TRAMOIA

Oposição da Venezuela propôs suspender denúncia na Corte de Haia em troca de cargo

Áudio mostra assessor de Guaidó fazendo proposta durante Mesa de Diálogo

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |

Ouça o áudio:

Freddy Guevara é um dos principais representantes de Juan Guaidó na Mesa de Diálogo Nacional com o governo da Venezuela - Cristina Hernández / AFP

A oposição venezuelana estaria negociando suspender suas denúncias no Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o presidente Nicolás Maduro em troca de um cargo no Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). O portal de notícias PanamPost divulgou um áudio de uma das reuniões prévias às últimas rodadas da Mesa de Diálogo, na qual Freddy Guevara, um dos representantes opositores mais próximos a Juan Guaidó, assegura que o TPI é um tribunal político e que ele estaria "disposto a negociar tudo, mas em troca de coisas boas."

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Para o editor-chefe do portal Misión Verdad, Ernesto Cazal, o áudio comprova os objetivos da oposição com a denúncia no TPI. "Poderia ser considerada uma espécie de confissão de Freddy Guevara de que há uma intenção política por detrás do discurso de direitos humanos."

A reunião teria acontecido em setembro, antes da segunda rodada de negociação na cidade do México entre o governo de Maduro e a oposição. O encontro realizado no dia 24 de setembro tinha como tema de discussão aspectos jurídicos. 

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De acordo com a publicação, os opositores almejavam negociar uma indicação de magistrado para o Tribunal Supremo de Justiça, a maior instância do judiciário no país. A presença no TSJ seria estratégica para a oposição, já que somente Guaidó possui mais de 20 processos abertos pelo Ministério Público venezuelano.

"Uma declaração política nossa pode atrasar ou adiantar o processo. Nesse sentido, se damos qualquer pequeno sinal poderíamos estar lhes fazendo um favor, então temos que cobrar caro", declarou Guevara na reunião.

Em suas redes sociais, Guevara afirmou que o áudio foi manipulado e ainda acusa o meio de comunicação de buscar manipular os fatos à favor do chavismo.

No entanto, o PanamPost , com sede em Miami (EUA, é um meio que se autointitula como liberal. 

"PanamPost não está de acordo com a mesa de diálogo e é favorável às sanções, assim como a uma invasão militar contra a Venezuela. Por serem tão extremistas têm sentido que saiam com um ataque como esse", analisa Ernesto Cazal.

Processos na CPI

Em 2018, a oposição vinculada a Guaidó apresentou o Caso Venezuela I à Corte de Haia, o TPI, acusando o governo de Nicolás Maduro de cometer violações aos direitos humanos, como prisões políticas, tortura e perseguição de opositores.

Em agosto deste ano, a ex-procuradora da Corte, Fatou Bensouda, que deixou o cargo em 15 de junho, referendou um informe preliminar que acusava o governo bolivariano de cometer crimes de lesa-humanidade contra a população venezuelana. 

Agora o caso está nas mãos do novo procurador, Karim Khan, que chegou a Caracas na última segunda-feira (1º) para reunir-se com o presidente Nicolás Maduro e o procurador geral da República, Tarek William Saab. 

A viagem faz parte dos ofícios de investigação dos dois processos relacionados à Venezuela que tramitam no TPI, o primeiro apresentado pela oposição e o segundo pelo governo, acusando os Estados Unidos de crimes de lesa humanidade por conta do bloqueio econômico. Khan afirmou, nesta quarta-feira (3), que o caso Venezuela I passa à fase de invetsigação. Maduro disse não concordar, mas assinou um memorando de entendimento com o Tribunal, garantindo cooperação das instituições venezuelanas. 


O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro e o procurador geral da Corte Penal Internacional, Karim Khan assinaram um memorando de entendimento nesta quarta-feira (3) / Prensa Presidencial

Quem é Freddy Guevara?

Freddy Guevara é um considerado um dos assessores mais próximos do autoproclamado presidente Juan Guaidó, sendo fundador do partido Vontade Popular. Foi eleito deputado em 2015 pela Mesa de Unidade Democrática (MUD), aliança que reuniu 33 partidos opositores e obteve a maioria das cadeiras do Legislativo.

Em duas ocasiões Guevara foi preso por coordenar atividades desestabilizadoras. A primeira foi em 2017, logo após as guarimbas - atos violentos opositores - que terminaram com um saldo de 163 mortos. A segunda detenção aconteceu em julho deste ano, quando Guevara foi acusado de articular um atentado com drones contra o presidente Maduro, que seria realizado durante a celebração dos 200 anos da Batalha de Carabobo, em 24 de junho.

Saiba mais: Entenda os fatores que levaram Guaidó a propor um acordo nacional na Venezuela

Freddy Guevara recebeu indulto presidencial em ambas prisões, como parte das negociações com opositores. Logo após ser liberado, em agosto deste ano, Guevara foi indicado como um dos representantes do bloco opositor na Mesa de Diálogo Nacional.

No mesmo áudio divulgado pelo portal PanamPost, Guevara também declara "no atual contexto não podemos ir por algo intermediário, mas por algo que realmente nos sirva, porque o que haveria que entregar tem implicações muito grandes".

"Esse setor extremista quer participar de maneira velada na Mesa de Diálogo para obter mais poder político. No entanto eles não querem ser vistos como colaboracionistas do 'regime', como eles dizem", comenta Cazal.

Edição: Thales Schmidt