O governo brasileiro entrou nesta quarta-feira (6) com um pedido de consulta na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as tarifas impostas pelos Estados Unidos aos produtos brasileiros. A decisão é tomada no mesmo dia em que o tarifaço anunciado pelo presidente estadunidense, Donald Trump, entra em vigor, elevando a 50% as taxas sobre uma série importações do Brasil.
Em nota, o Itamaraty disse que o pedido é o primeiro passo antes de abrir um painel na OMC — ferramenta de julgamento da organização. A consulta apresenta um questionamento sobre as medidas e diz que os EUA “violam flagrantemente compromissos centrais assumidos por aquele país na OMC, como o princípio da nação mais favorecida e os tetos tarifários negociados no âmbito daquela organização”, diz o documento.
O Itamaraty reforça a posição de diálogo que o governo brasileiro pretende manter nas negociações e diz esperar que a consulta ajude a resolver a questão. Os dois países devem marcar, nas próximas semanas, as reuniões como parte do processo.
A consulta foi respaldada por uma resolução do governo brasileiro emitida na terça-feira (5), permitindo que o Itamaraty usasse justamente os mecanismos disponíveis pela OMC para contestar as sobretaxas dos EUA.
Tarifaço
As tarifas começaram a valer a partir de meia-noite desta quarta-feira (6). Entre os produtos incluídos na lista, a sobretaxa de 50% afetará pedras naturais, café, carnes, frutas, roupas e calçados. Segundo o governo brasileiro, 36% das exportações brasileiras para os EUA serão sobretaxadas. A decisão da Casa Branca, no entanto, deixou de fora 694 itens, como suco de laranja, aviões e celulose, que representam grande parte da exportação brasileira.
Trump já havia anunciado uma taxa de 10% ao Brasil no início de abril. Mais recentemente, comunicou a sobretaxa de 40%. A medida que tem finalidade econômica foi justificada por Trump como uma decisão política. Ao oficializar a tarifa, o estadunidense saiu em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado, o que reforçou o caráter político da medida.
“A ordem considera que a perseguição, intimidação, assédio, censura e processo politicamente motivados pelo governo do Brasil contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e milhares de seus apoiadores são graves violações dos direitos humanos que minaram o Estado de direito no Brasil”, diz um trecho do comunicado oficial da Casa Branca.
O documento também cita nominalmente o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo contra Bolsonaro no STF. O magistrado “tem abusado de sua autoridade judicial para ameaçar, atingir e intimidar milhares de seus oponentes políticos, proteger aliados corruptos e suprimir dissidências”, diz outro trecho.
Moraes foi sancionado com base na Lei Magnitsky, que permite a Washington impor sanções a cidadãos estrangeiros acusados de corrupção em larga escala ou graves violações de direitos humanos. Entre as sanções previstas estão bloqueio de bens nos Estados Unidos e restrições financeiras, além da proibição de transações com empresas e cidadãos estadunidenses. Moraes não tem bens nem investimentos no país norte-americano.
Resposta brasileira
O governo Lula respondeu em julho e assinou o decreto que regulamenta a chamada Lei da Reciprocidade. O instrumento permitirá ao país adotar medidas em resposta à tarifa. O objetivo é proteger o mercado interno e restabelecer o equilíbrio em relações comerciais consideradas desvantajosas ou hostis ao Brasil.
A legislação permite que o governo desconsidere o princípio da “nação mais favorecida” (NMF) da Organização Mundial do Comércio (OMC), que assegura tratamento comercial igualitário entre todos os membros da entidade.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na semana passada que há “casos dramáticos” de impactos do tarifaço no Brasil. Por isso, segundo ele, o governo segue tentando negociar com os EUA a reversão total da medida anunciada por Trump e discute, internamente, medidas para conter os impactos do tarifaço. Empréstimos emergenciais, abatimento de impostos e até compras governamentais de produtos que deveriam ser exportados estão em discussão. O plano, segundo Haddad, deve ser apresentado ainda nesta quarta-feira ao Planalto.