Saúde

Alergia alimentar: direito à informação nos rótulos avançou, mas outros desafios permanecem

Em restaurantes, cantinas das escolas e padarias ainda não é obrigatório a informação de alergênicos

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Segundo a Alergia Alimentar Brasil estima-se que 6% das crianças e 3,5 % dos adultos brasileiros têm alergias alimentares. - Agência Brasil
Famílias reivindicam que haja mais lugares seguros e inclusivos e a sociedade deve estar preparada

Você sabe o motivo da inclusão de alertas sobre a presença de alergênicos ou de traços desses alimentos nos rótulos de produtos nas prateleiras? 

A obrigatoriedade da informação é fruto da luta de um grupo de mães de filhos alérgicos, que se mobilizaram a partir de 2014.  Foi daí que surgiu a campanha “Põe no Rótulo'', que reuniu mais de 700 famílias que cobraram a transparência dessas informações nas embalagens.

Após dois anos de mobilização social, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mudou a legislação brasileira e tornou obrigatório o alerta sobre a presença ou risco dos principais alergênicos nas embalagens dos alimentos industrializados. 

Uma dessas mães é a advogada Cecilia Cury, que ao lado de Fernanda Mainier e Ana Maria Mello, lidera as iniciativas Põe no Rótulo e Alergia Alimentar Brasil. Ela fala que desde 2016, com a mudança nas leis, o número de relatos de reações alérgicas e dúvidas sobre a segurança dos alimentos vendidos nos supermercados caiu drasticamente. 

“Surgem alguns relatos ainda, associados a uma leitura superficial do rótulo ou de produtos que mudaram a sua fórmula, mas que a pessoa tinha expectativa de que o produto contivesse ainda mesma composição e foi alterada, no mais das vezes as reações caíram sensivelmente”, explica Cury, reforçando que é importante priorizar a leitura da lista de ingredientes e a informação para alérgicos nos rótulos. 

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Alergia e rotinas

A alergia alimentar pode aparecer em qualquer idade. Cecília descobriu durante a amamentação que seu filho, Rafael, de 2 meses, tinha alergia a leite e a soja. Ela explica que após o diagnóstico a dinâmica da família mudou. 

"O diagnóstico de alergia alimentar de uma criança traz impactos na hora das compras, na hora de ir a restaurantes, no ambiente escolar, em viagens, ou em uma internação hospitalar”, elenca Cury. 

Alimentos e reações

Qualquer alimento pode causar uma reação alérgica, mas cerca de 90% das reações são causadas por: leite, soja, ovo, trigo, amendoim, castanhas (amêndoa, avelã, castanha de caju, castanha do Brasil, macadâmia, noz, pecã, pistache, pinoli ou castanha), peixes e crustáceos

Segundo a Alergia Alimentar Brasil, estima-se que 6% das crianças e 3,5 % dos adultos brasileiros têm alergias alimentares. O número de casos deste tipo de alergias vem crescendo e se tornando mais persistentes, havendo casos de adolescentes e adultos com alergia a alimentos que eram mais comuns na primeira infância, como leite, ovo e trigo. 

Diagnóstico

O diagnóstico é feito por um alergista e os sintomas mais comuns são: tosse, falta de ar; dor abdominal, náusea, diarréia; urticária e placas vermelhas na pele; inchaço na boca e olhos; queda de pressão e tontura. 

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O processo para diagnóstico da alergia alimentar é longo. O relato de Juliana Kramer representa os obstáculos que muitas mães têm quando para descobrir a alergia alimentar na primeira infância. Ela descobriu quando Guilherme tinha seis meses durante a introdução alimentar. 

“Ele já tinha uma questão de ganho de peso e sangue nas fezes. A primeira hipótese foi alergia a leite, fiz a dieta sem traços de leite, porque alimentação dele era leite materno, mas mesmo fazendo testes ele não teve melhora dos sintomas e foi difícil chegar no diagnóstico de que era alergia a castanha.”, explica a mãe do Guilherme.

Novos passos

A iniciativa Põe no Rótulo segue trabalhando por avanços na rotulagem de alergênicos, considerando as dificuldades das pessoas que apresentam alergia se alimentar fora de casa. 

“Se tivemos um avanço em relação à rotulagem de alimentos [industrializados], paramos por aí. Alimentos vendidos em restaurantes, padarias e cantinas da escola não são obrigados a informar no cardápio sobre a presença  dos principais alergênicos, nem padarias, nem nos medicamentos ou cosméticos tem alerta para alérgicos. Temos pedido à Anvisa para que isso se estenda para os outros produtos sob o olhar dela, mas ainda não foi possível.”

Dicas

A dica de Cecília Cury é sempre procurar quem preparou o alimento seja a merendeira da escola ou para o chef de cozinha do restaurante e perguntar sobre os ingredientes daquela refeição. Se os rótulos apresentarem traços, o conselho de Cecília é avaliar se vale a pena o consumo, pois a reação alérgica pode ser severa em alguns casos. 

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Preconceito

Juliana Kramer é nutricionista infantil e diz que uma das barreiras é o preconceito. Ela comenta que Guilherme tem 7 anos e já sabe identificar os produtos, mas há dificuldade para comer na rua. Para ela um dos desafios ainda é a conscientização e inclusão dos alérgicos. 

“Algumas pessoas ainda acham que é frescura, não sabem que uma quantidade ínfima do produto pode levar o alérgico a óbito. O principal desafio é a inclusão desses alérgicos em diferentes espaços”, desabafa. 

Segundo a representante do Põe do Rótulo, de um lado as famílias reivindicam que haja mais lugares seguros e inclusivos, mas de outro a sociedade precisa estar cada vez mais preparada para acolher e ser parceira nestes ambientes mais seguros. 

Edição: Daniel Lamir