Eleições 2020

Candidato do PCO em SP participa de eleição para criticar o processo: "É uma fraude"

Antonio Carlos Silva acredita que não será eleito, mas que irá chamar a atenção para a mobilização dos trabalhadores

Ouça o áudio:

"Nós do PCO não defendemos um governo do PCO. Nós lutamos por um governo dos trabalhadores" - Divulgação PCO
Eu não tenho nenhuma ilusão de que eu vá ser eleito

O entrevistado desta quarta-feira (14) da série Brasil de Fato Entrevista – Especial Eleições, é Antonio Carlos Silva, candidato à Prefeitura de São Paulo, pelo Partido da Causa Operária (PCO), e professor da rede pública de ensino estadual paulista. 

Apesar de candidato, Silva afirma que não tem nenhuma ilusão de que será eleito. A presença do PCO, por meio de sua candidatura, no pleito municipal de São Paulo tem o objetivo de denunciar a “fraude das eleições” que, segundo ele, foram organizadas de forma “antidemocrática” para “favorecer a direita”. 


 

“A eleição é uma fraude, está colocada claramente em São Paulo e em todo o país para ter uma ‘pseudo disputa’ entre o ruim e o pior ainda. O Russomanno (candidato pelo Republicanos) serve como um espantalho, como acontecia com Maluf (ex-prefeito de São Paulo entre 1993-1997), em décadas anteriores: ‘Vejam, tem que votar no candidato fulano se não o Russomanno, que é direitista, vai ganhar a eleição’. Tudo para promover a vitória de um candidato da direita”, afirma Silva.

A candidatura também visa chamar a atenção para a necessidade de mobilização da população, cuja debilidade, segundo o candidato, seria a chave para entender as razões dos problemas colocados no município de São Paulo como a gestão da pandemia de covid-19, o aumento anual das passagens de ônibus e a piora das condições de vida da classe trabalhadora.

Para Silva, se os trabalhadores estão mobilizados, o governo tende a atender aos interesses da população, e não de pequenos grupos. 

Confira a entrevista na íntegra:

Candidato, no Diário da Causa Operária, do PCO, há um artigo em que se diz que essa eleição "será ainda mais fraudulenta e um prato cheio para a direita golpista avançar no regime político, ao mesmo tempo que a esquerda retrocede e perde cada vez mais espaço". Como candidato à Prefeitura de São Paulo, o que essa eleição significa para o senhor? O senhor concorda com o que está publicado no Diário da Causa Operária? Por quê?

Eu não tenho nenhuma ilusão de que eu vá ser eleito. Nós estamos na eleição para denunciar a fraude das eleições, que foram organizadas de forma muito antidemocrática, para favorecer a direita. É a primeira eleição feita depois da reforma política golpista de 2017, que excluiu 10 partidos do horário eleitoral gratuito, entre eles o PCO, o que obviamente vai fazer com que a maioria da população nem saiba que eu sou candidato.

A eleição vai ser controlada. A TV Globo anunciou na sua cobertura que vai dar 50 segundos ao longo de toda a campanha para o PCO aparecer na sua comunicação. A imprensa já escolheu quem são os candidatos

É uma eleição manipulada, fraudulenta. A esquerda precisa denunciar isso

Tem um monopólio dos partidos capitalistas que estão no Congresso Nacional que dominam essa situação. Eles vão dominar tudo, muitos partidos não vão nem ter tempo de televisão. É uma eleição profundamente antidemocrática, em 45 dias, tudo é proibido. Quer dizer, não é uma verdadeira eleição. É uma política para reconduzir, na maioria dos casos, ao governo, os nomes da direita ou, no melhor dos casos, estabelecer uma disputa entre duas alas da direita golpista.

A eleição é uma fraude, ela está colocada claramente em São Paulo e em todo o país para ter uma “pseudo disputa” entre o ruim e o pior ainda. O Russomanno serve como um espantalho, como acontecia com Maluf, em décadas anteriores: “Vejam, tem que votar no candidato fulano se não o Russomanno, que é direitista, vai ganhar a eleição”. Tudo para promover a vitória de um candidato da direita. 

É uma eleição manipulada, fraudulenta. A esquerda precisa denunciar isso. Não se trata de simplesmente um problema eleitoral, nesse momento. É para abrir uma perspectiva diante da situação, para unir a esquerda que nós consideramos uma tarefa muito importante, para a qual é necessário uma liderança, como é o caso do ex-presidente Lula, para defender a restituição dos seus direitos políticos e a candidatura presidencial do companheiro Lula, a única pessoa nesse momento capaz de promover essa unificação.

E veja, eu não sou do PT, eu sou do PCO. Nós fomos expulsos do PT, nós temos muita divergência, mas nós temos de olhar do ponto de vista de uma perspectiva e não ficar numa mesquinha disputa onde cada um está preocupado em eleger um vereador a mais ou a menos, em uma eleição que está armada para promover uma grande derrota da esquerda e garantir para a direita o controle da maioria das cidades do país. 

Candidato, o senhor defendeu a existência de conselhos populares durante o anúncio da sua candidatura. Em São Paulo, no entanto, os conselhos participativos estão sucateados. Em outubro de 2019, Fernando José de Souza, ex-conselheiro da subprefeitura de Parelheiros (zona sul), afirmou em uma reportagem que as subprefeituras não atendem às solicitações encaminhadas pelos conselhos participativos. Da mesma maneira, a ex-conselheira da subprefeitura de Santo Amaro (zona sul), Elisete Lopes também criticou a eficiência dos conselhos. Tendo em vista que esses relatos são comuns, como fazer para que as pautas dos conselhos participativos sejam concretizadas? 

Antonio Carlos Silva: Esta é uma questão fundamental para nós que é o problema da organização da população e da efetiva participação democrática da população na gestão da cidade. Nós do PCO não defendemos um governo do PCO. Nós lutamos por um governo dos trabalhadores, por um governo que seja exercido pelas organizações que representam os interesses do conjunto da maioria da sociedade, principalmente daqueles setores que produzem a riqueza da nossa cidade e do nosso país. 

Esses conselhos têm caráter meramente de um arremedo de democracia. Quando a gente fala do conselho, a gente está falando de uma mobilização efetiva da população, através de seus sindicatos, de suas associações populares, para criar uma nova forma de representação.

Uma forma de estabelecer o poder, estabelecer verdadeiramente um governo operário de um conjunto de setores explorados, em uma cidade como é o caso de São Paulo, em que a classe operária é tão forte, decisiva na construção da riqueza do país, mas que na cidade não opina nada. 

Nós temos uma representação totalmente falsa que é a Câmara dos Vereadores que não representa os interesses da população. Ela é a representação principalmente dos setores capitalistas que financiam a campanha milionária da maioria dos candidatos. São representantes das empresas de ônibus, dos especuladores imobiliários, do sistema financeiro.

Evidentemente, isso não vai ser resolvido num passe de mágica, em uma única eleição e através do voto, mas é necessário que a esquerda e as organizações dos trabalhadores discutam uma nova forma de organização. Essa forma que aí existe está superada e não atende efetivamente aos interesses dos trabalhadores, mas apenas os grupos capitalistas que dominam a cidade. 

Trata-se de lutar por uma nova forma de governança, um governo efetivamente da população que constrói a riqueza da cidade, através de conselhos operários e populares, com delegados eleitos nos bairros, nos locais de trabalho, nas escolas e universidades, revolucionando essa situação que a gente tem no momento na nossa cidade e em todo o país. 

Candidato, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), afirmou que só vai autorizar a volta às aulas presenciais na cidade quando a Vigilância Sanitária julgar adequado. Mas antes disso, tinha previsto o retorno para o dia 3 de novembro. O senhor, que é professor da rede pública, como vê esse movimento do atual prefeito? E, caso eleito, com quais medidas pode se comprometer no combate à pandemia de covid-19?

Não há testes em massa, não houve atendimento e separação da população. O que a gente viu foi discurso. A cada dia o Doria [governador de São Paulo, do PSDB] e Covas se revezavam com seus assessores fazendo discursos, se apresentando como governos científicos, mas nada de distribuição de equipamentos de proteção para a população, nada de garantia do atendimento. Quando a população trabalhadora, diferentemente daqueles que podem usar os hospitais Albert Einstein ou Sírio Libanês [ambos particulares e caros], chegou nos postos de saúde, voltou para casa. 

Não houve isolamento de fato, o isolamento foi uma medida principalmente para a classe média. É preciso destacar isso. A classe operária, em sua maioria, continuou trabalhando, quem pôde. Nós vimos aí o comércio, os serviços, o transporte lotado. Não houve nenhuma medida efetiva de garantir que no transporte público, por exemplo, não houvesse uma contaminação em massa. 

A esquerda se colocou de quarentena, ao invés de organizar a mobilização dos trabalhadores para exigir atendimento, investimentos e denunciar o caráter reacionário desses setores da direita, como é o caso do Covas, de alguns setores da esquerda

O único interesse desses setores é defender o interesse dos bancos que no Brasil e no mundo inteiro quer que reabra tudo. Quanto mais rápido reabrir tudo, melhor. Essa é uma política criminosa, nós estamos vendo o resultado disso no Brasil e também no exterior, onde países que retomaram a iniciativa de reabrir, como é o caso da Espanha, estão batendo novos recordes de casos. 

A única maneira de superar isso e não fazer demagogia é através da mobilização popular. É preciso levantar as organizações populares, os sindicatos que estão fechados, que adotaram uma política criminosa de se colocarem em quarentena quando os trabalhadores mais precisavam. Na greve dos Correios, em São Paulo, o maior sindicato do país, que é dos Correios e dirigido pelo PCdoB, estava com as suas portas fechadas, quando os trabalhadores iam trabalhar todos os dias. 

A esquerda se colocou de quarentena, ao invés de organizar a mobilização dos trabalhadores para exigir atendimento, investimentos e denunciar o caráter reacionário desses setores da direita, como é o caso do Covas, de alguns setores da esquerda.

Em entrevista recente ao Brasil de Fato, o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, que trabalhou no Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), afirmou que um novo sindicato precisa ser construído para que os trabalhadores de aplicativo, por exemplo, se sintam representados. Ele se referia às manifestações de trabalhadores de aplicativos que se colocam como apartidários e sem nenhuma ligação com o movimento sindical. Nessa mesma linha, o partido do senhor se apresenta como “verdadeiramente revolucionário e comunista, por um governo dos trabalhadores, por um Estado operário”. Se eleito, como prefeito de São Paulo pelo PCO, qual é o projeto do senhor para diminuir o impacto da uberização do trabalho para os paulistanos?

Política de uberização, pejotização... No Brasil, desde a Reforma Trabalhista, mais de oito milhões de pessoas foram obrigadas a abrir um CNPJ para passarem por microempreendedores, quando na realidade foram submetidos a uma situação de maior escravização.

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As organizações dos trabalhadores abandonaram uma perspectiva de unificação dos trabalhadores diante dessa luta e até de reivindicar direitos fundamentais diante da crise, como a redução da jornada de trabalho para 35 horas semanais, o que permitiria a geração de milhões de novos empregos.

É preciso dissolver o aparato repressivo e apoiar a mobilização dos trabalhadores, e não vender ilusões, como faz a direita

Não há uma política de mobilização dos desempregados. Em muitos dos casos, os sindicatos se lançaram em uma política de colaboração com as empresas capitalistas em crise, firmando acordos pela redução do trabalho, com redução dos salários, e até mesmo aceitando demissões, como nós estamos vendo agora no caso da Volkswagen, que anunciou cinco mil demissões dos seus funcionários aqui no Brasil. 

É preciso reverter essa política, e o único caminho é através da mobilização dos trabalhadores das suas próprias organizações. Nós que militamos no interior da CUT (Central Única dos Trabalhadores), colocamos a necessidade de discutir no interior dos sindicatos uma perspectiva de mobilização dos trabalhadores, empregados e desempregados.

É preciso lutar pela redução da jornada de trabalho, abrir uma verdadeira mobilização dos trabalhadores contra a privatização, como as que o Doria, apoiado pelo Covas, está tentando impor nesse momento em São Paulo, com o PL 529. É preciso dissolver o aparato repressivo e apoiar a mobilização dos trabalhadores, e não vender ilusões, como faz a direita.

A gestão do Fernando Haddad (PT), entre 2013 e 2016, terminou, e os empresários do setor mantiveram o lucro de 18%, o que supera, inclusive, a legislação que regula o setor. Os usuários pagam valores cada vez maiores nas passagens. Quais suas propostas para o setor? O senhor pretende mexer no lucro das empresas?

Na área do transporte, como em todas as outras questões, nós do PCO vamos dizer que é preciso estatizar o transporte. Isso só pode ser constituído através da mobilização popular, que é preciso lutar contra o retrocesso da organização dos trabalhadores, que se dá desde quando a Luiza Erundina (prefeita paulistana entre 1989 e 1993, atual candidata a vice pelo PSOL) derrotou a greve dos rodoviários (em 1992), foi para a televisão dizer que ia demitir quem estava em greve e abriu caminho para que a maior empresa estatal do país, em número de trabalhadores, a CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos), fosse privatizada no governo Maluf (entre 1993 e 1997).

Nós precisamos de setores da esquerda que defendam a organização dos trabalhadores, que não ataquem os trabalhadores e depois procurem se passar como aliados da esquerda. 

Nós temos uma única proposta concreta que é não mentir para a população, que é dizer da necessidade de estatização do transporte público, sob o controle dos trabalhadores. Nós vamos ter candidatos da esquerda que nunca participaram da mobilização, que fizeram acordo com a PM (Polícia Militar) para proibir a mobilização pelo "Fora, Bolsonaro" na Avenida Paulista, agora dizendo que são lutadores.

No município de São Paulo, os paulistanos têm 16 opções de candidatos para escolher nos dias 15 e 29 de novembro, quando serão realizados o primeiro e segundo turno, respectivamente, das eleições municipais em todo o país. São eles Andrea Matarazzo (PSD), Arthur Do Val (Patriota), Antônio Carlos Silva (PCO), Bruno Covas (PSDB), Celso Russomanno (Republicanos), Felipe Sabará (NOVO), Guilherme Boulos (PSOL), Jilmar Tatto (PT), Joice Hasselmann (PSL), Levi Fidelix (PRTB), Márcio França (PSB), Marcos da Costa (PTB), Marina Helou (Rede Sustentabilidade), Orlando Silva (PCdoB), Vera Lúcia (PSTU) e Vivian Mendes (UP). O Brasil de Fato entrou em contato com as assessorias de todos candidatos e todas candidatas.

Edição: Leandro Melito e Rogério Jordão