polícia Nacional da Colômbia, ativada pelo governo Duque para reprimir os protestos.

Desenvolvimento nacional para quem?

A oposição ao Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) proposto por Duque é um fator central da paralisação. O PND, que deve ser adotado pelo Congresso colombiano no próximo dia 7 de maio, foi rejeitado por diversos setores da sociedade colombiana. As críticas centrais do plano estão relacionadas à extração de recursos naturais como petróleo, carvão e energia hidrelétrica. Na Colômbia, 90% desses recursos são exportados e, devido aos incentivos fiscais que o país oferece às multinacionais, a Colômbia vende esses recursos com prejuízos.

Várias comunidades que vivem em territórios afetados por seus megaprojetos têm realizado consultas populares para determinar se querem ou não projetos mineradores em seus territórios. No entanto, em outubro de 2018, o Tribunal Constitucional da Colômbia determinou que as consultas populares não poderiam ser invocadas para vetar ou restringir projetos extrativistas, pois o subsolo pertencia à nação. Assim, atualmente, estas comunidades praticamente não têm voz sobre as decisões que envolvem suas vidas.

Unidade em ação

A paralisação nacional que terá início nesta quinta-feira (25) é organizada desde fevereiro deste ano. Na ocasião, representantes de mais de 180 movimentos e organizações sociais e partidos políticos de esquerda se reuniram para estabelecer “um plano comum para defender a vida, a terra, a paz e a democracia e combater as políticas neoliberais e extrativistas da direita”.

A expectativa dos movimentos é que esta seja uma das maiores mobilizações da história colombiana e uma expressão da unidade dos setores progressistas do país.

:: ESPECIAL | Colômbia profunda: povos e territórios em resistência ::

*Com informações do Peoples Dispatch e do Colombia Informa.

Edição: Luiza Mançano