Fim de festa

Chora uma parte da Argentina: 'a luta não é contra um louco que diz loucuras'

No bunker de Sergio Massa, tristeza e lágrimas se misturam às análises que pedem resistência e reação imediata

Brasil de Fato | Buenos Aires (Argentina) |
Massa foi até o bunker onde estavam aliados políticos se despedir da política e reconhecer o revés eleitoral - Foto: Reprodução/Instagram

Quando Sergio Massa apareceu para discursar, próximo de 20h20, todos já sabiam que a derrota estava confirmada e que a Casa Rosada seria a morada de Javier Milei até 2027. Incrédulo e disperso, o público caminhou lentamente até o palco onde o peronista discursaria para reconhecer o revés e parabenizar o candidato da extrema direita.

Quando Massa disse que seguia acreditando, “assim como no primeiro dia, que o país precisa de acordos políticos”, uma voz explodiu no meio do público. “Com aquele pedaço de merda do (Javier) Milei, não”. O protesto não foi isolado, mas rompeu a parede de apatia que tomou conta do bunker peronista, um galpão anexo ao palco armado para a possível festa, onde se concentraram políticos, artistas, jornalistas e militantes mais próximos da elite da campanha.

Após o discurso de Massa, que anunciou o fim de sua carreira política, o silêncio tomou conta do galpão. No salão, muita gente se abraçando e chorando. Pelos cantos, pessoas observavam os celulares, incrédulas com o resultado tão desfavorável aos peronistas.

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Em uma roda de brasileiros, uma constatação: “não aprenderam com nossos erros de 2018”. Na época, Jair Bolsonaro venceu Fernando Haddad, em uma corrida eleitoral marcada por erros da campanha petista e parte da esquerda, que subestimou o candidato da extrema direita.

Isolada, com uma bandeira da Argentina amarrada ao corpo e lágrimas nos olhos, Griselda Garcia, trabalhadora da Saúde, pensava sobre o que está por vir para uma Argentina já combalida, que sofre com uma inflação de 140% e com 40% da população na linha da pobreza.

“Cada direito que ganhamos até hoje, teremos que sair para defender nas ruas, como já aconteceu outras vezes. Esse modelo (de Milei) não prospera sem repressão e estaremos nas ruas defendendo os direitos de cada um dos trabalhadores. Será um período muito difícil”, afirmou ao Brasil de Fato.

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A poucos metros de Garcia, estava o músico Andres Guevara, que pedia reação imediata de seus companheiros. “Por que esse silêncio? Temos que sair às ruas”, dizia em uma roda de amigos.

“Eu acredito que além de Milei, tem (Maurício) Macri (ex-presidente da Argentina), será um momento complicado. Uma analogia precisa é dizer que viveremos com Milei algo parecido com o que os brasileiros viveram com Bolsonaro”, lamentou Guevara.

Servidor público, Carlos Gonzalez tirou os olhos do celular, onde observava ainda o fim da apuração, para tentar elaborar uma análise sobre o que se avizinha. “Se Milei cumprir o que está em sua plataforma, vamos passar mal”, sentenciou.

Guevara prefere não isolar Milei na geopolítica e o insere em um fenômeno recente que tem avançado no continente. “A luta não é contra um louco que diz loucuras, é contra um sistema internacional que tem refinado seus mecanismos de controle e dominação.”

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Edição: Vivian Virissimo