Ações afirmativas

MPF defende cotas para pessoas trans em concursos públicos e universidades

Documento foi publicado após edital do 'Enem dos concursos' não reservar vagas para a população trans

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Atualmente, a Lei de Cotas estabelece vagas a estudantes de escolas públicas, de baixa renda, pessoas com deficiência, negros, pardos e indígenas - Fernando Frazão/Agência Brasil

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), ligada ao Ministério Público Federal (MPF), defendeu a adoção de cotas para pessoas transgênero em universidades e concursos públicos, em nota técnica publicada na última terça-feira (16).

O documento surgiu depois que o edital do Concurso Nacional Unificado, conhecido como "Enem dos concursos", foi publicado, no último dia 10, sem reserva de vagas para transexuais.

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Após a repercussão negativa, a ministra de Gestão e Inovação, Esther Dweck, argumentou que não foi possível incluir as pessoas trans nas cotas, porque a população não está prevista na Lei de Cotas.

"Estamos discutindo no Congresso um novo projeto de lei de cotas no serviço público. A gente precisa ampliar para outros grupos minorizados e pessoas que têm dificuldade de entrar no mercado de trabalho. Mas no atual concurso estamos mantendo aquelas cotas que estão previstas na legislação", disse Dweck no programa "Bom Dia, Ministra" desta quarta-feira (17).

Em julho do ano passado, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, havia prometido cotas para pessoas trans para as 900 vagas de Auditor-Fiscal do Trabalho, que compõem o concurso unificado. "Criei uma cota de 2% para pessoas trans e uma outra cota, que também não é obrigatória, para o nosso povo indígena e nosso povo quilombola. E a cota do nosso povo negro, que a obrigatoriedade é de 20%, será de 45%", declarou Marinho, na época. No entanto, a proposta não se concretizou.

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Atualmente, a Lei de Cotas (Lei nº 12.711/2012) estabelece vagas em instituições de ensino superior federais a estudantes de escolas públicas, de baixa renda, pessoas com deficiência, negros, pardos e indígenas. Para o MPF, no entanto, as especificações da legislação não impedem que outros grupos historicamente marginalizados sejam incluídos entre os beneficiários.

Como exemplo dessa inclusão, o documento cita que, desde 2019, algumas universidades passaram destinar uma parte das vagas para pessoas trans. A partir de 2021, essa política foi implementada em alguns concursos públicos, como na Procuradoria-Geral do Estado do Rio Grande do Sul, no Ministério Público do Trabalho, na Defensoria Pública de São Paulo e no Ministério do Trabalho e Emprego.

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O órgão cita, inclusive, o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, no qual o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a constitucionalidade do sistema de cotas.

Na ocasião, o então ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso, afirmou que o princípio da igualdade material, previsto na Constituição Federal, permite ao Estado criar políticas "que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares".

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O MPF acrescenta que "as ações afirmativas são programas criados com o objetivo de conferir recursos ou direitos especiais para integrantes de um grupo social desfavorecido, com vistas a um bem coletivo".

Edição: Nicolau Soares