COMBATE À FRAUDE

Governo desiste de imposto a sites estrangeiros e vai fiscalizar contra sonegação em compras

Governo não vai mais acabar com isenção de impostos para encomendas internacionais de até 50 dólares

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |

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Ministro Haddad anunciou mudança de planos do governo sobre impostos em entrevista à imprensa - Valter Campanato/Agência Brasil

O governo federal desistiu de taxar encomendas internacionais enviadas por pessoas físicas com valor de até 50 dólares, cerca de R$ 250. A ideia do fim da isenção havia sido divulgada pelo Ministério da Fazenda como uma forma de coibir a sonegação fiscal de determinadas empresas e aumentar a arrecadação da União.

A medida mudaria uma regra geral para compra de produtos por brasileiros em sites internacionais. Causou grande repercussão por afetar, principalmente, sites chineses como Aliexpress, Shopee e Shein.

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Com o fim da isenção, qualquer compra nesses sites, independentemente do valor dela, estaria sujeita a cobrança de um imposto federal com alíquota de cerca de 60%. Com o recuo do governo, encomendas de até 50 dólares, enviadas por pessoas físicas do exterior, continuarão isentas –algo que já ocorre desde 1999.

A ideia do governo era mudar essa regra porque, segundo comerciantes brasileiros e a Receita Federal, algumas companhias estrangeiras se passavam por pessoas físicas para sonegar. O governo nunca divulgou o nome dessas empresas, apesar de dizer que sabe quais são.

O Ministério da Fazenda estimava que R$ 8 bilhões por ano poderiam ser arrecadados com o fim da isenção.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), porém, determinou que a isenção deve permanecer como é hoje. Ou seja, cancelou a ideia da taxação.

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A decisão de Lula foi comunicada ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em reunião na segunda-feira (17). Na terça (18), Haddad explicou que Lula quer que o combate à sonegação seja feito por meio de fiscalização e não pela taxação das compras.

“O presidente nos pediu para tentar resolver isso do ponto de vista administrativamente, usar o poder de fiscalização da Receita Federal, sem a necessidade de mudar a regra atual sobre taxação”, disse Haddad. “Isso estava gerando confusão de que isso poderia prejudicar pessoas que, de boa fé, recebem encomendas do exterior.”

Segundo Haddad, as medidas que a Receita irá tomar para aumentar a fiscalização ainda estão em estudo. “A decisão do presidente foi ontem [segunda-feira]. Nós temos uma equipe agora debruçada sobre ela para ver como podemos coibir esse crime tributário”, complementou.

Em busca de arrecadação

A taxação das encomendas internacionais era uma das estratégias aventadas pelo governo federal para aumentar a arrecadação de tributos sem ter de criar novos impostos. Haddad disse que mudanças para combate à sonegação e fim de privilégios tributários poderiam render até R$ 150 bilhões por ano à União.

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Além dos impostos sobre encomendas, o governo já falou em outras duas medidas nesse sentido:

Imposto de apostas esportivas: Haddad já se reuniu com empresas que administram sites de apostas esportivas para discutir a regulação e a taxação do setor. Hoje, essas empresas não pagam impostos, o que contraria as práticas internacionais. A estimativa do governo é receber até R$ 15 bilhões em impostos sobre jogos em 2023.

Incentivo só para investimento: Haddad já disse que o governo deve editar uma medida provisória para corrigir uma suposta distorção que reduz a arrecadação da União em até R$ 90 bilhões por ano. Segundo o ministro, empresas estariam recebendo incentivos fiscais para custeio de suas atividades corriqueiras, quando o incentivo deveria ser dado somente quando essas empresas estão realizando investimentos.

Para além dessas ideias, o governo já tomou algumas medidas para aumento de arrecadação em janeiro e no final de fevereiro.

Doze dias após o início do novo governo, Haddad anunciou um pacote de medidas para reequilibrar as contas públicas. A proposta incluiu uma mudança da base de cálculo dos créditos tributários do Pis/Cofins, um programa de incentivo à regularização tributária e uma mudança em regras de julgamentos do do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), dando preferência a decisões que favorecem à União.

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Isso elevaria a arrecadação em mais de R$ 100 bilhões.

Já no final de fevereiro, o governo confirmou o fim da desoneração temporária da gasolina e do etanol concedida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) antes da eleição. A manutenção do desconto em impostos custaria R$ 29 bilhões à União.

O desconto foi parcialmente revisto. Uma parte dele segue reduzindo os preços dos combustíveis. Para que o caixa da União não fosse prejudicado, um imposto temporário sobre a exportação de petróleo cru foi criado.

"Queremos recuperar as receitas que foram perdidas no processo eleitoral por razões demagógicas", explicou Haddad, na ocasião.

Por que arrecadar?

A proposta do novo arcabouço fiscal do governo prevê que as despesas passem a ser vinculadas à arrecadação. O gasto do governo poderia elevar, no máximo, 70% do aumento da arrecadação com impostos.

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Isso significa que, se a União receber R$ 100 milhões em impostos a mais, poderá aumentar seus gastos em R$ 70 milhões no ano seguinte.

Levando em conta essa regra, o governo precisará arrecadar mais para poder gastar mais em programas sociais e fazer investimentos. "O novo arcabouço fiscal é totalmente centrado no crescimento das receitas tributárias do governo federal. Ele depende de mais arrecadação", explicou Marcelo Lettieri, diretor do Instituto Justiça Fiscal (IJF).

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Edição: Rodrigo Durão Coelho