Luta pela educação

Força popular é motor para reconstrução da escola Eduardo Galeano no Quilombo Campo Grande

Espaço foi destruído durante uma reintegração de posse que aconteceu a pedido do suposto proprietário da área

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Formação educacional de trabalhadores rurais era um dos principais projetos da Escola Eduardo Galeano - MST
Todo mundo quer vir, falar assim: eu também coloquei um tijolinho na construção dessa escola

De tijolo em tijolo, a Escola Eduardo Galeano começa a ser reerguida no Quilombo Campo Grande, localizado no sul de Minas Gerais. O projeto é resultado de uma grande campanha de arrecadação de recursos para reconstruir o espaço, que terá salas para educação infantil, secretaria e biblioteca, além de alojamentos e áreas para o curso de agroecologia. 

A obra apresentada pela professora de ciências Rosa Helena Gonçalves dos Santos marca o reinício de um projeto popular de educação emancipadora e agroecológica depois que a escola foi demolida pelo governo Zema em 2020, durante a pandemia da covid-19. 

"Nós vamos fazendo aos poucos, sabemos que temos muitos parceiros que estão juntos e assim, pessoas que às vezes nem nunca mexeram com tijolo já vieram aqui doar o tempo, trabalhando, mexendo com massa. E aí nós estamos fazendo também esse trabalho, chamando nosso povo, todo mundo quer vir, fazer parte, falar assim 'eu também coloquei um tijolinho na construção dessa escola'", diz Rosa.  

O centro educacional foi derrubado durante uma reintegração de posse que aconteceu a pedido do suposto proprietário da área da falida Usina Ariadnópolis, onde ficava a escola. Foram mais de 56 horas de ação policial no local. Além da escola, 14 famílias perderam suas casas. 

A escola Eduardo Galeano funcionava desde 2015. Nela estudaram centenas de pessoas, entre jovens e adultos, que aprenderam a ler e a escrever. Entre elas estão os aposentados João de Araújo e Clarisse Araújo. O casal, que vive há mais de dez anos no acampamento Sidney Dias, dentro do Quilombo Campo Grande, concluiu o ensino fundamental em 2019.  

"Aí teve esses tropeços e derrubaram a nossa escola do campo, aí foi um transtorno. Avião, helicóptero da polícia em cima de você e jogando bomba e tirando tudo. E maquinário, tirando a escola, a gente chorava. Aí o avião vinha e eu pegava a carriola e colocava na cabeça pra me proteger. E o vento parecendo que ia derrubar a gente, do helicóptero", relata Araújo. 

"Eu fui o primeiro dia e fiquei ajudando a moça da merenda na cozinha, aí quando foi o outro dia eu voltei pra escola e falei: 'escuta, eu vim aqui pra ficar na merenda? Não, eu vou estudar'. Falei: 'eu posso ficar aqui com vocês um pouquinho na classe?' Aí ela falou, pode, aí eu falei: 'agora eu vou estudar'", conta Clarisse. 

"Comecei a ter aquelas ideias de estudar e tinha a dona Ricarda. Ela trabalhava no Setor de Educação e abria o horizonte pra gente, idoso, que no meu caso eu já estava idoso.'‘Você vai voltar a estudar, você vai voltar a estudar porque é bom', dizia ela. Aí eu comecei a ter vontade de estudar. Mas pro banco da escola eu ainda quero voltar, se deus me der a licença, ainda quero estudar aqui, se ela vir com o colegial, aí eu faço o colegial aqui", promete Araújo. 

Ricarda Maria Gonçalves da Costa, citada por Seu José, vive há 21 anos no acampamento. Ela esteve desde o início nos projetos de educação do Quilombo Campo Grande, no começo dos anos 2000, e deu aulas para dezenas de pessoas. 

"Nós começamos o setor de educação, a fazer as propostas e nessa veio um projeto, projeto Pronera, que era para acampados e assentados da reforma agrária. Nós nos inscrevemos, deu certo e começamos, além de estar no Setor de Educação, a dar as aulas para os companheiros. Então, veja você: põe-se uma escola no chão e veja o que é esse projeto que nós estamos aqui hoje. Veio o mal, foi derrubado todo esse mal, caiu por terra e agora com as bençãos de Deus, de Oxalá, como acredite cada um, está se levantando. Porque o homem tem fé, o MST tem fé, estamos indo e chegaremos lá com certeza", exalta Ricarda. 

Ex-aluno da escola Eduardo Galeano, João Gabriel Neves percebe diferenças entre a escola do campo e da cidade. 

"Você cria um afeto, com a escola, com as pessoas, com o convívio, que é diferente do da cidade, a maneira do professor tratar você é diferente do da cidade, porque ali o professor tem tempo de falar com você, tem tempo. Praticamente na aula de ciências que pode ter mais prazer de ter aula prática porque você está no ar livre, você aprende muito mais, você mexe com a terra, planta uma horta por exemplo", explica. 

Edição: Rodrigo Gomes