Diferentemente das outras defesas dos réus acusados na tentativa de golpe, o advogado representante do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira utilizou a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, a favor do cliente. Ele foi o terceiro a falar, nesta quarta-feira (3), no segundo dia do julgamento da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF), após a manifestação das defesas de Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); e de Jair Bolsonaro.
“[O delator] disse que o outro grupo entendia que nada poderia ser feito diante do resultado das eleições, que qualquer coisa em outro sentido seria um golpe armado, que esse grupo era totalmente contra isso”, defendeu o advogado Andrew Fernandes. A fala à qual Fernandes se refere é sobre a falta de aderência à minuta golpista por parte de Paulo Sérgio Nogueira e do general do Exército Freire Gomes.
Além disso, a defesa sustentou a tese da inocência do ex-ministro alegando que ele tentou demover o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro de qualquer medida de exceção. “[Paulo Sérgio Nogueira] atuou ativamente, atuou ativamente para demover o presidente da República de qualquer medida nesse sentido”, disse.
Contradições das defesas
Enquanto alguns advogados de defesa trataram de atacar a delação premiada do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, outros a usaram como elemento probatório de uma suposta inocência do seu cliente.
Os representantes do general Augusto Heleno e do ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, pediram que fosse declarada a nulidade da delação por supostas inconsistências no depoimento do ajudante de ordens.
“Ele mudou sua versão diversas vezes, e isso consta de relatório da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público de novembro, que apontam omissões e contradições reiteradas”, disse César Vilardi, advogado do ex-presidente.
Por sua parte, a defesa do ex-ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, o advogado Andrew Fernandes Farias, usou trechos da delação como argumentos para defender a inocência do militar.
“Mergulho na prova da delação. O que diz o delator com relação ao general Paulo Sérgio? Aspas: ‘Que o outro grupo – palavras do delator – entendia que nada poderia ser feito diante do resultado das eleições, que qualquer coisa em outro sentido seria um golpe armado, que esse grupo era totalmente contra isso’”, afirmou.
“Segundo da própria delação, esse grupo temia que o grupo radical trouxesse um assessoramento e levasse o presidente Jair Bolsonaro a assinar uma doideira”, acrescentou.
Julgamento
Paulo Sérgio Nogueira faz parte do chamado “núcleo crucial” da trama golpista. A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a condenação de todos os réus: Augusto Heleno, o ex-presidente Jair Bolsonaro; Mauro Cid, ex-ajudante de ordens; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Walter Braga Netto, ex-chefe da Casa Civil; e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ).
“Todos os personagens são responsáveis pelos eventos que se concatenam entre si. O grau de atuação de cada qual no conjunto dos episódios da trama é questão de mensuração da culpa e da pena, mas não da responsabilidade em si”, defendeu o procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet.
“A tentativa de insurreição depende de inteligência de eventos, que desligados entre si nem sempre impressionam sob o ângulo dos crimes contra as instituições democráticas, mas que vistos em seu conjunto destapam uma unidade na articulação de ações ordenadas ao propósito do arbítrio e do desbaratamento das instituições democráticas”, disse o PGR em outro trecho.
A condenação ou absolvição será definida por maioria simples da Primeira Turma, ou seja, pelo menos três dos cinco ministros. Além de Moraes, o colegiado é formado por Cristiano Zanin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Flávio Dino. Independentemente do resultado do julgamento, as partes podem recorrer da decisão no próprio STF.
No primeiro dia de julgamento, Moraes leu o relatório e, em seguida, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, apresentou as acusações. Depois, houve a sustentação oral das defesas de Mauro Cid, Almir Garnier, Alexandre Ramagem e Anderson Torres. Seguindo o cronograma, hoje falam as defesas de Augusto Heleno, Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e do general Walter Braga Netto.
Após a sessão desta quarta-feira, o julgamento será retomado na terça-feira (9), com os votos dos ministros em duas sessões. A previsão, portanto, é que o processo seja concluído na sexta-feira (12).
Todos são os réus respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, com considerável prejuízo para a vítima, e deterioração de patrimônio tombado. As penas podem chegar a cerca de 40 anos de prisão.