Se a rivalidade e as diferenças entre a torcida das três maiores equipes da capital — Coritiba, Athletico e Paraná — pode predominar na hora do campeonato e nos estádios, a luta social e pelos direitos das mulheres gera pontos de união. Cada vez mais ampliam entre as torcidas as presenças de coletivos que pautam temas relevantes, com voz e liderança feminina.
Nos últimos dias, a contratação do técnico Cuca pelo Athletico no lugar do colombiano Juan Carlos Osorio gerou duro debate nas redes sociais. Para a reportagem do Brasil De Fato Paraná, torcedoras dos três times posicionaram-se de forma crítica à contratação, pelo passado de condenação do atual técnico, por ser o mês da luta das mulheres e pelo histórico de resistência de outras torcidas.
O nome de Cuca está na lista da direção rubro-negra desde junho de 2023, quando deixou o Corinthians depois de sete dias. Na época, houve forte pressão de parte da torcida por causa da condenação por coação e ato sexual com menor em 1987, quando era jogador do Grêmio, durante excursão à Suíça. A defesa de Cuca alega inocência.
Luta unificada
"Neste mês, tempo em que discutimos os direitos das mulheres e o combate às diferentes formas de violência a que estamos sujeitas, é lamentável que um estuprador esteja à frente de um time, de um esporte tão presente na cultura brasileira. As torcedoras deveriam se unir e lutar contra essa nomeação, boicotando os estádios enquanto ele estiver como técnico do Atlético", afirma Adriane Silva, pedagoga, professora e sindicalista municipal. Ela é torcedora do Coritiba.
Torcedoras participam
Já a professora e torcedora Mariana, em que pese ser o seu time de coração, é contrária à contratação de Cuca, reforçando também o peso da contratação justamente no mês de março.
"É lamentável. Infelizmente, ele não representa muitas pessoas que torcem pro time, que querem títulos e esperavam um posicionamento diferente da diretoria. Cada vez mais as mulheres têm estado presentes no estádio, torcendo, apoiando, contribuindo, fazendo a sua parte. O mínimo que esperávamos era uma postura diferente”, comenta.
Falta de democracia
Já Karine Nuzeka, paranista, funcionária de sindicato e integrante da torcida organizada Gralha Marx, chama atenção para um aspecto importante do debate: a consulta à base e ao sentimento da torcida, algo que nem se cogitou.
"Tendo todo histórico que não é de hoje, as manifestações que vem contra o Cuca e, mais recente, o livramento da condenação dele, complicado, ainda mais sem debater com a torcida", afirma. "Acredito que se consultasse teriam que ouvir as manifestações contrárias."
Entenda o caso
De acordo com o site Um Dois Esportes, Cuca foi condenado em 1989, em Berna, na Suíça. Como jogador do Grêmio em uma excursão pelo país em 1987, ele e outros três atletas foram acusados de ato sexual com menor e coação de uma menina de 13 anos, que visitava o hotel da delegação.
Os atletas ficaram presos por quase 30 dias e voltaram ao Brasil após prestar depoimentos. Em 1989, em julgamento sem a presença dos jogadores, os envolvidos foram condenados a 15 meses de prisão, além de pagamento de US$ 8 mil. Como não voltaram ao país europeu, não cumpriram pena e seguiram suas vidas.
O processo estava sob sigilo de 110 anos, protegido pela lei de proteção de dados da Suíça.
Mais tarde, a defesa de Cuca pediu a reabertura do caso e um novo julgamento, alegando que o ex-jogador foi condenado à revelia. O pedido foi acatado em novembro e o julgamento de 1989 foi anulado em 28 de dezembro de 2023.
Deputada critica
Numa semana de embates sobre o caso, a presidente do PT, a paranaense Gleisi Hoffmann, criticou a contratação do técnico, afirmando que "o crime é igualmente grave e chocante: a justiça da Suíça confirmou que havia sêmen do agressor no corpo da vítima! Uma pessoa como Cuca deve pagar por seu crime e jamais ocupar cargos de liderança, como o de treinador de futebol, que serve de inspiração e referência para tantas crianças", criticou Hoffmann.
A defesa jurídica de Cuca, no entanto, respondeu, da sua parte, o mesmo post de Hoffmann, com um documento com o seguinte trecho: "Pedimos a retirada do post, sob a pena de uma queixa crime por calúnia difamação e injúria, pois Cuca não foi condenado. Afinal, teve seu julgamento anulado pela corte da Suíça, por irregularidades que culminaram num veredito injusto. Afinal, foi julgado à revelia", argumentam na rede X (antigo Twitter).