Otimismo e posição firme. Foi assim que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) resumiu a sua expectativa para o encontro com o mandatário estadunidense Donald Trump. O petista participou de uma entrevista coletiva de imprensa nesta quarta-feira (24) na Organização das Nações Unidas (ONU) e disse que não está disposto a negociar nem a soberania, nem a democracia brasileira. Para o presidente, é importante que os EUA tenham “informações corretas” sobre o Brasil.
“Precisamos conversar com bases em dados verdadeiros. Ele está mal informado em relação ao Brasil e levou a tomar decisões inaceitáveis para dois países que têm 200 anos de relações. E voltaremos a estar em harmonia e quimicamente estáveis”, disse.
Lula reforçou, ao longo da entrevista, a ideia de que Trump está “mal informado” sobre as questões brasileiras. Para o petista, o estadunidense tomou as decisões de sancionar autoridades brasileiras e produtos do Brasil pela “qualidade das informações” que Trump tinha sobre o Brasil. O presidente ainda deu mais detalhes sobre o breve encontro nos corredores da Assembleia Geral da ONU.
“Quando ele tiver informações corretas, ele muda de posição. Nós nunca tínhamos nos encontrado e nos encontramos por acaso. Estendi a mão pra ele e disse que tínhamos muito a conversar, muita coisa em jogo e não temos limites de assuntos”, afirmou.
O argumento usado pelos EUA de que havia um déficit comercial com o Brasil para sobretaxar produtos brasileiros também foi respondido por Lula. Segundo o petista, essa é outra “desinformação” que foi passada para Trump, já que Washington teve superavit na relação comercial com o Brasil que, só no primeiro semestre de 2025, chegou a US$ 1,7 bi.
Lula não confirmou data, local e nem encontro será presencial, se limitando a dizer que as equipes de cada país estarão em contato para ajustar os ponteiros para a reunião. O presidente também não apresentou nenhuma objeção para que a reunião seja transmitida.
‘Química’
A “química” citada por Trump também foi reforçada por Lula. O brasileiro disse estar feliz com a declaração do presidente dos EUA. Segundo ele, é possível discutir para chegar a um consenso entre os países.
“Aquilo que parecia ser impossível, aconteceu. E fiquei feliz que ele citou a boa química. Eu acho que as relações humanas são 80% química e 20% emoção. Torço para que dê certo, porque Brasil e EUA são as maiores democracias do continente e temos muitos interesses em comum. Portanto, não há porque termos um conflito. Fiz questão de dizer para o Trump que temos muitas coisas para discutir e quero uma pauta positiva entre Brasil e EUA”, afirmou.
Lula não quis antecipar os assuntos que serão levados pelo Brasil para essa negociação. Ele afirmou que, na conversa com Trump, deixou claro que não há “limites” de tópicos e citou interesses empresariais, industriais, tecnológicos e comerciais. O presidente deixou claro que a única coisa da qual não abre mão é a soberania brasileira e a “nossa democracia”.
“Isso não abrimos mão e não é só com os EUA. É com qualquer um”.
Otimismo e ideologia fora da pauta
A palavra de ordem para Lula foi o otimismo. O brasileiro disse esperar que Trump vá com a mesma predisposição de fazer uma negociação “ganha-ganha” com o Brasil. Para o petista, a ideologia nunca foi um pré-requisito para que ele se sentasse em uma mesa de negociações com um presidente de outro país.
“A ideologia nunca está em jogo na minha relação com um chefe de Estado, assim como não quero que os outros tenham comigo. Para mim, são os assuntos dos dois países que interessam. Eu busco a paz e não entendo porque o mundo quer destruir, enquanto nós queremos construir. Espero que coloquemos nossos problemas e nossas diferenças e comecemos a tomar decisões”, disse.
O temor de um possível constrangimento no encontro foi abordado. Perguntado sobre uma repetição da humilhação feita por Trump com outros chefes de Estado em reuniões na Casa Branca, Lula disse que não há porque ter “brincadeiras” em uma relação entre dois homens de quase 80 anos. “Certamente teremos respeito um pelo outro.”
Depois de um discurso duro na Assembleia Geral da ONU, Lula disse ter ficado surpreso com o encontro entre os dois nos corredores do salão do encontro. Segundo o brasileiro, Trump estava com uma cara “simpática e agradável”, mas não deixou de ser enfático sobre o julgamento dos golpistas de 8 de Janeiro. De acordo com o petista, o presidente dos EUA precisa entender que aquelas pessoas “cometeram delitos” e isso “não está em jogo”.
A exploração de terras raras por empresas estrangeiras também foi tema da entrevista coletiva de Lula. O presidente disse estar estudando o tema e não descarta negociar isso com Trump.
“Nós queremos que tenha exploração, mas não quero que a gente deixe de ter um processo de industrialização interno. Criei um conselho para discutir isso. Será bem vindo qualquer parceiro de qualquer parte do mundo. Não temos limite para nossa conversa. Eu sou um cidadão sem preconceito e comecei a vida negociando”, afirmou.
Critica à PEC
A entrevista também teve espaço para tratar de assuntos relativos à política nacional. Nesta quarta, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal rejeitou por unanimidade a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/21, apelidada de “PEC da Blindagem”, aprovada na última semana pela Câmara dos Deputados. O texto permitiria que o Congresso barrasse processos criminais contra deputados e senadores. Para Lula, essa proposta era “desnecessária” e passava um “péssimo sinal” para a sociedade brasileira.
“A PEC era desnecessária, provocativa e passou um péssimo sinal para a sociedade brasileira. Aconteceu com essa PEC o destino que merece porque foi uma vergonha nacional”, disse.