Operação política

Cristina Kirchner recusa juíza do caso de magnicídio por não investigar deputado macrista

Vice-presidenta aponta contra o "partido judicial", que estaria encobrindo políticos opositores envolvidos no caso

Brasil de Fato | Buenos Aires, Argentina |
Maria Eugenia Capuchetti, juíza responsável pelo caso do atentado contra Cristina Kircher. - Reprodução

A vice-presidenta argentina Cristina Kirchner anunciou nesta quinta-feira (10) que recusará a juíza federal María Eugenia Capuchetti como responsável pela investigação do atentado que sofreu no dia 1º de setembro, em frente à sua casa.

A notícia foi publicada nas redes sociais da vice, acompanhado de um vídeo explicativo sobre o pedido. “Pelos motivos que vão ver e escutar, instruí os meus advogados a recusar à juíza Maria Eugenia Capuchetti”, escreveu CFK. O vídeo repassa os últimos detalhes do caso. 

A decisão de Cristina foi motivada especialmente pela última pista do caso, que conecta uma nova figura ao atentado: o deputado Gerardo Milman, do Proposta Republicana (PRO), partido do ex-presidente Mauricio Macri e oposição ao kirchnerismo. Além disso, Milman foi vice-ministro de Patricia Bullrich, ministra de Segurança do governo de Macri, e líder da ala radical da coalizão. Há indícios de que Milman poderia saber do plano para assassinar a vice-presidenta dias antes do atentado concretizar-se. No entanto, ele nunca foi intimado por Capuchetti para prestar declarações.

No dia 27 de outubro, quase dois meses após o atentado, um assessor legislativo da Frente de Todos, coalizão governista, prestou declarações à Capuchetti e relacionou o deputado Gerardo Milman ao caso. Em seu testemunho, diz que o deputado estava no café Casablanca, em frente ao Congresso, acompanhado de duas assessoras, no dia 30 de agosto, dois dias antes do atentado. A testemunha diz ter escutado Milman dizer, entre risadas: “quando a matem, vou estar a caminho da costa”, referindo-se à zona de praias da província de Buenos Aires.

O vídeo resgata as comprovações da própria investigação. Milman estava no café, no dia e local indicados pela testemunha, assim como as duas mulheres que o acompanhavam. Imagens de câmeras do local confirmam a informação. No dia seguinte, 31, Milman viajou ao litoral argentino, e no dia 1º, ocorre a tentativa de assassinato contra Cristina.

“Quando as assessoras de Milman declararam no caso, primeiro negaram a reunião e sua presença na Casablanca, até que mostraram a elas suas imagens entrando e saindo do café. Só então, admitiram que a reunião existiu”, denuncia o vídeo.

“Apesar de que a declaração foi dada sob juramento, mentindo, a juíza Capuchetti não tomou nenhuma medida para continuar investigando”, continua. “Milman ainda não foi intimado a prestar depoimento.”

Outro ponto resgatado pela denúncia publicada por CFK é um misterioso projeto de declaração apresentado por Milman no dia 18 de agosto. No documento, alertava sobre a possibilidade de que um “iluminado” pudesse atentar contra Cristina Kirchner. “Sem Cristina, há peronismo. Sem peronismo, segue havendo Argentina”, conclui o texto do projeto.

Conexões

Quem assina a declaração junto a Milman é o deputado da mesma coalizão, Francisco Sánchez, adepto à narrativa “anticomunismo” e um dos políticos que receberam o deputado Eduardo Bolsonaro em Buenos Aires, em um encontro entre figuras da extrema direita argentina. Dias antes do atentado, Sánchez publicou em sua rede social um pedido de pena de morte contra Cristina Kirchner.

Uma das mulheres que acompanhavam Milman no café é Carolina Gómez Monaco. Como ressalta o vídeo de CFK, Carolina foi Miss Argentina em 2012 e, em 2017, foi designada por Milman como Diretora da Escola de Inteligência Criminal da Argentina.

Em uma de suas empresas, a assessora de Milman é sócia de María Mroue, uma apresentadora da emissora Crónica TV. Foi nesse canal que o casal detido pela tentativa e planejamento do assassinato de Cristina Kirchner apareceu pela primeira vez em cena, semanas antes do atentado. Fernando Sabag Montiel e Brenda Uliarte participaram, na ocasião, de uma enquete na rua sobre se os auxílios sociais deveriam existir ou não.

"Quando apareceram as primeiras provas que envolvem a política com o ataque, a juíza Capuchetti paralisou e boicotou a investigação", denuncia o vídeo publicado por CFK. "É evidente que o partido judicial não quer a Cristina como vítima, a quer presa ou morta."

Outros movimentos prévios colocam em cheque a responsabilidade de Capuchetti no caso do atentado contra CFK. Um deles foi a decisão de não unir as investigações do atentado e a do grupo extremo Revolución Federal, cujos integrantes declararam publicamente o desejo de assassinar a vice-presidenta e figuras do campo progressista argentino. O foco do caso nos suspeitos mais expostos, em geral jovens pobres que reproduzem com virulência o discurso de ódio contra pautas e figuras progressistas e do campo popular, tem alimentado na opinião pública a perspectiva de se tratariam de figuras isoladas ou "loucas".

Edição: Thales Schmidt