O Mercosul anunciou nesta quarta-feira (2) ter concluído as negociações para um acordo de livre comércio com a Associação Europeia de Comércio Livre (Efta). Em nota divulgada depois do encontro de ministros da Fazenda do bloco sul-americano, o governo brasileiro afirmou que o acordo terá um impacto em 99% das exportações brasileiras para os 4 países integrantes do bloco europeu: Noruega, Suíça, Islândia e Liechtenstein.
A ideia é que a maioria das tarifas sejam eliminadas no comércio entre os países dos dois blocos. A Efta eliminará 100% das tarifas de importação dos setores industrial e pesqueiro, por exemplo, enquanto o Brasil terá aproximadamente 97% do comércio com a Efta em livre-comércio. O bloco europeu terá acesso preferencial aos principais produtos exportados pelo Mercosul.
Para especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato, no entanto, o acordo tem pouco impacto para os países envolvidos. Luiz Carlos Delorme Prado, professor do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que o comércio entre o Mercosul e o bloco é muito baixo e os efeitos do acordo acabam sendo mais simbólicos do que práticos.
“A Efta é um grupo de países que estão fora da União Europeia. Estamos falando de 4 países que não são mercados gigantesco e tem um número restrito de países. É um tipo de acordo com papel mais simbólico do que um efeito comercial. Menos de 1% das exportações brasileiras vão para esses países, por exemplo”, afirmou.
O professor faz referência aos volumes de exportações entre os dois blocos. Em 2024, o Brasil exportou US$ 3,1 bilhões em produtos para a Efta e importou US$ 4,1 bilhões em bens. Para se ter uma ideia, o PIB brasileiro no ano passado foi de US$ 2,179 trilhões.
De acordo com o professor, a realidade desse comércio para o Brasil não é alterada significativamente, e os europeus acabam levando vantagem justamente por serem economias menores, mas com indústrias sofisticadas.
As discussões para o acordo começaram em 2017 e foram retomadas em 2024. Depois de 14 rodadas de negociações, os dois blocos chegaram a um consenso para os termos. Para entrar em vigor, o acordo ainda precisa ser revisado e assinado pelas duas partes.
Os dois blocos também discutiram questões técnicas envolvendo propriedade intelectual, fiscalização sanitária e comércio de serviços.
O acordo entre os blocos é anunciado em meio a negociações do Mercosul com a União Europeia para o livre comércio. As negociações se arrastam desde 1999 e foram concluídas no final de 2024. No entanto, a assinatura do documento final está emperrada por uma discordância com alguns países do bloco europeu, especialmente a França, em relação às regras ambientais.
Para o presidente francês, Emmanuel Macron, as normas exigidas dos produtores europeus são mais rígidas do que as impostas aos produtores da América do Sul. Por conta disso, o texto ainda não foi assinado no Conselho Europeu e no Parlamento Europeu.
Prado afirma que o uso de ferramentas de livre comércio já foram muito incentivadas na década de 1990, mas que, agora, é preciso uma reavaliação para entender quais são os benefícios de cada acordo.
“Os acordos de livre comércio tiveram um histórico no passado, mas hoje é muito irreal. Com EUA e China, por exemplo, não existe essa possibilidade. Há um desbalanço na produção, que produzem artigos mais sofisticados, teria que ser algo muito bem amarrado para ser benéfico para o Mercosul. Na questão da União Europeia, as exigências suplementares feitas pela UE tornam o acordo inviável. Vai depender muito da postura da UE nas mudanças da correlação da UE com seus principais parceiros”, avalia, em entrevista ao Brasil de Fato.
O governo brasileiro quer usar a cúpula do Mercosul para avançar no acordo com a União Europeia. Para o professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Goulart Menezes, o encontro será um teste também para a política externa brasileira na relação com dois países: Argentina e Paraguai.
“Caso prevaleça a cooperação pragmática com o governo Milei, que possibilitou a renovação do acordo automotivo entre Brasil e Argentina, é possível que a agenda da Cúpula se concentre em uma agenda mais propositiva. Por outro lado, será um importante momento para testar as relações Brasil-Paraguai que andam estremecidas por conta da revelação de espionagem contra autoridades paraguaias que estavam à frente da renegociação do Anexo C do Tratado de Itaipu”, disse ao Brasil de Fato.