Reação

Em um mês, MST na Bahia responde a despejos com três reocupações de fazendas

Depois de remoções forçadas, famílias sem teto voltam e reconstroem acampamentos em Piritiba, Itaetê e Guaratinga

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Famílias do Acampamento Rosimeire Araújo, em Piritiba (BA), começam a reconstrução do que o despejo destruiu - MST-BA

Em tempos de fome e de meio milhão de pessoas vivendo na iminência de serem removidas à força de suas casas, famílias sem terra na Bahia resolveram que, simplesmente, não ficariam na beira da estrada. Entre julho e agosto, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em três municípios baianos, reocupou fazendas dias depois do despejo. 

A ação mais recente foi em Piritiba (BA), por volta das 12h da última sexta-feira (19). Cerca de 50 famílias haviam sofrido uma reintegração de posse na segunda-feira (15). Passados cinco dias, no entanto, ocuparam uma vez mais a fazenda Várzea da Pedra. 

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Organizados por meio da Brigada Dorothy, da regional Chapada Diamantina do MST, agora as famílias se dedicam, em mutirão, a reerguer os barracos e as roças de alimentos agroecológicos que produziam. Milho, feijão, abóbora e quiabo são algumas das culturas cultivadas na área, batizada pelos ocupantes de Acampamento Rosimeire Araújo.  

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Ali perto, na cidade de Itaetê (BA), uma ação parecida aconteceu no último 29 de julho. Já fazia quase um mês desde que, no dia 1° de junho, cerca de 250 famílias haviam sido colocadas na rua quando se organizaram para ocupar, uma vez mais, o latifúndio improdutivo da fazenda Dois Rios. “As famílias não tinham para onde ir”, descreve o MST em nota.  

A decisão de voltar para a área da antiga fazenda, nomeada de Acampamento Antônio Maero, aconteceu mesmo depois de ataques e ameaças de pistoleiros. Em maio, durante a madrugada do dia 4, oito homens encapuzados entraram no acampamento e atiraram contra alguns barracos. Ninguém se feriu e um boletim de ocorrência foi registrado.  

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“Nosso povo resiste na área. Pior não é o medo dos fazendeiros. Pior é a fome que está batendo na porta de todo mundo aqui. O povo não tem para onde ir e prefere morrer do que sair da terra”, afirmou, na ocasião, Abraão Brito, articulador político do MST na Chapada Diamantina. 

É o que motivou, provavelmente, outras 150 famílias a também reocuparem uma fazenda, ainda na Bahia mas distante dali, no extremo Sul do estado. No município de Guaratinga (BA), a fazenda Mata Verde foi retomada no último 21 de julho.  

Durante a semana que separou o despejo da reocupação, as famílias sem teto ficaram em barracos de lona improvisados, sob chuva, na beira da estrada do Córrego do Ouro, a cerca de cinco quilômetros da fazenda.    

E resolveram voltar para o terreno que constituíram como casa desde que ali entraram, em 2 de abril, no âmbito da Jornada Nacional do MST, o chamado “abril vermelho”. Não é a primeira vez que essas famílias são removidas à força da área de 2.160 hectares que nomearam de Acampamento Cláudia Sena. Já foram dois despejos. E dois retornos.  

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Apreensão 

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, por conta da pandemia de covid-19, que as remoções forçadas estão proibidas no Brasil até 31 de outubro. A decisão, no entanto, só vale para ocupações feitas antes do início da pandemia. Por isso que, a despeito de estarem sob a mesma crise sanitária que o resto da população, nenhum destes três acampamentos foi protegido pela liminar. 

A medida garante segurança para 142.385 mil famílias que estão, no momento, ameaçadas de despejo.

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A data 31 de outubro é resultado de uma avaliação do ministro do STF Luís Roberto Barroso. Em julho ele prorrogou, mais uma vez, o impedimento de ações de despejo. Desde 2021 o membro da suprema corte é o responsável por avaliar o alongamento da decisão. Originalmente, a medida foi aprovada em 2020 pelo STF, e, desde então, vem sendo, sistematicamente, renovada, sempre próximo ao prazo de vencimento.

O levantamento da Campanha Despejo Zero aponta que entre março de 2020 e o ano de 2022 houve um aumento de 655% no número de famílias ameaçadas de serem removidas à força de suas casas.

Edição: Lucas Weber