Banho Maria

Alcolumbre mantém indicação de André Mendonça ao STF em fogo baixo

Nome “terrivelmente evangélico” indicado por Bolsonaro ao STF encontra resistências no Senado e na própria Corte

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No STF, os ministros evitam se pronunciar sobre o impasse - Agência Senado

Termina na próxima semana o prazo de 10 dias úteis dado pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, para que o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) se manifeste sobre a sabatina do “terrivelmente evangélico” André Mendonça para a vaga deixada por Marco Aurélio Mello na Corte. O ex-advogado-geral da União foi indicado ao posto por Jair Bolsonaro em 13 de julho. Desde então, sendo presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Alcolumbre tem feito o que pode para evitar marcar a sabatina.

O senador tem sido evasivo e evita explicações sobre a recusa em definir uma data. Na semana passada, após muitas cobranças, ele encontrou um pretexto mais claro. Usou o próprio despacho de Lewandoswski para postergar o caso um pouco mais. “Agora está sub judice, não posso me manifestar. Fiquem tranquilos, vamos decidir. Mas não posso me manifestar porque agora judicializou”, afirmou à imprensa.

O caso foi parar no STF com o mandado de segurança 38216, impetrado pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jorge Kajuru (Podemos-GO), que pediram para que o tribunal imponha uma definição a Alcolumbre. Mas a iniciativa dos parlamentares parece ter provocado o efeito contrário do que supostamente pretendiam. Já há avaliações de que essa definição pode se arrastar até novembro.

Aras x “terrivelmente evangélico”

Enquanto isso, o procurador-geral da República, Augusto Aras, que foi reconduzido ao cargo, silenciosamente alimenta a ambição de ser o indicado. Ele tem a preferência de boa parte dos senadores por ser opositor da Lava Jato. Embora a operação tenha sido virtualmente sepultada após o julgamento do STF que declarou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro, as posições de André Mendonça favoráveis à operação de Curitiba assusta parlamentares. Seja por mero corporativismo, seja por temerem um futuro ministro lavajatista (e portanto punitivista) na mais alta corte do país.

Bolsonaro parece determinado a cumprir a promessa a seus seguidores de colocar um nome “terrivelmente evangélico” no STF. Declarou a uma rádio, no início da semana, que se não for André Mendonça, “no meu compromisso (sic) que eu fiz junto aos evangélicos, será outro evangélico”. O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, corria por fora até antes da CPI da Covid, mas por ser próximo do relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), ficou longe do cargo.

Apesar disso, Martins teria o apoio suficiente para ser aprovado numa sabatina se for indicado e ainda trabalha nos bastidores. Ele é ligado à Igreja Adventista do Sétimo Dia, mas não é considerado “terrivelmente evangélico” pelo bolsonarismo.

“A palavra do crente tem poder”

No STF, os ministros evitam se pronunciar sobre o impasse. Mas o perfil do ex-AGU incomoda muito alguns deles. Ao mesmo tempo que é autor de livros na área do Direito, Mendonça é visto pregando a “palavra de Deus” em vários vídeos na internet. Como, por exemplo, um vídeo divulgado em página da Assembleia de Deus de Goiânia no ano passado. Na publicação, o pastor Mendonça profere um sermão no qual diz que “a palavra do crente tem poder, a oração do cristão tem poder”. Até o momento, ele segue aguardando o atendimento às suas preces por uma vaga no Supremo.

Como ministro da Justiça, Mendonça também acionou a Polícia Federal e a Lei de Segurança Nacional contra críticos de Bolsonaro. A lembrança do episódio desagrada ministros garantistas do STF. Essas medidas do “terrivelmente evangélico” são objeto de apuração preliminar em andamento na Procuradoria-Geral da República que corre em sigilo.

Já o ministro que Bolsonaro conseguiu emplacar no STF, Kassio Nunes Marques, não é “terrivelmente evangélico”, mas tem sido fiel a seu padrinho. Já foram várias decisões, em votos algumas vezes considerados mal fundamentados, de acordo com os interesses do governo. Além, por exemplo, de decidir em favor da tese do marco temporal contra os povos indígenas e a favor dos ruralistas, Nunes Marques já contemplou até mesmo o negacionismo do presidente durante a pandemia.