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Bretas 'feriu de morte' o devido processo legal; especialistas comentam afastamento de juiz

Conselho Nacional de Justiça retirou carioca Marcelo Bretas do cargo de juiz federal em nova derrota do lavajatismo

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Marcelo Bretas copiou práticas ilegais de Sergio Moro, que "destroem o processo penal", segundo juristas - Agência Brasil

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afastou, na última terça-feira (28), o juiz federal Marcelo Bretas do cargo por supostos desvios de conduta. Bretas é conhecido por ser responsável pelas decisões da Lava Jato do Rio de Janeiro, mas agora responde a três processos administrativos no CNJ. A decisão foi tomada a portas fechadas e os detalhes dos processos não foram divulgados.

"Usando a toga para fazer política"

O advogado José Augusto Marcondes de Moura Júnior, que atuou em processo da Lava Jato no Rio, em declaração ao Brasil de Fato, criticou a conduta de Marcelo Bretas à frente da operação, citando especificamente o uso político da Justiça e a relação com o Ministério Público Federal. Segundo o advogado, a postura de Bretas era "assustadora" e "incompatível para um juiz", uma vez que ele estaria "usando a toga para fazer política".

"Desde o início, eu sempre disse que o uso da toga para fazer política e a relação umbilical dele com o MPF são assustadoras. Quando um juiz troca a toga pelo microfone, ele deve ser afastado, pois isso fere de morte o devido processo legal. As atitudes dele são incompatíveis com as de um juiz. Com juízes assim, como Bretas e Sergio Moro, a Justiça está de luto", declarou. José Augusto Marcondes de Moura Júnior reforçou as semelhanças entre Bretas e Moro: "A verdade é uma só, quando a toga toca o ombro deles, a Justiça está de luto".

"Autopromoção"

Já o advogado Fábio Ricardo Mendes Figueiredo diz que "o CNJ fez seu papel coibindo abusos e a advocacia saiu fortalecida".

"Ele é midiático, sou contra juízes que buscam a autopromoção e com cunho político-partidário", diz Figueiredo, que lembrou de episódio em que Bretas chegou a emitir um mandato de prisão contra o ex-presidente do Paraguai, Horacio Cartes, em 2019. A ordem foi revogada na sequencia por outro juiz, alegando que a argumentação usada por Bretas havia sido "genérica".

"Avanço democrático"

"A Lava Jato foi um processo muito mais político do que jurídico, que buscava de fato perseguir pessoas e não apurar possíveis crimes. Isso ficou claro na atuação do ex-juiz Sérgio Moro, que hoje é deputado federal, mas também pela atuação do Bretas" diz o advogado André Lozano.

Ele concorda que "Bretas também teve uma atuação voltada pra para um processo penal do espetáculo, midiático". 

Lozano acredita que processos assim são negativos porque eles costumam buscar apenas a punição, "retirando as garantias dos acusados, o direito a defesa, ao contraditório e buscando uma condenação o mais rápido possível de determinados agentes políticos".

O advogado ressalta que a Lava Jato foi essencialmente negativa por ter dado início à tentativa de "desconstrução da democracia brasileira", prestou ajuda ao governo de Jair Bolsonaro e teve reflexos econômicos. 

É possível cogitar, segundo ele, que "a Lava Jato tenha  ocorrido por interesses externos ao Brasil, econômicos". Lozano lembra que a operação acabou prejudicando empresas brasileiras, coisa que não acontece em investigações de corrupção de outros países.  

"Quando a gente fala dessas diversas anulações ocorridas na Lava Jato e do afastamento dos juízes que utilizavam da mídia pra inclusive pra promoção pessoal, nós estamos diante de um grande avanço democrático. O Brasil está voltando aos trilhos da democracia." 

"Tão nocivo quanto Sergio Moro"

Bretas ganhou destaque por ter condenado o ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, a penas que somam mais de 400 anos de prisão, além de ter mandado para a cadeia diversos políticos e empresários envolvidos em casos de corrupção. Entretanto, sua atuação sempre foi questionada por especialistas, que apontam para a falta de imparcialidade e legalidade em suas decisões.

O escritor Milton Alves, autor do livro "Lava Jato: uma conspiração contra o Brasil", comentou, a pedido do Brasil de Fato, a ação do CNJ que afastou o juiz Marcelo Bretas. Segundo ele, o processo é mais uma forma de conter os abusos de uma corrente política dentro do Poder Judiciário, expressão que ele usa para definir a operação Lava Jato.

"Acredito que o CNJ e também o Supremo Tribunal Federal, o STF, começaram a tomar medidas para conter a Lava Jato. Esse segmento do Judiciário causou grandes problemas para a justiça, para a magistratura e para o país. Basta ver o exemplo da prisão arbitrária e perseguição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva", declarou.

Para Alves, Bretas atropelou diversos processos e agiu de forma midiática, contando com o apoio de grandes órgãos de comunicação como a Rede Globo para suas ações, muitas vezes atropelando o Poder Judiciário e o devido processo legal. Ele defende que é preciso punir todos os desvios e afastar o juiz federal, assim como Moro, que abandonou a magistratura para se tornar político.

"Eles [Bretas e Moro] usam a toga para fazer política partidária, divulgar uma opinião reacionária e conservadora contra o próprio estado de direito e a democracia. O Bretas é tão nocivo quanto Moro", disse.

Em setembro de 2020, o Brasil de Fato mostrou como as investidas da Lava Jato contra o escritório do advogado Cristiano Zanin, autorizadas por Bretas, chamaram a atenção de juristas pela forma autoritária e distante da legalidade com que manipularam as atividades investigatórias das instituições públicas e as normas e garantias previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal.

Edição: Rodrigo Durão Coelho