Desdobramentos

Dino fala em chance de extradição de Torres e outros mandados de prisão nos próximos dias

"Ninguém rouba a democracia", afirmou ministro ao entregar ao STF réplica da Constituição saqueada em ataque

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Ministras Cármen Lúcia, Rosa Weber com Flávio Dino e Andrei Passos durante entrega da réplica da Constituição ao STF - Rosinei Coutinho/SCO/STF

Nesta sexta-feira (13), o ministro da Justiça Flávio Dino visitou o Supremo Tribunal Federal (STF) e entregou à ministra Rosa Weber a réplica da Constituição Federal de 1988 que havia sido saqueada pelos terroristas pró-Bolsonaro durante as invasões aos Três Poderes no domingo (8). O livro foi encontrado após uma investigação da Polícia Federal (PF) que conduziu as apurações até a cidade de Varginha (MG), onde um cidadão compareceu à delegacia local para devolver o objeto. De acordo com o ministro, ele está sendo investigado.

"Eu considero essa visita ao Supremo voltada a duas mensagens principais. A primeira delas é que, assim como ninguém rouba a Constituição, ninguém rouba a democracia. E a segunda mensagem é da união, de nós reiterarmos que o extremismo só pode ser vencido como nós desejamos com ampla união nacional, união que ultrapassa os Poderes, as instituições e deve abranger a sociedade, porque os terroristas se nutrem exatamente da inoculação do pânico. É por isso que há essa reiteração", afirmou Dino.

O ministro chamou a atenção ainda para os anúncios de extremistas que apontam para possíveis novos ataques ao patrimônio público, desta vez na próxima segunda (16). "Nós precisamos deixar claro que isso, além de ser crime contra o Estado Democrático de Direito, é, politicamente falando, um crime contra a sociedade, uma vez que significa dizer que novamente nós vamos ter que mobilizar milhões e milhões de reais pra prover segurança e infraestruturas a prédios públicos ameaçados por pessoas que podem e devem esperar a eleição de 2026, quando democraticamente será eleito um novo presidente da República", acrescentou o mandatário.

Flavio Dino também comentou uma série de outros pontos relacionados ao status atual dos desdobramentos dos ataques terroristas de domingo. Confira a seguir os principais trechos da entrevista do ministro.

Minuta

Flávio Dino disse que a minuta encontrada na casa do agora ex-secretário de Segurança do DF Anderson Torres é o "elo" que faltava para que as autoridades montem o quebra-cabeça referente ao que se passou desde 30 de outubro, data do segundo turno das eleições, até o dia 8 de janeiro, quando os terroristas invadiram os prédios públicos de Brasília. O documento sinaliza a intenção do governo Bolsonaro de tentar um golpe para rechaçar o resultado do pleito que elegeu Lula.

"A minuta tem uma relevância política óbvia, no sentido de mostrar mais uma vez e sempre que todo esse encadeamento de atos terroristas obedecia a uma maquinação, a um ardil político, a uma estratégia política. Esse documento funciona, portanto, como uma ratificação, uma confirmação daquilo que já sabíamos que havia, e há, lamentavelmente, uma orquestração política por trás do terrorismo no Brasil. E, do ponto de vista jurídico, claro, o documento será apreciado pelas autoridades competentes."

O ministro também disse que as autoridades estão esperando Torres se apresentar à Justiça, conforme foi anunciado pelo próprio ex-secretário na última quarta (11), após a decretação da sua prisão preventiva pelo Judiciário. "Provavelmente, até o final de semana. É a nossa expectativa. Se ela não se confirmar, ou seja, se aquilo que ele anunciou efetivamente não ocorrer, é claro que na segunda caberá à PF informar ao ministro relator, Alexandre de Moraes, e ao Ministério da Justiça (MJ), simultaneamente, e iniciar os procedimentos visando à extradição, que envolve uma fase judicial no STF e uma fase administrativa, que ocorre no MJ", acrescentou, ao falar em "cooperação jurídica internacional".

Ibaneis

Questionado sobre a iniciativa do governador afastado do Distrito Federal (DF), Ibaneis Rocha (MDB), em prestar depoimento à PF nesta sexta-feira sobre a omissão da gestão local diante dos atos golpistas, Dino evitou criticar o mandatário.

"Acho que qualquer iniciativa voltada ao esclarecimento cabal dos fatos é bem-vinda. Eu, obviamente, não tive acesso ao teor do depoimento do governador, mas acho que é importante que todos se empenhem em que haja elucidação definitiva de tudo isso, porque obviamente não foram apenas aqueles executores que aqui estavam, mas havia uma rede", disse, ao afirmar ainda que prefere não julgar se a iniciativa de Ibaneis ameniza sua responsabilidade sobre as invasões.

Prisões

Dino afirmou que há atualmente cerca de 1.200 pessoas presas por conta dos ataques e que há mandados de prisão já expedidos pela Justiça que serão cumpridos nos próximos dias. O ministro ressaltou que "não há um limite quantitativo". "O que nós podemos afirmar é que nós ainda temos, infelizmente, centenas de pessoas que indiretamente participaram desses atos, e todas serão investigadas, todas serão apresentadas pela PF ao Judiciário, uma vez que às vezes demora alguns dias, semanas, meses, quiçá."

O ministro explicou que há diferentes infratores que vêm sendo investigados pelas autoridades. Ele disse que os investigados são divididos em grupos: o dos incitadores, o dos executores, o grupo dos financiadores (“pequenos, médios e grandes”) e o dos mandantes. Dino destacou que os incitadores são aqueles que não necessariamente vieram para Brasília, mas estimularam e promoveram as invasões. O ministro realçou que essa conduta em si já é considerada criminosa, segundo o Código Penal.

"Quando o ministro Alexandre [de Moraes] se refere a pessoas com prerrogativas de função, ele está se referindo a eventuais incitadores e mandantes. E é muito positivo que haja essa compreensão porque a responsabilidade penal tem que ser plena para poder ser justa, ou seja, abranger apenas os executores é necessário, claro, eles cometeram crimes, mas é preciso investigar toda a cadeia criminosa pra investigar o itinerário criminoso e, com isso, o Direito Penal cumprir a sua dupla função – a primeira, repressão e a segunda, prevenção." 

Militares

A responsabilização dos militares também entrou no roteiro da entrevista de Dino. Ele explicou que a competência constitucional para crimes militares é da Justiça Militar.  "Temos o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, que prevê o chamado 'IPM', o Inquérito Policial Militar. Essa é a primeira instância, a instância principal, eu diria, de apuração de responsabilidades, ações ou omissões perpetradas por militares. Nós temos, sim, outra possibilidade, que aí depende do relator no STF, o ministro Moraes, que poderá, sim, considerar que tudo está no âmbito desse inquérito que ele conduz. Eu não conheço nenhuma decisão ainda sobre o tema, mas com certeza ele tomará alguns desses dois caminhos."

Ainda não há, até o momento, qualquer determinação judicial que enquadre figuras militares relacionadas aos ataques. "O que não haverá – é importante consignar isso com toda a firmeza e, ao mesmo tempo, com toda a serenidade – é que não podem existir na democracia zonas de imunidade, porque zonas de imunidade conduzem a zonas de impunidade, e zonas de impunidade conduzem a novos crimes. Então, ninguém tem salvaguarda absoluta pra não ser investigado. Isso existe para os agentes privados e existe para os agentes públicos civis ou militares", pontuou.   

Prejuízos

Flávio Dino também comentou o balanço dos prejuízos que resultaram dos ataques. Segundo o mandatário, o montante ultrapassa a marca dos R$ 10 milhões. Ele mencionou os estragos materiais e também os danos morais coletivos, especialmente porque houve destruição de patrimônio histórico considerado irrecuperável. Em virtude disso, ele sinalizou que ações com pedidos de reparação chegarão a "centenas de milhões de reais", uma vez que os danos incluem ainda os gastos mobilizados pelos governos distrital e federal para reforço da segurança.   

"E o custo disso é pago por quem? Pelas senhoras, pelos senhores, pelas famílias brasileiras, que precisam de educação, saúde, segurança contra os crimes patrimoniais, contra os crimes contra a vida. Ou seja, quero dizer objetivamente: o terrorismo sempre mata.  Ele pode matar direta ou indiretamente, mas o terrorismo mata. Isso não é videogame. Isso é crime e, portanto, nós vamos manter a lei funcionando, a lei atuando e renovando esse apelo de pacificação nacional."

Edição: Thalita Pires