ACORDOS QUEBRADOS

Como decisões históricas europeias resultaram na tensão entre Israel e Palestina; ouça análise

Especialista em história árabe, Arlene Chemesha destaca que conflitos na faixa de Gaza revelam apartheid sionista

Ouça o áudio:

Palestinos sentados do lado de fora de prédio destruído por ataques israelenses na cidade de Rafah, em Gaza - Hatem Ali/AP
Não existe povo escolhido. Os povos têm direito à sua existência para viver em paz

A guerra entre Israel e o grupo radical islâmico Hamas ganhou mais um capítulo nesta semana. Ambos os lados reivindicam a sua soberania territorial, embora atualmente esse direito seja exercido plenamente apenas pelos israelenses. Os palestinos vivem na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, áreas divididas pelo território de Israel, o que aumenta a tensão na região.

No último sábado (7), o Hamas lançou ataques aéreos e terrestres em diversas partes do território de controle israelense. A investida pegou o mundo de surpresa, e, como consequência, Israel declarou oficialmente guerra ao grupo, lançando vários ataques contra a população palestina em Gaza.

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Neste episódio do Três por Quatro, o Brasil de Fato traça uma linha histórica por trás da escalada do conflito, abordando o surgimento do movimento sionista e a criação do estado de Israel, em 1948. 

Segundo a professora de História da Universidade de São Paulo (USP) Arlene Clemesha, o conflito é o resultado de uma dívida histórica do ocidente com o povo judaico: “A questão do Holocausto é muito importante para a criação de Israel e pra essa dívida moral que a Europa [tem]. Eu não digo o mundo, eu digo Europa [...] Eles precisavam expiar essa culpa e espiaram criando um novo problema, né?”

A professora se refere ao plano da Organização das Nações Unidas (ONU), lançado em 1947, para dividir as terras árabes entre Israel, criando assim o estado judeu, também a Palestina como parte do estado árabe, e Jerusalém, no centro, para ambos, com um sistema de controle internacional.

Ouça o episódio:
 

Ao Três por Quatro, o ex-presidente do PT José Genoíno explica que o projeto não foi bem aceito por ambos os lados, o que marcou o início do conflito na região, com vantagem para o governo judeu. “Israel derrotou as resoluções da ONU, aplicando uma violenta opressão, ocupação e morte. Qual era o respaldo que Israel tinha? Os Estados Unidos que acendia como potência imperialista na Guerra Fria contra, a então, União Soviética.”

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Em resposta, o povo árabe viveu um longo processo à procura de uma liderança palestina autônoma. Segundo a professora de História da USP, assim nasceu os grupos como Fatah e Hamas. Ela explica que no início, “todos esses vão adotar a guerrilha como um modo de ação. É um movimento de libertação nacional.”

Clemesha destaca: “Qualquer um que faz a resistência ao establishment – Europa e Estados Unidos –, a oposição é sempre considerada terrorista”. E, de fato, a professora relembra casos extremistas, como o atentado terrorista nas Olimpíadas de Munique, em 1972, que matou integrantes da delegação de Israel. 

Diante das condições precárias da população que vive hoje na Faixa de Gaza, Genoíno avaliou: "O direito à rebelião diante desse massacre, diante dessa violência, não é o direito de um povo escolhido. Não existe povo escolhido. Os povos têm direito a sua existência, a sua identidade dentro de uma pluralidade civilizatória, religiosa, política, cultural, para viver em paz.”

Já a professora de História da USP destaca: “A Faixa de Gaza já vive um bloqueio quase impenetrável há 17 anos. Então, essa panela de pressão já vem explodindo de diversas formas”.

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Ela relembra: “Esse é o quinto massacre contra os palestinos de Gaza. Não é o primeiro, é o quinto. Então, o bloqueio dura 17 anos, e o que aconteceu agora? Eles disseram que não vão deixar entrar mais nada. Então, o bloqueio já existia, mas entrava aquele mínimo”.

Genoíno foi mais longe, o ex-presidente do PT comparou a situação dos palestinos hoje, com a mesma vivida pelos judeus na Segunda Guerra Mundial: “Agora, virou um  campo de concentração a céu aberto. Corta a luz, corta a água, não entra remédio, não entra comida, vai matar as pessoas” . 

Segundo Clemesha, a tentativa da ONU em dividir a região em duas partes “fechou os olhos do mundo” para a real situação entre Israel e Palestina. “Existe uma situação de Apartheid, e qual que tem que ser a resposta? Direitos humanos, tem que defender os direitos humanos para todo mundo. Seja Israel, seja Palestina, seja o que for. Tem que haver a defesa da extensão de direitos humanos para todos no território", afirmou.

O podcast Três por Quatro é apresentado por Nara Lacerda e Igor Carvalho, agora em temporada fixa no Brasil de Fato. Nesta nova fase, além dos comentários do João Pedro Stédile, liderança do MST, a equipe também conta com a presença do ex-presidente do PT, José Genoíno.

Novos episódios do Três por Quatro são lançados toda sexta-feira pela manhã, discutindo os principais acontecimentos e a conjuntura política do país. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho